terça-feira, 21 de janeiro de 2020

POP, MAS NÃO POPCORN


Sim, eu sou da geração pop, da geração X como designava o escritor Douglas Coupland. Sou a primeira geração que nasce num Portugal democratizado e sem colónias. Da geração em que as mulheres, pelo menos as dos centros urbanos, não tem como objetivo primeiro casarem-se e sim realizarem-se como seres humanos capazes de agir por conta e risco e de amar quem escolhem amar. Mas o caminho não é a direito. Lá isso não é.
Sou da geração que começa a ter acesso ao consumo e ao ensino superior democratizado, aliás mercantilizado onde o sonho de muitos pais que não tiveram acesso ao mesmo sonhavam em que os seus filhos virassem doutores. Enfim, uma geração de doutorxs s, arquitecxs, engenheirxs, advogadxs num número maior que a oferta de trabalho. Faz parte do deslumbramento das massas dum país recém democratizado e desruralizado que se transformou numa instância balnear e posteriormente num Portugal dos Pequenitos com pasteis de nata, fios de ovos, ginginha e vinho para degustação daqueles que no norte da Europa passam o dia a comer sandwiches. Um Portugal dos Pequenitos em ponto grande para se gastar em euros e realizar um sonho um pouco manco dos portugueses em acharem por momentos que fazem parte da Europa desenvolvida, gourmet e abundante.
Sou da geração em que os cinemas não eram em shoppings e sim em salas grandes, algumas com livrarias ao lado e onde levar comida e bebida para dentro da sala era impensável. Muito menos ruminar pipocas o filme inteiro deixando para trás uma instalação de descidadania porque alguém vai limpar.
Das coisas que me dá mais prazer numa grande cidade é entrar numa boa sala de cinema e assistir a filmes que não são yankis, com aquela fórmula de muita perseguição, truca truca e vingança. Chiça! Nossa senhora da Agrela, abre as portas que lá vai ela!!!
O grande barato ( tugalhada oh eu com expressões brazucas!!!! Converti-me de vez  ) de morar perto de São Paulo é não morar em São Paulo e poder voltar para o meio das árvores e poder deslocar-me de bike uma grande parte do tempo. O grande barato mesmo de São Paulo é por ser uma das cidades mais cosmopolitas que conheço, com os seus traços provincianos como toda e qualquer cidade. Como por exemplo: Paris. Paris é provinciana. Porquê? Porque ainda não conseguiu se desenvencilhar da sua arrogância de achar que é o centro do mundo, da cultura, o exemplo da democracia e da laicidade. Desrespeitando assim de forma camuflada ou escancarada pessoas oriundas de outras sociedades e culturas que a exemplar França um dia invadiu, anexou e subjugou. Obviamente a sociedade francesa tem coisas incríveis, é dos poucos países que ainda valoriza a cultura e a arte assim como os profissionais das mesmas. Porém esse apoio também faz perto do projeto de afirmação e dominação no mundo.
Neste final de semana assisti ao dois filmes passados em Paris sem pipocas na sala e com muita gente na plateia como nos velhos tempos!!! Filmes passsados em Paris só que sobre o lado que não é tanto cidade das luzes.. "Synonymes" de Nadav Lapid é uma co produção entre a França, Israel e Alemanha que fala de um israelita que chega a Paris para cortar com as suas origens hebraicas, por conta da situação que se vive até hoje na Israel. O filme retrata bem um Paris burguês, dum patriotismo caduco, e arrogante em relação aos emigrantes. Já " Os Miseráveis" de Ladj Ly é um retrato incrível do subúrbio parisiense que, de alguma forma, se assemelha ao brasileiro com a diferença que são bairros sociais e não favelas e mesmo assim o cidadão emigrante vai sabendo dos seus direitos e violações dos mesmos, podendo precariamente se defender. Em suma, uma desconstrução dum Paris glamouroso, duma Europa sem problemas e muita segura. Bom, tirando Paris - onde certa vez estudei teatro na conceituada escola do Jacques Lecoq com uma bolsa de estudo duma conceituada Fundação portuguesa, a Fundação Calouste Gulbenkian que apoia várias áreas disciplinares e artistas com trajectórias consideráveis, informação importante para aqueles que acham que ter bolsa é coisa de pobre, como já escutei nestas bandas tropicais - nunca senti que pudesse ir pelos ares num vagão de metrô em outra cidade do mundo.
Resumindo e concluindo, se no Brasil a questão do impacto colonial é importante, os estudos pós coloniais e as diversas afirmações por parte daqueles cujos antepassados sentiram na pele o que é ser subjugado e que hoje ainda precisam de se afirmar para serem incluídos numa teia social do qual já fazem parte, nos países da Europa esses mesmos que um dia foram invadidos tem que, de alguma forma, bater pala a uma postura eurocêntrica muitas vezes impositiva e não inclusiva.
Agora basta perguntar-nos de que lado queremos estar: do lado do glamour fajuto ou do lado daqueles que até hoje não são escutados e com eles construirmos o nosso dia a dia numa cultura de paz.
A Piu
Campinas SP 21/01/2020






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