Maria era o seu nome. Poderia ser
Mariana, Marieta, Marinela. Mas era simplesmente Maria como muitas
outras. Muitas outras no seu país e no mundo inteiro. Quantas Marias
não existirão? Marias católicas, Marias judias, vadias, ateias, de
meias, bonitas e feias. Esta era Maria Namora. Ahhh! Da família do
escritor neo realista! Do Fernando Namora! Nããã! Nada disso.
Namora de namoradeira, de solicita, de delicodoce. O que causava
transtorno a Marta, essa mulher intempestiva de coração grande, era
a tal da postura muito solicita de Maria. Cheirava a esturro,
cheirava a inverdade, cheirava a cheiro velho.
Cruzaram-se. Maria e Marta cruzaram-se
nas curvas do viver. Maria admirava Marta. Admirava que admirava.
Maria quando chegou aquele trabalho foi estigmatizada. Era um grupo
muita porreiro que vivia para fazer o bem à sociedade. Malta do bem,
mas sem levantar muitas ondas. Todos muito contentinhos com o seu
quinhãozinho. Não se podiam queixar haviam pessoas em situação
muito pior. E eles eram do bem. Mas Marta não se conformava
trabalhar na precariedade. Não se conformava de ser bonzinho em vez
de ir a fundo no seu trabalho de crescerem juntos, de marcarem a
diferença pela qualidade e não pela imagem dos bonzinhos.
Marta estava sobre mira. Qual dia salta
fora. Pobre e mal agradecida.
Marta propôs juntarem-se para
melhorarem o trabalho fora da hora de expediente.
A entidade patronal perguntou a Maria
como estava a correr o trabalho. Não se sabe se por ingenuidade,
burrice, oportunismo, sacanisse falou que era dificilde trabalhar com
a Marta. Mesmo sobre aviso que se falasse tal coisa Marta seria
despedida Maria delatou na mesma. Talvez se tenha arrependido, talvez
esse arrependimento se tenha transformado em orgulho para que ficasse
de consciência tranquila. Seja como for deixou de ser estigmatizada
pela entidade patronal e passou a ser a menina dos olhos, respeitada
e querida.
Marta implorou ficar apenas mais uns
meses por necessidades óbvias.Ninguém vive do ar, tampouco os seus
filhos vivem do ar. Não discutiu com Maria, pediu-lhe apenas para
não mexer mais no assunto. O que estava feito, estava feito. Maria
respondeu:” Assume as tuas responsabilidades.” Marta nem lhe
respondeu. Para quê?
Marta foi embora com um sentimento
difuso, sem saber se haveria de sentir nojo ou pena de Maria, que na
sua jovem idade era ainda o espelho dos resquicios duma longa e negra
noite obscura e delatora. Porém foi embora apaziguada com uma única
certeza: que faria tudo o que pudesse para que esse tipo de episódios
não voltassem a acontecer consigo e já agora com os outros. E como
o faria? Escrevendo. Deixando registos de memória. Registos que nos
relembrem que a delação, a conivência com poderzinhos
desnecessários, com a bajulação mesquinha são um buraco fundo que
não levam a lugar nenhum. Aliás, levam. Levam à repetição
sinistra da História.
A piU
Br, 29 de Dezembro de 2012
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