quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

COM TATO


 

Pois é, ando toda vaidosa com as minhas calças vermelhas adquiridas num brechó da Vila que o Tom Zé anunciou numa das suas composições: Vila Madalena. Aqui a garimpeira somente de brechós quase sempre encontra umas peças yê yê mais em conta que ir ao Braz. Com estas calças posso passar por motogirl de pizzas, que já o fui no século passado, posso passar por mamãe noela, que sou desde o inicio deste novo milénio ou por petista, que sou mas também não sou por motivos que passo a apresentar sem por isso comprometer o meu posicionamente diante de mim mesma, dos outros que me são próximos ou distantes e principalmente da sociedade brasileira em especifico e da conjectura mundial, dentro das minhas referências e conhecimento prático e também teórico. Ora pois pois.

Não sou petista porque como estrangeira não me é permitido ser eleitora neste país continental. Sou petista mas não sou, porque mesmo assim tem sido um governo que abriu possibilidades democráticas a uma fatia grande da população: educação, aceso ao ensino superior, pontos de cultuta, editais culturais e outros com políticas de inclusão, manutenção do SUS ( sistema de saúde pública), projeto "minha casa minha vida", etc. Por colocar esperança neste governo que vai assumir a liderançano ano de 2023 e que promete criar o Ministério dos Povos Originários escrevo aqui estas palavras que é o meu ponto de vista a partir da minha bagagem vivencial, cultural que tem sido adquirida ao longo da minha existência e aprofundada com os 10 anos em que moro no Brasil.

Para quem não sabe eu sou portuguesa. Para mim não é motivo nem de orgulho nem de vergonha. É uma circunstância. Poderia ser francesa ou alemã, se os meus pais tivessem emigrado, exilado, refugiado para lá. Poderia ser moçambicana ou angolana se os meus pais tivessem ido para lá ou brasileira... ou da Gronelândia para justificar o facto de ser a mamãe noela... Se eu fosse alemã com certeza que não viria nos genes eu ser nazi, aliás muitos alemães são anti racistas e anti fascistas, o mesmo se passa com vários portugueses. Se tivesse nascido em Angola ou Moçambique antes de 1975 não seria obrigatoriamente uma colonialista e fascista do pior ( veja-se o caso do escritor moçambicano Mia Couto cujos pais são brancos e portugueses e o mesmo esteve ao lado das lutas de Independência Moçambicana e nunca fugiu às pressas de Moçambique por ser branco).

Irmos ao encontro do "outro" que também somos nós é ir com tato, tacto. Se isso não aconteceu nos últimos 500 anos mesmo assim já existem seres humanos e instituições que estão a mudar o paradigma, compreendendo que o protagonismo dos silenciados, porque invadidos e oprimidos, nem sequer devia ser negociável a esta altura do campeonato.

No Instituto Moreira Salles na Avenida Paulista em São Paulo está a exposição 'Xingu: contatos'. Uma verdadeira aula de Antropologia Social sem intermediários. As câmeras estão nas mãos dos indígenas que contam a sua história. A tecnologia é para todos ao serviço da "memória do futuro" e da natureza que está seriamente comprometida pela ganância extrativista. 

Indígena com celular, material tecnológico não lhe retira identidade e sim reforça-a. Nesta exposição pode-se ler num painel cronológico que em 2011 a Dilma retoma o projeto da hidrelétrica de Belo Monte iniciado na época da ditadura militar ( 1964/85). Num dos vídeos um indígena, que infelizmente não anotei o nome, pede ao Lula para este lembrar o povo brasileiro de respeitar os povos indígenas. Muito bom e importante. Mas mais que tudo é necessário lembrar que esse Ministério deverá ser composto por indígenas e que os acordos que este governo fizer com a oposição terá de levar em conta o eleitorado indígena, e não só, que elegeu novamente o PT para que aquele messias da treta ponha-se a andar de uma vez por todas.

Em suma, Bom Natal e próspero ano novo para todxs nós que defendemos " a democracia que é o pior de todos os sistemas com excepção de todos os outros". ( Sérgio Godinho).

A Piu

Br, 21/12/2022

ALÔ! QUANDO DESLIGAR, DESLIGOU!


Aqui temos uma reminiscência das comunicações com um ar todo pop art bem no centro de Sampa. Ainda funciona com cartão!! Aquele que quando acabava as moedas desligava e não valia insistir. O mesmo com o cartão. O de moedas nunca mais vi! Tá! Haviam umas gambiarras. Mas vai que esse objeto de museu ainda anda por aí!
Quanto a museus vale sempre a pena revisitar o memorial da resistência na Luz que é gratuito. Aos sábados é igualmente gratuito o Museu da Língua portuguesa onde está uma exposição " Memória e transformação " sobre as línguas indígenas que teem sobrevivido a extinção. Na frente está a Pinacoteca com várias obras de arte que tive a oportunidade de confirmar a sua existência depois de conhecê-las num curso sobre História de Arte. Hélio Oiticica, entre outros. Pena que não dê para interagir com as obras de Lygia Clark, pois estão numa redoma.
Hoje é dia de apreciar grafites na rua. Para mim grafite é na rua e não na galeria ou museu.
Agora vou desligar das redes porque a vida está lá fora!

Sampa, 19/12/2022
A Piu



quarta-feira, 14 de dezembro de 2022

NOZES E OZOUTRES série: o que pensam xs do lado de lá da barrigada

 "Primeiro estranhas, depois entranhas", já dizia o meu conterrôneo Pessoa. Há pessoa e pessoas, só que há umas que acham que as outras não o são ou são, mas mais ou menos, assim assim, assim assado, onde parece que o que se passou já está ultrapassado ou confirma que ainda está presente o que foi passado.

