Hoje vou sair à rua. Na mão esquerda um cravo vermelho. Na
direita um kit revolução. Hoje vou sair à rua e gritar bem alto que estamos
fartos e que não pagamos. Hoje vou sair à rua e dentro do meu kit revolução
levo uma garrifinha de bolas de sabão, muito queixume e poucas propostas e
vários saquinhos de sarna para mim e para partilhar com quem não tem realmente
problemas, mas sabe que isto está mal e que não pode continuar. Hoje antes de
sair à rua vou beber um bom vinho e degustar um bom queijo, para esquecer as
injustiças que também já cometi no meu local de trabalho.
Hoje sai à rua de cravo vermelho murcho na mão. Levo o meu
filho na outra mão. Dei-lhe um copo de leite antes de sairmos de casa. Há 8
meses que não consigo trabalho. O pouco tenho não chega nem à segunda semana do
mês. No bolso levo os recibos verdes amachucados. Vivo da caridade dos amigos.
Alguém me passa um saquinho de sarna para a mão. No meio da multidão olho a
pessoa no fundo dos olhos. A minha imagem reflete-se na sua pupila. A pessoa mantém o olhar. A
malinha dela cai. Ela pergunta-me: ‘Quere vir beber uma cerveja?”. Primeiro hesito. Pego na mão do meu filho e
viro costas. Paro e respondo:”Aceito. Oferece?’
Hoje saímos à rua. Nada tínhamos na mão. Saímos juntos.
Éramos muitos grupos de trabalho. Juntos, somos muitos. Estamos cansados. Há
dias, há semanas, há meses que dormimos
apenas umas tantas horas. Pensar juntos cansa. Fazer juntos ainda mais. Nem
sempre é fácil. Estamos a aprender a escutar e a propor. E principalmente a
sermos claros com o que queremos. Hoje saímos à rua. Não sabemos qual o
desfecho, mas sabemos que não nos
queixamos só porque sim.
A piU
Br, Agosto de 2012
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