HONRANDO AS MINHAS RAÍZES - II
Hoje vou contar a minha experiência com o Living Theatre em 1995, ou 96? em Montemor-o-Novo, uma cidade vizinha de Évora onde eu frequenatar o curso de atores no Centro Cultural de Évora e mais tarde viria a fazer parte dum elenco onde continuei a apresentar pelo Alentejo profundo. Eu comecei a minha trajetória profissional na terra dos meus avós, mãe e tia. Fiz, naquela época, o movimento inverso. Eles migraram em 1949 para o súburbio de Lisboa e eu saí de Lisboa e fui para o Alentejo, do Alentejo para o mundo. Já assisti a umas maõs cheias de teatro, performance, manifestações artisticas variadas onde artes visuais obviamente estão contempladas, assim como música e afins. Reconhecer quem veio antes de nós além de fundamental deveria ser um dever ético, se não corremos o risco de não sair da nossa conduta pirralha armada aos cucos, achando que estamos na vanguarda e na crista da originalidade. Como artista a reinvenção é fundamental, senão corremos o risco que a mesmice tome conta de nós.
Em 1995 ou 96, 21/22 anos se tinham passado depois da revolução dos cravos. Essa era a minha idade, e lá está eu estava consciente que fazia parte duma geração pós moderna, e que os grandes ideais de cooperativismo, reforma agrária e direitos dos trabalhadores andavam ali numa corda bamba, num cai cai balão na rua do " poderia ser mas não é não". Sim, no meu ponto de vista a minha geração tem um olhar irónico, cinico e em alguns casos até sonso, em outros cansado, outros ainda bora levanatr o queixo e seguir com dignidade nem que tenhamos que sair do país que tantas vezes nos tem mostrado que não fazemos faltinha nenhuma. Sim, sermos divertid@s e rir das nossas realidades pode até parecer uma fuga mas é enfrentar a derrota de algumas utopias e não deixar de trazer utopia no coração.
O interior de Portugal ainda é acanhado, tradicionalista, provinciano. Quem é de Portugal ou conhece com o minimo de profundidade sabe disso. O pessoal teatreiro das redondezas foi quase todo participar da oficina do Living Theatre. Tivemos a oportunidade de conhecer a Judith Malina, que fundou em 1947 essa companhia nem Nova York. The Living Thetre com toda a certeza teve a sua importância e impacto numa época, mas a proposta que eles traziam para o Alentejo dos anos 90 era completamente desfazada da realidade. Espera aí... Eu sempre riu quando me lembro... Eu e a minha amiga Cristina do Aido nos ensaios em cima daquele amontado de pessoas umas em cima das outras no chão, em que uma se levantava por impulso e dizia umas palavras de ordem: " Avante! Liberdade para todos! Pão para o povo! Eles nãos nos vencerão! "ou a esfregararem-se num ato entre paz e amor e a orgia. Nós as duas passavamos nervoso para não rir descaradamente daquele brincar às revoluções num país que se tinha vendia à comunidade económica europeia e que uns tantos, nomeadamnente de esquerda tinham-se beneficiado no individual ou na sua panelinha com essa vendilhice. Depois eu não me via a ir para a rua provocar o Ti Jaquim, a Dona Maria, a Tia Alzira, o compadre Manecas, mais a comadre Catrina com esse esfreganço orgiaco que tinha dado prisão nos EUA nos anos 60 ou 70. O pessoal do Living Thetro tinha ficado lá atrás, com a agravante que se nós chegamos num lugar, numa região, país que não é o nosso a primeira coisa é entrar em contato com as gentes, as pessoas daquele local. Criar vinculos ao invés de provocar gratuitamente. Qual é o interesse de eu chegar perto da minha avó e chocá-la só por que sim? Qual é o interesse de irmos para a rua ou convidarmos as pessoas para uma sala e não entender as suas necessidades, a sua história e reproduzirmos as mesmas coisas que fazemos há 20, 30, 40 anos? Com isto não estou a desmerecer o trabalho desse grupo, mas questionarmos faz parte desse dever de sermos sujeitos históricos e no caso artistas, poetas, e cidadãos com vários oficios.
Isso é o mesmo que a pessoa chega a Portugal, a esta altura do campeonato e pavonear-se que está na terra das infinitas oportunidades e que ainda para mais está na Europa. Parece até piada, daquelas irónicas porque demonstra desconhecimento e falta de afeto,empatia para com povo português trabalhador que rala, rala, já não passa fome como há 40 anos atrás mas também não se encontra na Europa tal e tal, bambam. Pronto, tirando isso seja bem vinde quem vier por bem, sem preconceito, ranço histórico canalizado em pessoas do povo que não são responsáveis pelo colonialismo, e que também sofreram e algumas ainda sofrem da exploração do seu trabalho.
Valeu de coração chegar até aqui, acreditando que estes transitos intercontinentais sirvam para estramos mais próximos num abraço fraterno de escutas e entendimentos mútuos.
Vou continuar a rir do esforço que eu a Cristina faziamos para não rir, mas riamos, com as barriguinhas a tremer ou a levantarmo-nos para dizer palavras de ordem entre o épico e o melodrámático: " CHEGA! BASTA! SOMOS MULHERES!" Ihihihih Eramos muito cínicas! Mas do bem! Do bem!
A Piu
BR, 27/10/2021
Crédito: Amanda
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