"Quer que eu seja bem sincero?" ( Claro! Estamos aqui para isso! A verdade de cada um acima de tudo e todos. Mais vale uma verdade assumida com a qual eu não concorde do que uma mentira sonsa ou hipocritazinha. Vamos lá homem! Abra o seu coração!) " Eu não sou a favor das cotas raciais! Eu também não gostaria de ir para Portugal e entrar numa universidade porque existem cotas para brasileiros. Eu quero entrar em pé de igualdade e porque sou competente." ( Por acaso até existem politicas no meio universitário para se receber alunos estrangeiros. As universidade portuguesas recebem  agora às mãos cheias brasileirxs, pois são acordos diplomáticos vantajosos para as instituições, mesmo que o povo português não usufrua dessas vantagens. Eu também entrei como aluna estrangeira numa conceituada universidade brasileira. Logo logo percebi que tinha sido um presente envenenado. Porquê? Porque no meio académico humilhar a capacidade e a inteligência das pessoas é um modus operandis recorrente, sejamos bracos, negros, amarelos, vermelhos, listrados ou pingados. Sou todos muito inteligentes, desde que não saiam da apostila de citações de autores e regras de escrita académica! Saindo um cadinho já ficam zonzos e alegam que não é do seu escopo).

" Mas você não acha que uma pessoa, normalmente branca, que teve a oportunidade de passar por uma escola que é feita para preparar as pessoas para terem profissões qualificadas está em pé de igualdade com outra, normalmente negra se branca é igualmente pobre, que mora numa periferia onde as necessidades básicas nem sempre estão asseguradas? Há muitos professores e cordenadores pedagógicos a defenderem a escola pública, mas o próprio sistema nem sempre ajuda."

"Os negros são muito melhores que nós quando se poeem a fazer algo. Há bons atletas, bons futebolistas, bons músicos. O problema é que eles não se organizam e estãi sempre à espera da assistência dos brancos. " ( Caramba! Comento ou deixa quieto?) . Porque é que essas pessoas que ganham muito não ajudam as suas comunidades?" ( É o Cristiano Ronaldo também vai substituir em Portugal o que é dever do Estado com a sua Fundação filtantópica... Granda Cristiano. Os futebolistas sãos os neo messias.)

Resumimdo e concluindo: este cidadão brasileiro branco de classe média já com poder aquisitivo acima da média, como tantos muitos outros, considera que os negros, como os indigenas, não fazem parte da sociedade brasileira. Não contribuem com os seus impostos, que não são eleitorado, tampouco desconhece os movimentos sociais destes grupos. Em suma, defende o apartheid. Toma e ai buscari!  Ele está ciente disso ou é preciso avisá-lo?

A Piu

Br, 14/12/2022




terça-feira, 6 de dezembro de 2022

ALÔ ! ALÔ MARCIANOS AQUI QUEM FALA É DA TERRA REDONDA! série: o que pensam xs do lado de lá da barrigada

" Você é portuguesa? O meu sonho é viver em Portugal!". "Certo..." Silêncio.

O Blablacar é uma plataforma de caronas de média e longa distância muito jeitosa. Diria até uma prática social democrática ou de socialismo democrático, como preferirem. O dono do carro compartilha o mesmo levando outros passageiros, dividindo os custos da viagem sem visar o lucro.

A minha experiência no Brasil é que dependendo do tipo de carro já dá para sacar, quase  adivinhar vá, a tendência política de quem leva o carro. Devo dizer que sempre mantive diálogos respeitosos mesmo surpreendendo-me com a tamanha ignorância e egoísmo próprio de quem defende uma suposta democracia liberal. Nunca ninguém defendeu abertamente uma ditadura, mas eles andam aí.

 O sonho de ir para Portugal ou para Miami ainda está em curso. Ao início surpreendeu entre o risível e o revirar os entrefolhos das vísceras. Hoje um " Certo!" aparentemente neutro poupa achaques emocionais desnecessários.

 É muito bom o exercício da escuta para saber o que o adversário pensa e como opera. Saí-se da bolha daqueles que pensam quase igual a nós e entende-se ainda melhor as lutas e reinvindicações dos movimentos sociais deste imenso país. Além de ficar precavida quanto ao risco de ser confundida eventualmente com esse pessoal liberal, por ser branca e ainda por cima portuguesa!

 Há todo um discurso meritocrática, racista, individualista logo classista com uma argumentação que só por Zeus. Ainda há um medo do comunismo como se ainda vivêssemos na guerra fria. Confunde-se socialismo com comunismo. Enfim, uma feijoada aleatória de ignorâncias que dará azo a uma sequência de pequenos vídeos, áudios nesta era das imagens e textos curtos. Assim espero... Cof cof. Que sejam curtos e não tratados.

 " Se tem assim tanto medo do socialismo porque vai perder a liberdade de expressão e correr o risco de empobrecer e passar fome com a sua família (?!?!) porque quer ir para Portugal que agora tem um governo do partido socialista?" 

BINGO!!! AÍ GALERADA! Quase bingo, porque Portugal é um país com uma lógica neo liberal como todos os outros ocidentais capitalistas, mas ainda há democracia e de vez em quando ainda se elege no menos mal que mesmo assim é um tanto farsa. A ver se um destes dias vou até Miami de blá blá car comer um pastel de Belém e voltar. Vai que encontro a galerada do Woodstock a cantar Bob Dylan num posto de gasolina e ainda nos rimos de tudo isto, jogando confetis de flores de papel plastificado para o ar made in China.


