Etaaaaa! O dia 25 de Abril por aqui foi cheio de acontecimentos de dia útil, pois por cá não é feriado. Mas agora, mesmo agora percebi a contradição de feriado e dia útil. Há feriados que eu nem sei porque o são. Olha! São úteis para sair da rotina! Mas de facto há feriados que são por um santo aqui e ali e aí eu penso:"Caramba! Como os santos feriados nos lembram que existem santos. Será que os santos padeciam de contradições humanas?"
Mas dia 25 de Abril foi feriado, não aqui mas lá no Portugal contemporâneo e sempre nostálgico. Foi feriado em Portugal para comemorar o fim do fascismo, da guerra colonial e do colonialismo.
Nesse dia fui exercer um exercícicio que considero cívico. Fui fazer um boletim de ocorrência por atropelamento de uma menor, ao qual foi não prestado socorro pelo atropelador. Os acidentes acontecem, mas cair fora? Cai tudo por terra!
Na repartição onde os ferimentos leves foram registrados dei de caras, na sala de espera, com um rosto de uma mulher de tez morena. Olhou-me. Olhei-a. Olhamo-nos nos olhos. Olhamo-nos. Os nossos olhares apoiaram-se um no outro sem julgamentos, sem histórias mentais. Só depois vi, um bom tempo mais tarde que ela estava algemada. Olhei para os pés dela e estava descalça. Falava tranquilamente para os policiais que tinha perdido os chinelos que alguém lhe dera. Entramos para a sala. Passamos por um monte de mulheres sentadas. Um policial mostrava, do seu i phone, a foto do filho às mulheres. "Criança bonita!", falava uma. Na saída a Nina exclamou:"Tantas mulheres algemadas! Mulheres assassinas!?!" Respondi que nem tinha reparado que elas estavam algemadas e que para ali estarem daquele jeito é porque não tinham cometido esse crime hediondo. Curiosamente reparei na interação entre pessoas, uma interação aparentemente tranquila e humanizada. Pensei:"Porque é que só pobre é colocado neste lugar humilhante que acaba por naturalizar por ser tão recorrente?"
Depois passamos pela biblioteca e eu peguei alguns livros para as meninas. Tinha uma série de livros infantis de autores portugueses contemporâneos. Trouxe este. Gosto muito. É sarcástico e lúdico. Aqui vos deixo um trecho:
"Deve olhar-se sempre para os lados antes de atravessar a rua. É o que eu faço cada vez que quero chegar AO OUTRO LADO DA ESTRADA. É UM MÉTODO QUE RESULTA MUITO BEM.
Mas não deixo de reparar nas outras pessoas. Algumas são distraídas (como a minha tia que gosta e pássaros) enquanto outras não, como, por exemplo, o Sr. Oliveira (que é o administrador do prédio). ELE OLHA SEMPRE PARA OS LADOS QUANDO ATRAVESSA A RUA. MAS NÃO OLHA PARA O LADO QUANDO APARECE UM POBRE. Provavelmente nunca tem trocos."
Ana Piu
Brasil, 27.4.2104
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