Ela sentiu-se tantas e tantas vezes. Olhava para a lua e cantava e baixinho. De noite semeava flores. Flores pequenas cresciam rasteiras. Maria ia, Maria vinha. Maria beijava a face da lua. A cada beijo a lua derretia-se um pouco. Certa vez, Maria engoliu uma parte considerável dessa mesma lua que se derretia a cada beijo.
Maria ia a voltava com o sol entre os braços, junto ao peito. Ia e voltava.
Maria amava João que amava Maria.
Maria semeava pequenas flores ao luar. Um dia Maria voou para longe. João procurou-a em cada canto da casa. Maria já não estava. No jardim as flores sorriam sobre a chuva fininha que parecia que não molhava, mas molhava sim.
Um murmúrio vinha de longe como um cântico:
quando alguém nos pisa fazemos "ui"
quando nos pisam mais fazemos "ai"
e pisamos também
quando nos pisam muitas e muitas vezes dizemos "fui"
mas entre o "fui" e o "não fui"
fico contigo
abraço-me a ti e chamo-te amigo
Maria aconchegou-se sobre o seu peito, que cansado estava. Segredou baixinho de si para si que voltaria a sorrir. Quase sorriu. Sorriu. Uma lágrima caiu. Bebeu aquela lágrima tão salgada que lhe limpou profundamente por dentro. Sorriu um sorriso suave. Leve. João também sorriu de longe. De longe, olhando-o no fundo dos olhos. Tão perto João sorriu de longe.
Ana Piu
Brasil, 20.05.2005
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