A Piu

Br, 06/11/2022




sexta-feira, 2 de dezembro de 2022

O Quereres - Caetano Veloso-

Onde queres revólver, sou coqueiro
E onde queres dinheiro, sou paixão
Onde queres descanso, sou desejo
E onde sou só desejo, queres não
E onde não queres nada, nada falta
E onde voas bem alto, eu sou o chão
E onde pisas o chão, minha alma salta
E ganha liberdade na amplidão
Onde queres família, sou maluco
E onde queres romântico, burguês
Onde queres Leblon, sou Pernambuco
E onde queres eunuco, garanhão
Onde queres o sim e o não, talvez
E onde vês, eu não vislumbro razão
Onde o queres o lobo, eu sou o irmão
E onde queres cowboy, eu sou chinês
Ah, bruta flor do querer
Ah, bruta flor, bruta flor
Onde queres o ato, eu sou o espírito
E onde queres ternura, eu sou tesão
Onde queres o livre, decassílabo
E onde buscas o anjo, sou mulher
Onde queres prazer, sou o que dói
E onde queres tortura, mansidão
Onde queres um lar, revolução
E onde queres bandido, sou herói
Eu queria querer-te amar o amor
Construir-nos dulcíssima prisão
Encontrar a mais justa adequação
Tudo métrica e rima e nunca dor
Mas a vida é real e é de viés
E vê só que cilada o amor me armou
Eu te quero e não queres como sou
Não te quero e não queres como és
Ah, bruta flor do querer
Ah, bruta flor, bruta flor
Onde queres comício, flipper-vídeo
E onde queres romance, rock'n roll
Onde queres a Lua, eu sou o Sol
E onde a pura natura, o inseticídio
Onde queres mistério, eu sou a luz
E onde queres um canto, o mundo inteiro
Onde queres quaresma, fevereiro
E onde queres coqueiro, eu sou obus
O quereres estares sempre a fim
Do que em mim é de mim tão desigual
Faz-me querer-te bem, querer-te mal
Bem a ti, mal ao quereres assim
Infinitivamente pessoal
E eu querendo querer-te sem ter fim
E, querendo-te, aprender o total
Do querer que há, e do que não há em mim


quarta-feira, 30 de novembro de 2022

ANGELI NUM DOS AUGES DO SEU MELHOR


 

Angeli- É, as pessoas vinham dizer que me adoravam,acordavam e a primeira coisa que faziam era ler a minha tira, e eu dizia: "pô, eu sou demai". Aí fiz o Walter Ego, porque achei que tava na hora de dar uma baixada na bola, eu não me aguentava mais. Então resolvi fazer o Walter, construir o personagem, inclusive para funcionar como uma terapia, era uma maneira de eu percebet o quanto era ridiculo ser o Walter Ego; em certos momomentos quando eu infalava , era só lembrar dele. Depois, com o Bibelô, que era a mesma coisa. Sou de famílioa italiana, da periferia, me educaram acreditando que melhor fosse um enfeite, um adereço para a minha vida, uma coisa para eu usar e jogar fora, tipo açougue. No italiano, principalmente, isso é muito forte. Uam vez num bar, uma amiga veio me dizer que eu chegava a incomodar, atacando todas. Aí comecei a rever essa postura, saquei que era verdade, devia ser chato pra cacete aquilo de ficar ali lançando olhares, querendo caçar todo mundo. Então fiz o Bibelô. Quando eu me empólgava era só pensar como o Bibelô é rídiculo. É uma terapia, uma forma de terapia. Todos esses personagens foram resolvendo coisas minhas; o Bob Cuspe resolveu uma certa vergonha que eu tinha de ser da periferia, de família de classe média baixa. Durante muito tempo tive problemas com isso, eu chegava devendo nos lugares, e o Bob Cuspe me deu um certo orgulho disso. 


Entrevista " O matador de personagens" a Angeli na revista Mil Perigos nº5, 1991.

Tiras: Angeli

terça-feira, 29 de novembro de 2022

ANGELI NO SEU MELHOR





 
(...) Mas o Nilson não percebeu que existem vários tipos e formas de luta, vários tipos de fome. Tem a fome cultural, a fome da informação, não vamos reduzir o problema, deixar a coisa pequenininha. E o Nilson começou a assumir uma postura de criticar todo o mundo que não estava na do Henfil. O cara acredita que ele é a mão do povo que desenha.  E isso me irrita profundamente por ser uma postura paternalista e falsamente heróica, tipo " vamos falar pro povo o caminho que ele tem que seguir". Só que eu parei de pensar assim quando percebi que quem estava indicado o caminho era o próprio povo. Acho que posso colaborar muito para o avanço do Brasil e da cultura brasileira sendo original e verdadeiro. Não adiante dizer " vou para a caatinga sentir os problemas do povo" se eu sou um ser urbano, eu só vou ser bom se colocar esse lado urbano no meu trabalho. Se eu começar a desenhar caras no meio do sertão, da seca, posso estar cometendo erros, falando de coisas que não conheço. eu sentia isso em relação ao Henfil, ma o Henfil tinha o seu direito, e sua genialidade tinha um trabalho construidissimo. E aí vem um sub-Henfil dizendo que vai continuar a saga do mestre! Pô, mas que merda, mas que coisa mais de viúva cristã, que falta de originalidade!

entrevista " O matador de personagens" a Angeli na revista Mil Perigos nº5, 1991.

Tiras: Angeli

sexta-feira, 25 de novembro de 2022

DA MINHA PARTE NÃO SEI BEM O SIGNIFICADO...

