segunda-feira, 21 de outubro de 2013

CARTA AO PORTUGALITO

Meu querido Portugalito,

vejo-te tão desfocado, tão descentrado. Sabes uma coisa? Sinto que a nossa relação é semelhante aquela de velhos casais de namorados que já não tem mais nada para dizer um ao outro mas levam tempo a se separarem. Sentem carinho um pelo outro, mas devem seguir caminho. É isso, meu Portugalito. Custa tanto assumir que me quero separar de ti. Por vezes penso que não dei e não dou o meu melhor, mas há tanto tempo que tento voltar a ti como uma filha pródiga e só encontro farsa.

Desculpa, mas há anos que sinto isso. Mesmo muito antes da crise. A primeira vez que me fui tinha 20 anos. O auge das injecções de dinheiro da comunidade Europeia. Fui para Berlim. Não ter sol custa-me muito, mas decidi que só voltaria se valesse a a pena. Ahahaha nem te digo nem te conto. Não vou entrar naquele discurso que o pessoal não quer trabalhar, porque não é bem assim,mas alguns se puderem meter ao bolso sem muito rigor no trabalho... Enfim, com 23 anos ganhei uma bolsa da Gulbenkian (das únicas instituições que faziam a vez do extinto ministério da cultura) e lá fui para Paris estudar teatro. Depois voltei para a fantástica Expo 98. QUE FARSA! QUE FIASCO! Aí pude confirmar a esquerdalhice oportunista que assim que se vê com poder e dinheiro reproduz aquilo que critica. E ética´não consta no glossário. Deixei-me ficar mais uns tempos. Viajando quando podia. Pensei viver no Brasil, Cabo Verde, Dinamarca, Berlim (não é a Alemanha toda que desejo para a minha vida). Mas sabes que mudar requer fôlego, alguma direção. Pois. Não vou entrar em detalhes. Mas se me tivesse só comigo talvez tivesse ido antes. Hoje encontro-me no Brasil com as minhas duas filhas. Existem muitos aspectos que poderiam aqui ser melhores. Como em todos os lugares. Mas uma coisa que desejo para elas e para mim, para nós é energia no viver.

Sabes, Portugalito, desejo que passes bem como te convém. Sempre que sei de ti fico triste. Mas como velhos amantes quero manter amizade, penso que é o minimo. Rancores nem pensar! Mas cada um na sua. Outros amores virão, porque não somos de um só lugar e o mundo é grande.

um abraço forte do fundo do coração
e cuida-te! Cada cravo vermelho que encontrar no meu caminho lembrar-me-ei de ti, porque mesmo separados por ti sinto carinho.

Ana Piu
Brasil, 20.10.2013

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