É a mais pura verdade que estes últimos 500 anos não são pêra doce. Não significa que a pêra é sempre amarga, também tem umas surpresas boas. Mas parte da pêra ou está podre ou é amarga, as doçuras temos que as reinventar. Reinvenções como reparos históricos daquilo que já passou e não tem como negar. Os estragos do colonilismo fruto da expansão maritima. Enfiar a cabeça na terra como a avestruz não me parece que seja solução e vir com argumentos tipo:" Ah! Se não fossem os portugueses eram outros! As tribos africanas também guerreavam entre si e não se sabiam governar! Ah no Brasil era e é muita terra para poucos indigenas! Ah! Quando os indigenas existiam (?!?!) os holandeses e franceses também os mataram! Nós não temos que pedir perdão , pois o que passou passou e no caso do Brasil já saimos daí há 200 anos! Escravatura? Já existia em África! Ah! Os países africanos não queriam independência agora não queiram vir para Portugal! Oh preto vai para a tua terra! Nascestes antes de 75 em Angola, Moçambique, Guiné, S. Tomé, Cabo Verde? Eras português? Agora já não és! Queres entrar na fortaleza da Europa? Vais ter que ter cabedal para aguentar!" Enfim, uma série de lugares comuns recheados de preconceito, racismo, desresponsabilização histórica que infelizmente alguns seres do meu povo português ainda espirra, cospe, arrota, quando não vomita. Mas isso não desresponsabiliza os cidadãos brasileiros, angolanos, moçambicanos e todas outras nacionalidades envolvidas nesse processo histórico de colonização e as suas ganâncias e oportunismos. Veja-se o caso da Isabel dos Santos, filha do camarada (???) ex presidente angolano José Eduardo dos Santos. É a mulher mais rica de Portugal, isso também não deve ser o mais dificil, e mais rica do continente africano!!! Ok... Voltemos ao beijo da serpente Portugal, Brasil.
O repórter Carlos Fino na sua tese de doutorado/ doutoramento sobre o estranhamento entre lusos e tropicais, entre portugueses do hemisfério norte e descendentes de portugueses e europeus do hemisfério sul tem toda a razão: os que ficaram são parte desse projeto colonialista e que em muitos casos o perpeturam até aos dias de hoje. Que @ cidadã brasileir@ tende a ter uma relação de amor/ ódio com Portugal fruto do que se aprende na escola e da narrativa da mídia. Eh pá!... Eu levei tempo a entender isso e ainda estou a entender. Por um lado é surpreendente e até irritante que um brasileiro branco com essas origens ancestrais venha dizer: " Vocês portugueses vieram- NOS colonizar." Bom, primeiro eu não vim colonizar ninguém, nem conheço alguém da minha linhagem que o tenha feito, se o fez não há memória ou registro disponivel. Segundo, esse deslocamento distorcido dum sujeito histórico revela aqui duas coisas: que sente vergonha da sua anscestralidade ( talvez seja compreensivel, caso a coisa tenha sido prosperamente feia, Tipo, é bisneto ou neto dum fazendeiro, dum empresário corrupto. Enfim, cada um terá que meter a mão na consciência e na árvore geneológica) e que é mais fácil encontrar um bode expiatório mesmo que seja um cidadão comum português que estava num outro lado da vida, numa outra luta. Numa luta pela liberdade, pelo fim do fascismo e do colonialismo.
Já o Fino propor um feriado nacional no Brasil no dia 22 de Abril, penso que seria nesse dia, " Dia do Cabral". Oh my dog! Sem noção!!!! Que ondas de violência não aconteceriam neste país?!?!?! Se ainda fosse o " Dia da Reconciliação".... Não, espera. Soa a beatice, a coisa de padreco que faz a m.... e depois abençoa. " Dia do reparo histórico". Tá bem assim? Mas aí, também terá de haver um feriado no 15 de Março " Dia do fim da ditadura militar". Seria uma boa ideia! Já fazia liga! Primeiro a pessoa comemorava o Carnaval, descarregava as visceras, beijava quem tinha que beijar ( isto agora é algo mais lá para a frente) e depois começava ali umas 5 a 6 semanas de comemorações do dia 15 de Março até ao dia 22 de Abril. Assembleias populares, congressos onde se escutavam os movimentos indigenas e negros, das mulheres, dos trans, dos homosexuais. Um fórum como acontecia em Porto Alegre. Nessas comemorações haveriam espaços por todo o território onde escritores, ativistas, artistas periféricos, indigenas, negros apresentassem o seu trabalho e as suas reinvindicações. Nesse fórum estarima presentes portugueses e portuguesas, fossem diplomatas, politicos, como artistas, escritores, cidadãos de qualquer oficio. Bom, penso que seria um passo para o beijo doce. Quanto mim, a partir de agora, só quero beijos doces porque já tive a minha dose de cidadãos equivocados com ódiozinhos de estimação e que cobardemente descarregam numa mulher, no caso eu, mas poderia ser outra qualquer.
Eu sinto-me muito aliviada de estar no Brasil e não em Portugal. Sinceramente. O meu estômago ainda não está preparado para me cruzar na rua com turistas brasileiros de classe média alta a engolirem pasteis de Belém e a tirarem fotos no Mosteiro do Jerónimos e a exclamr o tempo todo: " Maravilhoso! Até parece Miami com todos estes yates junto à Torre de Belém!" Também não tenho estômago ainda para intelectuais brasileir@s que fazem lives para o Brasil falando que estão na Europa, em Portugal, e quando encontram um parceiro de profissão falam:" Oi cara! Temos que nos encontrar na França!" Aaaaargghhhhh essa ostentação deslumbrada eurocêntreico esquerda gourmet com un ranço de estimação escondinho pelo português e até uma certa dose de superioridade também me tiram do eixo. Vão onde quiserem que eu também já fui. Essa cagança, vaidadezeca cafonita dos diferenciados, é que é dispensável.
Em suma, nestas conversas todas diplomáticas e de estranhamento raramente eu encontro alguérm que aborde com profundidade e seriedaee a importância de escutar as dores e necessidades dos outros povos, os amerindios e afro descendentes e africanos. E olhem que são muitas. Ainda não passou.
A Piu
Br, 20/01/2022
Ilustrações do artista plástico português João Abel Manta. Montagem minha.
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