 

Além de amante das lojas de livros em segunda mão, os tais dos sebos, o site da estante virtual também é muito interessante. Este é um livro que chegou há uns dias às minhas mãos. Conheci a existência do Frei Betto, assim como do Lula e do MST, quando em 99 estive por terras brasileiras e lia a revista 'Caros amigos". Essa revista, que se apresentava como a revista mais à esquierda e  que já não existe é ainda um outro texto, para quem tem paciência de ler nas redes sociais. 

Ora bem, pois pois pois eu e tu somos dois. Assim que eu abro a encomenda juntamente com o livro, deste frade dominicano adepto da teologia da libertação e que escreve estas cartas no incio dos anos 70 quando esteve preso pela ditadura militar, vem este brinde em forma de bandeira nacional. Acho que é tipo uma bolsinha para guardar aqueles chips de memória. Ou será uma borracha para apgar a memória? Fiquei intrigada tanto pela sua funcionalidade como pelo porquê deste brinde neste livro logo após as eleições, sendo que a bandeira foi sequestrada pela extrema direita... Será uma ironia ou uma tentativa de resgate e reconciliação com a memória nacional?

Depois ainda houve outra coisa que me intrigou, mas logo logo entendi a charada. Na lombada vem uma tira de marcador preto. É lá!? Um livro na lista negra a esta altura do campeonato? Abro o livro e mais marcador preto?... Depois clicou!!!! Foi extraviado ou não devolvido da biblioteca e foi para o sebo que depois foi vendido virtualmente. Ah poizé, zé mané!

Como foi agora durante a Copa e ontem o Brasil até ganhou será que é uma forma de dar aquele arriba, aquele up momentâneo em todo um espirito nacional mesmo que seja só na Copa, porque no resto... Cof Cof. Como serão os natais de família este ano?

A Piu

Br, 25/11/2022

4EVER YOUNG

 

Eu gosto de ler, para mim é um ótimo hábito desde que o nosso conhecimento não se encerre nos livros. Algumas teorias haviam lá pelos anos 70,80 e 90, quando a banda desenhada ou livros de quadradinhos - por aqui gibi ou quadrinhos- estava em alta. " Ai!Este formato deforma os hábitos de leitura!". Hoje prova-se que é uma teoria reacionária. Muitos cartoonistas - chargistas- lançam verdadeiras obras de arte tanto visual, como literária com um viés não só lúdico mas também socio político. Veja-se a Marjane Satrapi, o Joe Saco, o Art Spiegelman, o Bilal, o Corto Maltese entre outros. Não só do Bolinha, da turma da Mônica, do Tio Patinhas e do Rato Mickey vive o ser humano.
Mais do que ratinha de biblioteca sou ratinha de sebo, mesmo assim prefiro termo da minha terra: alfarrabista. Sebo dá aquela sensação de livros sebosos em estantes sebosas a cheirar a mofo. Uma aqui perto de casa além de ser jeitosinha é muito em conta. Há dez anos atrás perguntei se tinham a revista Chiclete com Banana. Não conheciam!!! Deu-me uma sulipampa! Os alfarrabistas em Lisboa no inicio dos anos 90 tinham esses gibis às mãos cheias e aqui não conheciam!?!?! Ai! Ai! Santos da casa não fazem milagres como o próprio Angeli fala na entrevista à " Mil Perigos" dada em 91. Grande Angeli! Adoro! Simplesmente A-D-O-R-O a sua irreverência e sentido (auto) crítico. Ele sim representa-me em vários pontos. Não está ali para agradar ninguém só por agradar. Se incomoda, paciência. Ele também se questiona. Ele e o seu amigo Laerte que agora é ela, mas nesta época era ele quando desenhava os piratas do Tietê entre outras tiras e personagens.
Fiquei um tanto triste de saber que o Angeli tenha antecipado a sua aposentadoria por lhe ter sido diagnosticado afasia, que afeta a comunicação. Deixarei aqui, posteriormente, alguns trechos da sua entrevista em 91 que é hilária e bastante atual.
Nem só das imagens rápidas de passar o dedo vive o ser humano com as suas curtidas instântaneas. À laia de Angeli digo mais: antes de curtir uma bela imagem leia se esta tiver texto e se este ainda for um tanto longo para alguns hábitos de leitura, leia mais que uma vez se não comprende na totalidade antes de chamar de confusx a quem escreve, Quando não entendemos podem exister várias hipóteses: ou não temos referências suficientes, aí podemos tentar nos informar (para isso o google também existe) e/ou perguntar em diferentes fontes. Ainda existe também a hipótese de algo nos incomodar porque nos tira da nossa zona de conforto e certezas e para nos defendermos dizemos à pessoa que escreve que já não se usa escrever em redes sociais como o instagram, as pessoas não vão ler ou não vai ter muitas curtidas. .... dasse as curtidas. Ou só os amigos é que vão curtir. Resumindo e concluindo expressar-nos seja com letras, imagens ou ações ainda incomoda mesmos quem se considera progressista. Não é mesmo, Angeli e Laerte? Ainda bem que existem seres criativos como vocês que atravessam o tempo e o espaço e que me recordam quem eu ainda sou quando conheci o vosso trabalho do outro lado do oceano, justamente em 90/91.
Um abraço urbano, suburbano, irreverente, consequente do como nos manifestamos para o mundo!
A Piu
Br, 25/11/2022

quarta-feira, 23 de novembro de 2022

PARA LÁ LÁ DO LÁ DO HORIZONTE


 Todos os anos, ali pelo Verão, quando voltava do Algarve a minha avó sempre dizia: " 'Tás preta! Vens sempre preta da praia!" Além de gostar de voltar com o sol na pele ( ainda não se falava dos seus maleficios) essa frase soava musical: semPRE PREta da PRAia. E daí eu pensava: " Se nós pegamos muito sol ou o sol nos pega ficamos pretas. E qual é o problema?" Mesmo assim eu prefiro viver com sol do que sem ele, meses a fio num céu baixo e tristonho à espera que ele acene timidamente. Já tentei viver debaixo da pouca luz berlinense por pouco tempo, hoje quase acredito que não me aguentaria a essa bronca. Vielen Dank. Auf Wiedersehen. Ciao ciao que eu good fico!

