sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

ÀS VOLTAS COM O MUNDO DIPLOMÁTICO


Esfolheio a revista. Leio sobre a possibilidade ou não da esquerda grega poder mudar a Europa. Nos artigos acerca do assunto falam da Grécia e de Espanha mas nada de nada de Portugal. Porque será? A velha história. Realisticamente respondo para mim: Portugal é tão insignificante para o mundo que até mesmo na sua penúria não suscita interesse. Tento desenvencilhar-me desse fantasma. Repito mil vezes para mim:" Não estás na Europa! Continente novo, vida nova. Desepega-te das pedras no sapato!"
Nas redes sociais dou de caras com um concurso literário. "Ei-los que partem" desafia aqueles que partiram do nosso Portugal provinciamente modernizado a escrever sobre a sua ida de um país que não oferece esperanças de presente e futuro. Fico na dúvida se escreverei o texto. Já escrevi com muita indignação, dor, esperança e dor misturados. Algumas vezes fui mal entendida, principalmente por aqueles que não vivem a situação na pele e comentam:" Ah vocês na Europa sempre estiveram habituados a tudo!" Comento agora brevemente para continuar:" Sem comentários, principalmente vindo de quem tem acesso à informação, a viajar também e generaliza. Mas tudo bem! Compreendo. Visto Portugal e Grécia nunca fazerem parte do imaginário glamouroso de quem viaja para a "Europa", enchendo a boca no "O" e no "A".E talvez porque as necessidades básicas tenham sido sentidas pelas gerações anteriores, ou até mesmo em tempos recentemente idos pelos mesmos, mas isso dá vergonha de lembrar e a memória é algo que se exercita se não vai embora. Assim sendo, muitas vezes a alegria surge de uma forma duvidosa, mas dá para entender visto o processo histórico do velho e novo mundo serem o que foram e são Na verdade todos nós almejamos felicidade. Agora está em cada um de nós a tarefa de encontrar a sabedoria para tal.
Volto à leitura da revista. Detenho-me na coluna "quadrinhos" por Maria Nanquim, do Le Monde diplomatique Brasil de Fevereiro de 2015. O artista do mês é o Raphael Salimena. Eis um trecho da entrevista que me reconforta saber que somos alguns a pensar assim:
"EXISTE ALGUM TEMA QUE VOCÊ EVITA ABORDAR EM SUAS TIRAS?
Não curto muito mexer com figuras públicas, políticos e coisas do tipo. porque as pessoas pegam aquela piada e usam como discurso depois, como se aquilo fosse "certo" ou "errado", e vira uma munição para um "lado". Se faz uma piada com a Dilma, vira material do PSDB, e vice-versa. Uma coisa maniqueísta, fora do contexto, e o nosso material pode contribuir para o esvaziamento dessa discussão já que é tão rasa. Eu quero passar o mais longe disso que eu conseguir.
VOCÊ SE AUTOCENSURA?
Desde que recebi um puxão de orelhas do Laerte por causa de uma piada de gorda, comecei a pensar se aquilo era realmente o que eu queria com meu trabalho e foi fácil ver que não era. Não acho que a piada que eu fiz valia mais que o sofrimento de ninguém e não quero usar minhas tiras para perpetuar esterótipos que a humanidade já deveria ter ultrapassado. (...) Creio que há muitas maneiras de fazer rir sem ofender e quero testar isso o máximo possível. Então não chega a ser autocensura, já que esse humor "metralhadora giratória" é algo que parei de fazer com naturalidade. Não tenho esses momentos "será que vai dar merda se eu publicar isso?", o que agradeço imensamente ao Laerte."
Da minha parte também agradeço virtualmente ao Laerte o seu trabalho que tive oportunidade de visitar na sua exposição retrospetiva lá na Avenida Paulista em São Paulo. Na ocasião o Laerte estava presente a dar uma entrevista para um canal televisivo. Nunca sei muito bem como me comportar diante de alguém cujo trabalho admiro. Além de resistir à bajulação a minha timidez resiste em dizer pessoalmente:"Laerte, muito obrigada pelo seu humor politicamente incorreto, mas pleno de princípios éticos. Gratidão por fazer do humor algo libertador de preconceitos que obscurecem a humanidade."
Ana Piu
Brasil, 16.02.2015
tiras de Raphael Salimena

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