HONRANDO AS MINHAS RAÍZES - XI
Aqui temos um honrar à ancestralidade com muito estilo. O modelito faz parelha com o modelito da gatita Amora. Temos aqui um cabelo branco feito de papel higiénico solto, a lembrar o penteado da Cyndi Lauper mas na atualidade. Já o vestidito preto está manchado porque dançou o foxtrot da centrifugação com outras roupas. E.. Desbotou....
Até aos 18 anos vivi numa rua chamada Rua do Lavadouro porque tinha um tanque público onde as mulheres, inclusive a minha avó materna, lavavam a roupa e era lá que se sociabilizavam e contavam as novidades umas às outras. A minha avó sempre chegava a casa com uma noticia acabadinha de sair do forno. Isto é, do tanque. Começava assim: " Ainda agora aqui ao tanque disseram-me que.... a Elis Regina faleceu." Sim, naquele lugarejo as pessoas sabiam quem era a Elis e também uma sujeita, que até é boa atriz mas só por....lelereleus, que protagonizava a feminista Malu Mulher. Sim... Essa... A que fez de Porcina. Essa que tem nome de chocolate português das antigas que agora é produto retrô gourmet: Regina.
É muito bom ter máquina de lavar, pois a vida não está para ser somente dona de casa, escrava duma condição em que algumas de nós mulheres temos tripla se não quadrupla jornada: trabalhadora, estudante, mãe, dona de casa e em muitos casos provedora do sustento do núcleo familiar. Ah! Falo dum recorte socio cultura onde a mulher, independentemente da cor, não tem faxineira, serviçais, criadagem. Não tem problema nenhum de ter faxineira, desde que esta seja justamente remunerada e respeitada como cidadã e ser humano que tem familia, que come, paga contas. pega transportes vários até chegar ao local de trabalho, adoece e também precisa de se manter resguardada da pandemia sem passar o aperto de não ter fonte de rendimento se não for trabalhar.
Assim sendo aproveito para citar a querida escritora, dramaturga, mulher negra do teatro Cristiane Sobral com quem tive o prazer de participar duma oficina de dramaturgia com ela através do Sesc: " As mulheres brancas/ Esposas em silenciosa cumplicidade/ Inventaram o feminismo/ Mas ainda lutavam/ Usando nossos corpos como escadas".
Volto aos " Lisboetas" (2004) do Trefaut e relembro cenas marcantes tanto da primeira vez que assisti como agora em que migrantes da Europa de Leste eram entrevistados. Como vimos antes, o Trefaut tem um histórico familiar de pessoas de esquerda e ele com certeza que o será , por ser ele quer escutar com honestidade pessoas que viveram durante o regime soviético sem mimimis; sem desmentir e desconsiderar o testemunho das pessoas que sofreram na pele só porque não combina com a sua ideologia, ao limite demagógica. Uma criança de 8 anos na praia diz que o pai quando era criança viveu com os avós no gulag. Sabeis ou lembrais vós, camaradas e amigos, o que era e é um gulag? Googla aí para saber e depois comenta em baixo se é fixe bacana estar sujeito a um regime stalinista. Se é bom para a tosse. Existem relatos inacreditáveis! Uma senhora que esteve 5 anos no resort da Sibéria porque contou uma piada!... Se lermos " A Brincadeira" do Milan Kundera saberemos que essas histórias são inúmeras.
Esse comentário da criança vem na sequência da mãe falar no celular com alguém na Ucrânia ou Rússia que o ensino em Portugal é muito fraco. Em aprendendo a lingua as crianças serão as melhoras alunas. Eu acredito piamente! Como nós, em Portugal, fomos testemunhas nessas época da arrogância mediocre de não valorizar os migrantes de leste em que muitos eram pilotos, engenheiros mercânicos, professores de inglês, russo e que foram menosprezados e relegados a lavar vasos sanitários e a construir as cidades para os outros debaixo de sol, muitos sem contratos e a trabalhar 12 horas por dias por 25 euros. ..... Dasse. Como assim?
Em suma: acolher, ajudar alguém seja migrante, amigo, familiar, desconhecido tornou-se cada vez mais claro para mim: é fazê-lo de coração sem o calculismo dali levar vantagem ou aquela cobrança que se está a ajudar mas está em dívida permanente e que é para a pessoa não abusar. e principalmente valorizar o trabalho da pessoa, querer conhecer a sua trajetória ao invés de achar que a pessoa não é nada ou é uma iniciante ou não pode brilhar assim tanto porque vem tirar o lugar dos locais. Isso é medicridade! Algumas vezes camuflada com aquelas vestes do bem como a Cristiane Sobral chama a atenção. Infelizmente ela tem razão.... Algumas mulheres brancas inventam o feminismo, que é uma causa emancipatória, para fazer das negras escada. No Brasil é muito comum. Principalmente no meio académico. Não são todas, mas são muitas. Já não falando dos revolucionários que inventam o comunismo e matam o seu povo e outros povos. Veja-se o que o Sendero Luminoso fez no Peru com indigenas e com o campesinato. Escrevo isto porque acredito na prática que podemos viver coletivamente duma forma mais justa, equilibrada em que o valor da vida e do trabalho sejam realmente respeitados. Agora vou ver se a roupa que está pendurada já tá seca para a dobrar e voltar aos estudos e trabalho, à meditação ou a simplesmente curtir um som e dançar ainda no meu lar doce lar. É que passar toda a roupa a ferro é aquela cerejinha em cima do bolo que muitas mulheres ao domingo à tarde e noite ainda fazem ao invés de descansarem, de se cuidarem, mesmo que estejam ca(n)sadas com homens que se dizem não conservadores. Ufa! Vamos olhar para as jornadas uns des outres com olhos de enxergar e dar as mãos, mas de verdade que isto de exigir que as mulheres sejam super heroínas, as mulheres maravilhas, é uma grande ironia do feminismo liberal. Ai querem ser autonomas? Ai querem se reaLizar mesmo sendo mães? Então levem tudo nas costas. Ser artista é profissão?Olha... para ti pode não ser, mas não atrapalha, não boicota só por achares que as mulheres são menos ou nada. A gerência agradece. Ai! Ai! " Os privilégios e as oportunidades" será uma outra série de textos depois do "Honrando as minhas raízes." AVANTE SEM DESPOTISMO E DISTORÇÕES DO QUE É A JUSTIÇA E IGUALDADE DE OPORTUNIDADES!
A Piu
Campinas, SP 16/11/2021
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