Estamos em Julho de 81, dali a um mês faço 8 anos. O Verão passa-se entre mergulhos gelados da Olá. por aqui sorvetes da Kibon, a série televisiva da vizinha Espanha " Verano Azul" que acompanha um grupo de crianças numa praia andaluz que vão viver momentos  e aventuras que requerem solidariedade e união. Andam todxs de bicicleta e são amigxs do pescador Chanquete que num episódio quase é despejado do seu barco atracado em terra, onde vive, pelos especuladores imobiliários. Esse grupo de crianças juntamente com a adulta Julia que é pintora cantam fazendo barricada: No! No! No nos moverán! D'el barco de Chanquete no nos moverán!"

Os anos que se seguiriam,tanto no litoral português como espanhol foi o inicio da especulação imobiliária para lucrar com o advento do turismo em massa que  se estendeu para as cidades e vilas de Portugal estejam perto ou não da praia. Nesta época, nós portugueses que ousavamos usufruir das praias algarvias que se iam se tornando colónias britânicas de veraneio já eramos tratados como cidadãos de segunda. Lugares haviam que estava tudo escrito em inglês com um custo para o nível de vida do operário britânico que mesmo assim  ía pagar em libras que valia muito mais que o escudo. Quando o euro chegou 30 anos mais tarde tudo aumentou para o dobro, agora nos últimos 5, 6 anos Lisboa até está cara para os alemães viverem, segundo um relato que escutei dum berlinense... Enfim...Portugal e Espanha, depois da crise que durou ali entre 2007 e 2017 é vendida pelos próprios governos ao turismo. Em Barcelona e Girona surgem movimentos contra o turismo, "turismofobia" é o termo, e com a sua razão. É INSUPORTÁVEL! SUFOCANTE ESSA FEBRE DE TURISTAS QUE DEAMBULAM DE FORMA DESLUMBRADA, PATÉTICA, CONSUMISTA PELAS CIDADES SEM RESPEITAR QUEM LÁ VIVE E NEM SE DAREM CONTA DO PROCESSO DE GENTRIFICAÇÃO. 

Em 1981 muitos portugueses que viveram e alguns nasceram em África, principalmente em Angola e Moçambique, foram forçados a sair de lá e uns tantos voltaram para Portugal e outros tantos seguiram para o Brasil. Compreensivel... A independência desses países africanos era uma menina como eu mais nova dois anos. Faço parte da primeira geração portuguesa sem colónias nem fascismo. Esses países, desafortunadamente continuaram a guerra desta vez civil. As feridas ainda estão abertas e lamentavelmente Portugal ainda sofre dum racismo estrutural e dum saudosismo colonialista, mas existem portuguesxs na contra mão dessa lógica mofa e dacadente. Como tal não precisamos que brasileirxs brancxs ou embranquecidos nos valores mas sem abrir mão dos seus privilégios ou não tendo a consciência dos mesmos venham dar lições de moral entre uma foto turistica um pastel de Belém mal mastigado enquanto ocupam Portugal sem sequer conhecerem as crises de desemprego e a luta dos trabalhadores portugueses e outras injustiças sociais. Em suma, retire o seu pé de cima do meu e o seu cotovelo de dentro do meu olho e não me atire areia para os olhos . Gratinados. 

Ainda não tenho aquela real vontade de visitar Portugal, vou esperar um pouco mais que a moda e a febre de Portugal passe, mas o que eu sinto muitas saudades é da minha casa no centro de Lisboa com muitos amigos de todas as cores, comidas angolanas e cabo verdianas com muita música boas vibrações. Muitas dessas pessoas sairam de lá. Umas voltaram para África e outras subiram mais a norte da Europa. Mesmo assim eu prefiro o hemisfério sul não só por ficar preta da praia mas para conhecer com humildade e respeito terras que um dia foram invadidas com avidez ganância e violência.

A meu eterno respeito e admiração aos povos originários cujas culturas são riquissimas em sabedoria, resistência, re existência e bem viver. Axé! Haux haux!

A Piu

Br, 23/11/2022

segunda-feira, 21 de novembro de 2022

NÓSOUTRAS, AS MOURAS


Mouras ou moiras? Louras ou loiras? Moiras morenas e mouras loiras? Elas lavam a louça ou a loiça? Mouras encantadas ou desencontradas? Nós viemos do fundo dos tempos,tanto do sul como do norte,fruto de batalhas cruzadas, segundo reza a história oficial. Somos mouras vindas de África, celtas vindas do centro da Europa, visigodas vindas de territórios germânicos e escandinávos, latinas vindas do imperio romana, etc, etc, etc. 

