segunda-feira, 22 de abril de 2013

SUCH A WAY OF LIFE

Transtorno. Era isso que sentia. Transtorno. Diante de todos aqueles jeitos e trejeitos sentia uma reviravolta na tripa. Primeira secava por dentro como se a energia se esvaisse por uma pequenina fissura há muito aberta. Depois só desejava que a sua pele caisse, mudasse como acontece às serpentes, aranhas, tarantulas e outros animais que assustam alguns bípedes. Sentia transtorno, uma leve tristeza de poder eventualmente assustar quando a sua energia volvia furacão e as mesas num vira virote dançavam pelos ares. Só sabia que não queria mais aquilo para si. Aliás, nunca quiz. Tentava dar largas passadas e sair daquela gelatina ora flácida ora dura e intransigente. Gelatina mental adocicada com corantes e conservantes com pretensões a comestibilidade. "É o que há! É assim!... Já sabes como é!..." Aquela gelatina infiltrava-se mesquinhamente nas dobras concavas das orelhas, desavergonhadamente instalava-se na bolsa lacrimal.
Nããã todos aqueles jeitos e trejeitos causavam-lhe um gosto amargo, um gosto de aluminio ferrugento. Não queria mais escutar sobre fulano, sicrano, beltrano e do seus dias a dias mesquinhos, desatentos, reprodutores dos poderes que criticavam.
Só desejava silêncio. Um silêncio que traz sobriedade. Um silêncio que não se compra nem se vende às parcelas. Queria muito arrumar dissabores, deixa-los dissolverem-se nas gotas do tempo. Só desejava um silêncio que não cabe em pacotes promocionais de auto conhecimento e espiritualidade nobre de cobre banhado a  sucedâneo de ouro. Só precisava de silêncio, para se esvaziar de todos aqueles jeitos, trejeitos rarefeitos. Desejava felicidades sinceras para fulano, beltrano, sicrano. Tinha algum medo da sua animalidade, que a sua muda de pele assustasse os que por palavras proferiam aquilo que na prática adiavam. Adiavam em pequenos gestos quotidianos de solidariedade, quando um colega é despedido, quando um amigo é desalojado, quando um familiar cai doente numa cama. Detalhes tão grandiosos que de tão detalhadamente grandes eram desprezados, porque neles estava o sabor concreto da revolução. Revolução essa palavra que é tanto e que rapidamente se torna um não.
Depois o silêncio, para que a pedra miudinha saisse daquela bota nem sempre fácil de descalçar. Uma bota de memórias, de acreditar que pode ser diferente. Uma bota engraxada, pisada, abandonada.
Desejava a plenitude do silêncio e os pés descalços. Desejava a simplicidade de ser e estar e seguir caminho de respiração leve. Leve, leve, muito leve.

a piu
Br, Abril de 2013

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