sábado, 26 de janeiro de 2013

MALA DE SONHOS

Um ano. Aqui estou eu há um ano. Tanta coisa mudou e tanta outra que está na mesma. Talvez seja essa a única evidência da vida. Umas coisas mudam ou se alteram ligeiramente, outras ficam exatamente no mesmo lugar. Hoje escrevo o que falo. Hoje escrevo como falo, adaptando ou tentando adaptar-me aos lugares e circunstâncias. Passei a escrever "ótimo" em vez de "óptimo", de facto não perscincindo do "facto" pois é factual que falo o "c" e fato é aquela roupa que se veste para ir à natação (fato de banho) ou para ir para o escritório (fato e gravata/paletó). Continuo a ser espectadora, porque em terras tropicais os espectadores são espectadores e não espetadores. Suavizo o meu sotaque para me fazer entender. Qualquer dia volto a falar com o meu, mas com as vogais mais abertas!
Aqui estou eu ao fim de um ano. Sonhando contribuir com melhoras para o meu país e de vez em quando sofrendo à distância por continuar febril, prostrado, num sofá deitado, reclamando e gemendo. Farei o que puder, mas entendi que talvez seja mais sano contribuir com o que está ao meu alcance. Escrevendo, sem pretensões de verdades absolutas, mantendo contacto com os amigos que tanto prezo. O resto são mal entendidos e no final a conclusão desagua em choques de egos e pouca valorização do próximo. É dessa maleita que o meu país padece: escassa iniciativa, desvalorização de propostas com outras sobrepostas e rápida desistência. Canha dá-lhe canha. Talvez seja essa a diferença con los hermanos espanhuelos. Uma guerra cívil no vai ou racha.

Conhecer pelo menos a História do último século talvez não seja nada mal pensado. Saber que existiram duas grandes guerras mundiais, guerras pela luta da independência, guerras e ditaduras criadas e sustentadas pela terra do Tio Sam. Saber que houve uma uma guerra muito fria, que os embargos ainda aí estão. Que houve um Maio de 68! Uma tentativa de mudança de paradigma que em muito mudou e que em muito veio acentuar o que já existia. Houve um muro que caiu.Conhecer a História é ter presente que esta pode repetir-se com contornos ainda mais nefastos e sofisticados. Talvez hoje os campos de concentração são nas próprias casas. Deitados nos sofás, desempregados, endividados até ao pescoço, atarantados por habituados a nível de consumo já não o possam fazer. E vai daí que se seguem as paranoias, as obsessões, os medos compulsivos até chegar ao suicídio. Outros não se suicidam efectivamente, mas vão morrendo por dentro aos poucos, muito aos poucos ou então de uma vez só. São zombies nas ruas e dentro de suas casas.

Aqui estou eu faz hoje um ano. Uma coisa quero manter acesa. O prazer de estar viva. O prazer de estar com quem tem prazer de comigo estar. Afinal já são duas coisas. Três: o prazer de ser o que se é, aceitando as tosquices de cada um. Há tosquices que para mim têm limites. Rir do outro não é o mesmo que rir com o outro. Rir de nós, das nossas misérias humanas é muito mais divertido do que rir detonando quem achamos que abaixo de nós está. Rir de quem se acha superior também acho divertido. Mas o que eu mesmo gosto de rir é de mim e do ridículo da vida. Rir dos poderes vãos e de suas bajulações, rir da minha imperfeição.  Rir para não chorar. Rir da indignação. Saber também não fazer concessões. Não conceder o aprisionamento da liberdade de expressão, não conceder a ofensa e preconceito em relação a outros credos,modos de vida e etnias. Não enveredar pela história do bode expiatório: do árabe mau, do cigano porco, dos emigrantes que roubam empregos, do culpado do colonialista que já não o é há 200 anos ou até mesmo há 40. Responsabilizar-nos pela cama em que nos deitamos. Ufffff que desafio. Agora algumas vozes ou mentes profiram:"Esta aqui tem a mania que é boa! Deixa só ver onde anda o calcanhar de Aquiles da moça." Daí vou já avisando que qualquer calcanhar de Aquiles que possa ter e tenho é um alívio para o meu mortal ser. Por ser de carne e osso, por dentro levar emoções e sentimentos e por ser mortal, como já apontei. Por ser como o Constatino, de vez quando desatino. Por ser como a Benta, trago pêlo na venta. Por ser como a Marta, de vez quando a coisa farta. Por ser como o João, inflamo o coração. Por ser uma mãe, no final tudo está bem. Por ser como a Hortênsia, estar bem é uma questão de sobrevivência.


Passado um ano aqui estou eu longe e perto. Perto e longe sabendo que se algo tem de mudar é dentro de nós. ufff que desafio que pode rapidamente virar um cliché. Uma frase feita. Quanto a isso prefiro ir escrevendo as minhas frases e inquietações. Vou escrevendo e escrevendo vou pensando um pensamento por tentativa e erro; desejando que o coraçanito se amacie para todos os obstáculos, desafios e aventuras do que é o viver.

a piuuuuuuu
Br, 26 de Jan. 2013


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