quinta-feira, 18 de março de 2021

SE ESTOU AQUI É PORQUE CURTO ESTAR AQUI


 Na Grécia Antiga, coturnos eram aqueles sapatos enormes que se usavam no teatro para os atores serem vistos, também dá aquele porte divino e altivo dos deuses da tragédia grega, As mulheres estavam excluídas das andanças teatrais. Só lhes era permitido participar de manifestações populares. E olha lá! Uma democracia, mas só para alguns, onde mulheres e escravos não tinham os direitos democráticos assegurados. Bom, já não falando que democracia e escravatura não é uma rima muito certa... Um tanto destoante. Assim como machismo e democracia também dá uma mistura duvidosa.

A Grécia fica num enclave intercontinental. Continuarmos a afirmar que a Grécia é o berço da civilização é desconsiderar tudo o que vem antes, tanto da Ásia, como da África e mesmo da Europa. O continente Americano talvez esteja incluído, mas como não tenho conhecimento suficiente para remontar histórias de milhares de anos atrás e possíveis contato não vou especular. 

A especulação é uma bactéria que se não tomamos cuidado vira uma verdade, muitas vezes difamatória e caluniosa. Quando não sabemos procuramos saber ao invés de reproduzir ideias feitas que não passam de preconceitos com base em algumas verdades, mas lineares.

Existe, com certeza, teatro produzido no continente Africano, mas precisa de ser mais divulgado. Os artistas e as artistas africanas ou afro descendentes mais conhecidos são aqueles que andam pelo mundo. Existem lugares mais propicio às trocas e estímulos. Como a  Grada Kilomba artista multidisciplinar afro lusa ou luso afro, nascida em Portugal afro descendente diz: ' Para desenvolver o meu trabalho precisei de sair de Portugal." Ela mora em Berlim e é  (re)conhecida internacionalmente. Questionadora do racismo, machismo e atitudes ainda colonialista não assumidas ou mesmo assumidas em Portugal ela faz parte duma geração, que é a minha, de pessoas que assistem e vivem uma transição histórica que é o fim do fascismo em Portugal e do Império Português em África. 

Quem mora ou já morou em Portugal e principalmente nasceu e cresceu lá conhece os contornos do povo português. As suas lutas, os seus lutos, as suas tacanhices, as suas rebeldias, perseguições, torturas, mortes, desistências, re existências. Por isso não me parece justo, principalmente depois de tantos portugueses anti fascistas,, muitos com filhos, terem que emigrar por vontade própria ou não serem chamados de colonialistas ou burrinhos ou sei lá o quê. E de repente Portugal ter virado o país bom de mais para se viver e nem os portugueses tinham percebido isso... 

Nós, portuguesas e portuguesas, sabemos que o país é pequeno, muitos com uma mentalidade provinciana e moralistas. Sabemos tudo isso. Há uns que até podem fingir que são muito á frente e Portugal é muito moderno. Modernizou-se um pouquinho, mas a caminhada é longa

Pessoalmente, quando decido mudar-me para um país tem de haver vários aspectos que eu admire nesse país. Eu admiro o povo brasileiro,  e aprendo muito com este povo de diversidades múltiplas e complexo, reconhecendo as suas tacanhices e libertações. Por vezes eu me pergunto o que faz um brasileiro ou uma brasileira mover-se para Portugal, principalmente depois duma crise financeira e de desemprego que se viveu profundamente em torno duns 10 anos. Pergunto se realmente se se adaptam ao astral português. Mesmo sendo portuguesa, aliás por ser portuguesa, eu tenho a minhas sérias dúvidas se voltaria a me adaptar a Portugal.Mas sinto carinho e afeto pelas pessoas que lá vivem, além de família e amigos. Quando uma pessoa não se sente a gosto precisa de se perguntar se realmente é ali que quer estar e viver ou então procurar parcerias à altura. O que pode levar algum tempo. Em mim eu observei no Brasil: ao me despir dos meus próprios entraves e crenças limitantes as parcerias porreiras legais foram acontecendo, porque eu também as valorizei de facto. Com todos os desafios que é ser mulher, estrangeira... E quando isso acontece as coisas fluem, porque também deixamos de encontrar defeito em quase tudo e passamos a celebrar as coisas fixes bacanas que a vida nos oferece quando nos abrimos para receber. E aí somos vistas e vistos sem a necessidade de subir em coturnos. Somos nós mesmes alinhades com o nosso propósito de vida.

A Piu

Campinas SP 18/03/2021


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