Lá vai ele transferido para uma gaiola suite. Por momentos pode ver o mundo aos traçinhos. Mas vê. Não canta. O tal do passarinho está estupefacto com tal surpresa. Leva algum tempo para ser novamente tapado. O pano está a acabar de ser bordado. Por não cantar, rápidamente lhe colocam um pano que não tapa por inteiro a gaiola. Canta um pouco. Um dia Balbina, achando-o triste por não cantar, mete a sua mãozinha na gaiola para o pegar e acariciar. Cá fora, pousado sobre a palma da mão de Balbina ele recebe os afagos dos deditos, fechando os olhos.
Volta a pô-lo dentro da gaiola. E no instante em que está a mudar a água e a alpista o pássaro de pequeno porte pousa as suas patitas na portinhola, bate as asas e sai voando às cegas. Esvoaça pelas paredes e pelo teto da marquise, indo contra as coisas. Até que as suas asas levam-no em direcção à janelita entreaberta. E sai voando aos tropeços. O mundo que conhecera debaixo do pano e mais tarde aos traçinhos apresentava-se agora grande, libertador e assustador.
Deu-lhe sede. Bebericou duma poça escura no meio da estrada. Passou um carro por cima dele, mas nada lhe aconteceu. Cansado deixou que a fome o paralisasse. O seu coraçãozinho não resistiu muito mais tempo. Depois dum profundo suspiro pousou a cabeça como poisava dentro da sua gaiola e fechou os olhos.
Balbina chorou muito. Sentiu-se culpada de ter deixado fugir o passarinho. Tentou convencer-se que ele estaria bem. Estaria livre.
Para limpar a alma saiu para a rua deixando que a chuva a encharcasse. O ar estava quente e a chuva caindo cada vez com mais força. Abriu os braços. Riu-se por se sentir livre, entregue às intempéris. Havia um bafo quente no ar, mas de repente começaram a cair pedrinhas. Granizo. Pedrinhas de gelo. Parecia gelo picado a cair do céu.
Voltou para casa com a roupa, o cabelo colados ao corpo. E a sua alma mais aliviada. (...)
A piU
Br, 21 de novembro de 2012
"Historietas maluquetas da menina Balbina ou o canto da piripipiu"
imagem: Tayla Nicolleti
Sem comentários:
Enviar um comentário