As descendentes de mouras, entre oitras (?!) descendencias passeiam pelo porto de Peniche três anos após a queda do fascimo. Tem a petiz Ana, ao lado de sua avó, seguida por sua mãe e finalmente sua tia. Não, desta vez não fomos visitar a Fortaleza de Peniche, prisão que a partir de 1934 isola presos políticos anti fascistas antes de estes serem deportados para prisões nas ex colónias em África. Já se vem que os indesejados ao bom funcionamento da sociedade portuguesa sobre o mote " Deus, pátria, família" não eram mandados para terras de África para colonizarem os povos originários e sim para apodrecerem no Tarrafal, em Cabo Verde e outros presídios. Curiosamente nunca vi nenhuma foto de turistas brasileiros na frente da Fortaleza de Peniche ou de Caxias. Já em frente ao Padrão dos Descobrimentos e ao Mosteiro dos Jerónimos é às mãos cheias, com a ambiguidade que transita entre o deslumbre, a sonsalheira de acharem que os todos os portugueses são colonizadores e eles não. Sendo que os mesmos é que gozam dos privilégios duma sociedade tão desigual como a brasileira que ainda perpetua práticas colonialistas. Pouco sabem da História de Portugal e a do Brasil também roça o duvidoso. Enfim, nada que eu não tenha escrito anteriormente. Só se torna um pouco intrigante o porquê de alguém se dar ao trabalho de investir em atravessar o oceano, seja para turistar, trabalhar ou estudar em que além de não nutrir afinidade com o povo português ainda acha que ali vai encontrar a terra das oportunidades ou que vai ajustar contas com esse povo, fruto dum ranço histórico que lhe foi passado na escola sem filtro. Oh Lula,pá, faz lá o favor de acalmar os teus conterrâneos,  dá-lhes condições para voltarem já que muitos se arrependeram dessa ilusão em massa e dignifica o ensino da História na sua potência máxima. Parabéns, Lula, por neste teu governo ser implantado o Ministério dos Povos Originários. Demorou, mas agora vai! 

Aqui temos três gerações de mulheres, mãe com duas filhas e uma neta, num momento de transição, de democratização digamos. A matriarca é uma trabalhadora braçal como tantas outras, as suas filhas estudarão para datilografar e os afins das papeladas próprias de trabalhar na frente duma secretária. Já "piquenita" sou eu cuja avó dizia: " Vocês agora teem tudo e não dão valor a nada!". Realmente quem passou uma vida com muito pouco ou quase nada ter alguma coisa já era ter tudo e não deixo de lhe dar razão. Parece que quanto mais se tem, menos valor se dá a cada coisa. Não verdade não precisamos de tantas coisas e sim da dignidade de não vivermos na penúria e em situações precárias, ditadas por um mercado de trabalho neo liberal.

Da minha parte ser apologista do que o que é bom é sermos eternamente " coitadinhas e probezinhas"... pá, não me parece que seja por aí. E isso não nos faz madames. Nada contra as madames. O que é ser madame? É gostar de se cuidar, ter estilo, apreciar comidas, viagens, lugares que durante gerações lhe foi negado e que agora pode usufruir fruto do seu trabalho e da sua rede familiar que também é trabalhadora? Ser madame é ter o real prazer de ajudar e apoir outras mulheres a se ergurem? Ou ser madame é achar que é mais que xs outrxs e o que o valor do trabalho alheio é muito pouco ou quase nada?

Em criança eu ficava muito curiosa por saber o que estava para lá do horizonte do mar. Curiosidades dum espirito aventureiro, mas nem por isso colonialista. Vamos  devagar em relação a essas conclusões precipitadas forjadas no preconceito fruto desse ranço histórico. Em suma: " Menas, seja menas e escutemo-nos mais e assim os encontros tem o frescor de se verem livres de ranços!"

Até ao próximo texto desta moura não muito loira, celta que nunca andou de asa delta, lusa umas vezes mais outras nem tanto confusa, neste mês da  Consciência Negra, importantissimo para a sociedade brasileira e todo esse processo histórico carente de reparos aqui e além mar. 

A Piu

Br, 21/11/2022

quinta-feira, 17 de novembro de 2022

O SENSO COMUM É O ÓPIO DO POVO

 Aqueles últimos dez anos no Brasil tinham sido muito "engraçados". Engraçados não! Curiosos, mas também engraçados, estonteantes com apontamentos do meu mau génio, gênio vá. Ninguém é prefeito e aqueles que juram a pés juntos que o são há que prestar atenção! Não sei se a meditação erradica, assim como outros métodos de auto conhecimento e auto controle. De vez em quando, quando o senso comum se instala como uma bactéria parasitária que não vai lá com diálogo de voz branda e sábia... Ai! Ui! Ui! Ai! UAAAAHHHHH! DRAGÃO FOGÃO! No meu caso o mau gênio, génio vá, ele surge após várias suspensões de "deixa ver ver se eu percebi bem...", estados de choque de "é mesmo isso?" até chegar num daqueles " BASTA!!!", tipo Mafaldinha do Quino. Mesmo assim,acredito que é mais razoável escrever, mas o dia a dia do quotidiano, cotidiano vá, nem sempre é só escrita e leitura e sim interação que depois podemos digerir e escrever sem personalizar.

Segundo a brasilescola ponto uol," o senso comum é um tipo de conhecimemento popular adquirido pela observação e pela repetição, que não foi testado metodicamente. O senso comum é muita vezes adquirido pelas convenções sociais." Assim sendo, quando se trata de convenções sociais ou psiquicas o(s) sujeito(s) não precisam de observar, apenas reproduzem algo que se convenceram ou deixaram-se convencer por outros. 

