sexta-feira, 3 de dezembro de 2021

HONRANDO AS MINHAS RAÍZES - XVII



 


A nossa primeira morada foi num pote cheio de água, chamado útero.Não conheço ninguém que tenha morado durante a gestação em outro lugar. Ficamos ali sensivelmente 9 meses. Há quem fique menos, mas aí precisa de cuidados especiais. Há quem diga que no nosso útero, no das nossas mães, avós, bisas e todas as que vieram antes guardam-se memórias muito antigas. E nós vamos herdando essas memórias e guardando no inconsciente. Há que cur-a-las, limpa-las. Quem sou eu para desmentir que existe memória celular que passa de geração em geração? Para os mais céticos que a tudo chamam superstição pode-se acenar com a neurociência. Pronto, para os materialistas, aqueles que acreditam que tudo é só matéria destituida de espirito e alma... Eh pá, não sei como entabular um diáologo sem ser lida como beata, sei lá... Como... Ah! Isso é o que acontece a todes que vão para o Brasil, começam a ter visões sobre naturais e mais um pouco já estão  na bancada ivanbélica ou a tirar cursos de vidente em dois dias para ser abrir um consultório de enguiços. Ihihih enfim.... É bom descontrair e desenguiçar desses olhares assim meio que pela superficie. 

Estudando algumas linhas espirituais, não todas, identifico-me muito com a espiritualidade indigena, nas suas múltiplas variantes praticadas pelos multiplos povos deste imenso continente. Tudo tem espirito, sopro de vida. Uma pedra, uma planta, uma montanha, a floresta com os seus seres encantado. Um mosquitinho também tem espirito embora seja chato e fique ali a zumbir ao ouvido numa noite de muito calor.

Eu gosto muito de acompanhar os ensinamentos do Kaká Werá, ambientalista, espiritualista tupi guarani, Neste confinamento foram três jornadas/ cursos com ele: o poder dos sonhos; o poder sagrado das histórias, xamanismo: a via do coração. Não, ele não ensina a ser xamã. Ele partilha sabedorias muito antigas do seu povo para nos lembrarmso quem nós somos fora duma lógica cartesiana. Para mim é profundamente tocante a dignidade com que indigenas como por exemplo o Kaká Werá. a Eliane Pontiguara, o Krenak, os vários pajés com as suas comitivas de cura espiritual levam a sua sabedoria  e possibilidade de cura espiritual a esta sociedade que tanto os desrepeita, os usurpa e os agride. Estou eternamente agradecida pela oportunidade de ter contato com estes seres humanos que resistem com a sua espiritualidade, os seus movimentos de demarcação de terras, de luta pelos seus direitos e protagonismo dos seus povos, a sua arte, a sua literatura, a sua cosmovisão muito mais em conexão com a vida que todos os dogmas impostos até aqui em nome do amor, de um deus castigador.

Como disse no texto anterior eu fico mais que reticente A-S-S-O-M-B-R-A-D-A com algumas falas de algumas mulheres do sagrado feminino da Nova Era. Sim, temos que nos auto conhecer, limpar velhos padrões de comportamento, mergulhar dentro de nós mesmos e auto observarmo-nos, mas falar para as pessoas que esta pandemia é algo que temos que tomar como um processo evolutivo de expurgo da humanidade!.... Hmmmm não entendo bem o que isso quer dizer ou realmente receio entender tão bem que caio para o lado. É uma afirmação dúbia. quer dizer que só resistirão os iluminados? Então, mas afinal o Coiso, o Messias iluminado? Deve ser. Ele pega uma gripezinha e já passou, mas os pajés e o seu povo da floresta morre, assim como outras pessoas em outros contextos. Não entendo muito a lógica,talvez seja eu que ainda não tenha ascendido ao nivel seguinte de expansão da consciência. 

Depois ainda há mulheres sagradas que dizem a outras mulheres que não é bom posicionarem-se, o ativismo não é uma expressão do amor universal, não podemos causar discórdia, que temos que focar nas coisas boas que acontecem no mundo que são superiores às coisas ruins. Eh pá.... Espera aí.... Deixa respirar um pouco.... Quer dizer que os movimentos indigenas, os movimentos negros, os movimentos de mulheres contra a desigualdade de género e suas violências, os movimentos LGBT, dos trabalhadores, dos sem terra não valem nada. Uma cambada de arruaceiros. Eh pá! Isso tem um nome ou dois: alienação e positividade tóxica aliada, naturalmente, à falta de empatia, solidariedade para quem está abaixo na pirâmide social desta conjetura tão desigual e violenta. Isso para mim não me eleva e sim baixa o meu astral. Deprime, se a pessoa não tomar cuidado; Porque vai atrás dum discurso de espiritualidade gourmet, enlatada, na bolha. Estou enganada? Isto é o que eu sinto, mas posso estar enganada e estou aberta a aceitar que é uma interpretação minha errada.

Outra coisa, para finalizar. Se para uns o sobrenatural não existe para outros existe, nomeadamente para os povos da floresta, só para dar um exemplo. Para mim é respeitoso que não se dê um chute no sobrenatural porque só existe a vacuidade búdica. Podemos não abrir a porta para o sobre natural nesta nossa passagem, mas pelo menos trabalhar a nossa humildade e aceitar que existem muitas cosmovisões que estamos preparades ou não para nos aproximarmos e adentramos por águas nossas nunca antes navegadas, mas por outros sim.

Iria escrever sobre de alguns homens desconhecidos ou não, nomeadamente progenitores, acharem que podem atormentar as mulheres, os seus filhos e mães dos seus filhos uma vida inteirinha, mas o meu coração levou-me para este lugar. Então agradeço a todos os ensimentos do Kaká Werá e também de algumas mulhreres da Nova Era, mas este é o meu olhar e posicionamento no momento. Porque afinal de contas "eu prefiro ser essa metamorfose ambulante, do que ter aquela opinião formada sobre tudo".

A Piu
BarOm Gerhauxhaux, 03/12/2021
foto: Alentejo, Portugal 2005

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