" A religião é o ópio do povo!", afirma a mulher branca petista com uma bela voz cujo  repertório musical é afro brasileira, logo com um forte cunho religioso. Vamos lá dissecar a coisa, descascar o abacaxi. Espero que essa mesma mulher, que se por algum acaso  estiver lendo este texto não se ofenda nem amue com a minha pessoa e sim sinta-se provocada a refletir. 

Essa frase que tem sido usada ao longo das últimas décadas pela ala, ou alas, dita revolucionária que na sua origem está a revolução russa, é uma frase eurocêntrica e desrespeitosa com os diferentes povos, Primeiro os impérios invadem e tentam matar a identidade e a fé de inúmeros povos para os evangilizar e assim os controlar, depois vem a revolução russa que é uma vertente do imperialismo para proibir e perseguir o povo que acredita em algo que transcende a matéria. No caso proibe-se a subjetividade individual e coletiva, com os seus rituais e cerimónias que consagram a existência, para melhor controlar. 

O "velho comunista brasileiro de secretária", como o próprio se apresenta ( um comunista teórico zzzzzz) que esteve preso em 1973 no Brasil em 2019 diz-me ele assim... quando eu comento que o Chile estava a viver um momento muito complicado semelhante ao golpe do Pinochet, manifestantes cegos pelas balas atiradas por policiais, pessoas presas e outras mortas e expostas em via pública. " Ah! Isso faz parte da revolução! Vê-se mesmo que você, Ana, não sabe o que é comunismo nem socialismo!" Se ele não fosse da idade do meu pai ainda lhe chamaria pirralho com todas as letras. Na época ainda o tentei informar que eu tenha tido relações próximas e intimas com pessoas da Alemanha do Leste. Depois com o tempo de digestão conclui que mesmo sendo um senhor de quase 80 anos não passa dum priveligiado que provavelmente não sofreu tortura, porque quem a sofre não fala de boca cheia que faz parte da revolução ser mal tratado e até morto. Como já estava pelos cabelos com tanta imaturidade que se mostrou ao longo do tempo com a dificuldade de viver em coletivo nem lhe disse que conheci ex guerrilheiros colombianos como o Pablo Catatumbo que num pequeno teatro em Bogotá, após ter assistido a uma peça de duas jovens ex guerrilheiras, emocionou-se e afirmou publicamente que a revolução não é mais pela guerrilha e sim pelo diálogo e negociações.

Os guerrilheiros, em nome da revolução, mataram muitos camponeses indigenas e não indigenas cuja espirtitualidade e fé ancestral é resistência e re existência. Que preguiça ter que escutar em pleno século 21 tantos sensos comuns que são desrespeitosos e que subscrevem a mentalidade colonizada e colonizador, achando que estão muito à frente, mas carecem de escuta e observação plena e generosa.

Pronto, este é um dos aspectos do meu mau génio, gênio vá. Ninguém é prefeito, mas podemos ir nos exercitando para não cair sempre nas mesmas tretas. 

A Piu

Br, 17/11/2022




terça-feira, 15 de novembro de 2022

MIL NOVECENTOS E VINTE E DOIS- O CENTENÁRIO DA MINHA AVÓ


 Aquela década começava para alguns como os conhecidos anos loucos, entre a uma guerra mundial e outra dando azo a fugas, exilios e refugios da Europa para a  terra nova, o novo mundo. Esses anos de boémia e adventos da modernidade mesmo assim eram só para alguns, para os que podiam, que para todos os efeitos era uma minoria. No Brasil, numa São Paulo ainda considerada provinciana, o ano começou com a semana dos modernistas. Um marco na história da Arte, onde algumas pintoras aparecem nesse universo marcadamente masculino e eurocentrico, embora com a antropofagia artistica como bandeira duma identidade nacional. 

Do outro lado do oceano, na factualmente considerada a terra dos colonizadores do Brasil e que ainda colonizava territórios africanos, surgia o partido comunista português, assim como a União Soviética. Nesse mesmo ano nascia o líder mais carismático desse partido: o advogado Álvaro Cunhal, assim como o serralheiro mecânico, jornalista e escritor galardoado com o prémio nobel da literatura: José Saramago, comunista ortodoxo.  Também nasce o Darcy Ribeiro, ex ministro da Educação no Brasil. 

Acontecimentos carismáticos com nascimentos de pessoas ilustres que à sua maneira fizeram a diferença. Mas essas eu não conheci pessoalmente. Já a minha avó, que nasceu nesse mesmo ano no Vale de Santiago, concelho de Odemira, no Alentejo, palco em 1918 duma greve geral pela União Operária Nacional reprimida e que levou muitos dos conterrâneos da minha avó a serem presos e deportados para África.

Estas mãos são dela. Mãos de quem trabalhou uma vida inteira. Mãos que contou as moedas para dignamente não ficar a dever nada a ninguém nem ter a fama de migrante desonesta e pouco confiável.  " Não fiques com nada que não é teu!", sempre me lembrava e eu sempre recordo. Recordo que ela queria ser alfabetizadora e não pode realizar esse sonho, mesmo tendo a "sorte" de ter sido alfabetizada num período de republicanismo conturbado que antecede o fascismo. Lembro que ela foi um exemplo de amor e cuidado mesmo com as suas tristezas vividas ao longo da vida. Recordo-lhe que se hoje escrevo, entre tantas outras atividades, é para honra-la e devolver o que não é nosso, mantendo a nossa identidade. " Vó, não somos madames mas temos que nos lembrar em não confundir privilégio com direitos. Temos direito à educação, à moradia, à nutrição, à saúde, a realizar o que sonhamos e faz sentido para nós. a sermos felizes,  e a não permiteir que nos destratem, caluniem e difamem em toda e qualquer circunstância porque somos mulheres e portuguesas. Eu sou do mundo, mas primeiro que tudo sou portuguesa dentro destas divisões de território impostas. Gratidão e parabéns por teres feito questão que as tuas filhas, onde está incluida a minha mãe, pudessem estudar mesmo em tempos tão obscuros como o do fascismo. Não foste o exemplo de mulher emancipada, mas abriste caminhos. Um abraço eterno e profundo que atravessa o tempo e o espaço."

Rosária dos Santos ( 1922-2014)

créditos: João Alexandre Pereira

A Piu

Brasil, 15/11/2022

Errata: O Álvaro Cunhal nasceu em 1913.

A GAROTA DA BICICLETA AMARELA

 

Há muito ca, qui a, garota não pedalava. Ele há momentos cá, qui a, vida é assim e depois volta ao normal ou ao quase normal. E o que é a normalidade?
A garota, que já não é garota mas até é mas não é e é, é como o Bip Bip que passa e o Coiote nunca consegue pegar.
Agora aqui entre nós, esse Bip Bip é um tanto irritante. Chato vá para ser um pouco mais iluminada. Passa sempre a correr com um sorriso no bico e o coitado do coiote frustra-se e o conflito é interno e pessoal porque o Bip Bip nem dá por ele ou finge que não dá. É como aquelas pessoas que se cruzam connosco e nem bom dia nem boa tarde porque a sua soberba do bem de sorriso no rosto é acompanhada com o narizinho altivo para não se contaminar com energias alheias ao seu bem estar individualista.
A garota pára para comer uma tapioca naquela feirinha em frente a biblioteca central onde unicampeões deambulam. " Faz tempo que não vinha cá. Vi a chegar de bicicleta." Pronto afinal ela é a garota da bike amarela que sempre que pára alguém lhe diz que já a viu três vezes a passar mas que ia tão rápido que nem deu para chamar. A garota pedala rápido? Depois do confinamento parece que o pedal ficou mais pesado. Vamos lá desconfinar essa pedalada e parar quando necessário para aquele " Por aqui? Quanto tempo! Que bom te ver!" Tudo passa até o confinamento e os governos coisalhadas! E viva, viva!"
Ai essa garota da bike amarela que nasceu no mesmo do dia que a Gal Costa só que depois. Ciao Gal, segue em paz, que a garota segue pedalando.
A Piu
Borrão Geral. 11/12/2022




U TU PIUS


Aqui temos uma adolescente, como outra qualquer, no ano da graça do setor do anos 80. 89, um ano quase quase como outro qualquer, mas não.
Reparem na golinha da bluseta: preta com contorno vermelho. Uns dirão: " Ah são as cores da bandeira anti fascista!" Ok, pode ser, mas a garota das argolas grandes não a vestiu com esse propósito embora aquele adesivo, auto colante, amarelo com um sol smile ' armas nucleares não obrigado' fizesse parte do visu da sua mala escolar. Já o seu sorriso é uma tentativa de driblar as fotos burocráticas, o que pode transmitir um " Ah tá! Então é isso!"
Na noite de 9 para 10 de novembro de 1989 o Muro de Berlim cai, dando início ao fim da guerra fria. Se está acabou ou não já é uma outra história. Para uns parece que o Muro ainda lá está e em terras brasileiras uns ainda enaltecem a União Soviética como um exemplo de regime a seguir. A garota de 16 anos continua a ir a Festa do Avante, promovida pelo partido comunista português, nos anos seguintes mas fica ainda mais atenta a propaganda política e a omissão do que foi realmente aquele regime totalitário e assassino. É agradável tomar conhecimento disso? Não, não é. Muitxs viram as suas ideologias e certezas ruir. Mas um regime totalitário, logo militarizado, que se apropria de princípios igualitários é como os que defendem o porte de armas em nome de Jesus.
Hoje a garota que não tem mais 16 anos, naturalmente, comemora a queda do Muro de Berlim e o fim desse totalitarismo. Não comemora a vitória do capitalismo selvagem e o consumismo desenfreado. De jeito nenhum maneira!!! Comemora as pessoas terem liberdade de expressão e circulação e de não serem perseguidas, torturadas e mandadas para os campos de trabalhos forçados na Sibéria ou serem mortas.
Esse regime Soviético é farinha do mesmo saco do fascismo e do capitalismo só muda, aparentemente, o sistema econômico. Mas a oligarquia e os privilegiados também existem. É que há uns mais iguais que outros, pois pois. E quem parte e reparte e não fica com a melhor parte ou é tolo ou não tem arte, ora pois! Morreram as vacas e ficaram os bois.
Hoje, com todos os desafios que é viver e enfrentar o neo liberalismo existem vários movimentos individuais e coletivos onde a pauta do dia é o auto conhecimento, consumo e alimentação consciente e formas mais saudáveis de nos relacionarmos. Se é uma utopia ou não cada um deverá fazer a sua parte na prática o resto é conversa, despotismo e seguidismo sem escuta, nem observação e reflexão.
Há quem diga que a religião é o ópio do povo... Basta saber o que se entende por religião e espiritualidade. Não serão as instituições, sejam religiosas ou políticas, o ópio do povo assim como o materialismo que escarnece do que não é palpável, visível? Até a vista social clube! Até ao próximo texto!
Viva a liberdade e a democracia!!!
A Piu
Br, 09/11/2022



E DIGO MAiS: VIVA A REFORMA AGRÁRIA!! CRACK! CRACK!

#coisismonuncamais