sábado, 28 de dezembro de 2019

HONRANDO A ANCESTRALIDADE

direita para a esquerda: Bisavó paterna Júlia, Avó paterna Maria do Carmo ( 19 anos), primas por volta de 1944

Mãe Bia  ( 19/ 20 anos) por volta de 1966
Eu até posso dizer que está na moda falar em honrar a ancestralidade. Talvez esteja na moda para mim porque só há pouco tempo comecei a ouvir falar disso, como de sagrado feminino e constelações familiares. Talvez seja uma moda antiga e que por ser antiga não é moda e sim uma prática para curar o nosso inconsciente individual e coletivo.
Honrar quem veio antes de nós é antes de tudo olhar com olhos de ver e observar em que contextos e circunstâncias essas pessoas viveram. As suas oportunidades e limitações e fazer igual nos exemplos a seguir, assim como fazer diferente no que já não serve nem nunca serviu a não ser para uma lógica social, que no caso tem sido patriarcal.
Eu poderia de antemão, num soprinho de riso por dentro dando um ar focado, dizer que essa menina mulher moça que está em cima duma árvore, que é a minha mãe, é escandinava e que esta fotografia foi tirada na floresta Negra um pouquinho antes de ela virar hippie. Mas isso não é verdade!... Esta foto é tirada no pinhal da Abóboda, que é uma povoação a 5 km da praia de Carcavelos a 7 km da serra de Sintra e a 25 km da capital: Lisboa. Nesta época vivia-se fascismo, desde os anos 30, e uma guerra com os países africanos que lutavam pela sua independência de Portugal (1962/74). A minha mãe, filha de migrantes alentejanos que é o equivalente aos retirantes nordestinos em São Paulo, ia à missa aos domingos e estudava, ela e a sua única irmã. Diferentemente das outras meninas da região que não eram pobretanas como elas mas nunca sairam do mesmo lugar, tanto físico como intelectual como de certa forma emancipatório. Apesar de ter partido cedo, com 37 anos por questões de saúde, eu sei que ela nutria uma certa raivinha do lugar e das pessoas daquela povoação que acolheu a sua família nos idos anos 40 para 50. Raivinha pela arrogância e ignorância de olharem os alentejanos com desdém e fazerem piadas tontas e estigmatizantes. É tempo de não ligarmos para isso. O humor e o riso define quem somos e nós somos muito maiores que isso, mãe!!!  Não esquecer quem somos é libertador!
Na foto de cima está a minha bisa paterna, que nunca conheci, e a minha avó paterna ao lado que é a cara dela!!! Pleno fascismo português em que a o slogan: " Orgulhosamente sós" poupou a população portuguesa de entrar na II Grande Guerra mas não nos poupou nem da miséria, analfabetismo, fascismo e guerra colonial entre 1962 e 1974. Não sei se a bisa Júlia era alfabetizada. A avó Maria do Carmo não era. Cuidou dos irmãos, dos filhos, trabalhadora rural dum povoado bem do ladinho da Abóboda, Polima. Nada destes lugares, até hoje, tem aquele glamour que os brasileiros duma forma geral gostam de atribuir à Europa. Esse deslumbramento glamouroso que transita entre o carinho e o desdém pela santa terrinha dos seus antepassados é para mim risível e constrangedor. Risível porque além de ser eurocêntrico é um tanto cafoninha não admitir que as raízes da maioria de nós é humilde sem glamour além de sermos todos oprimidos, até um certo ponto, há séculos pelas oligarquias. Assim como fazer piada de quem é oprimido e deprimente. Piada de português não é do colonizador, latifundiário, escravocrata. Dessa também quero rir até não poder mais e cair para o lado.
Sinceramente, desejo que os brasileiros que voltarem à terra natal dos seus antepassados, seja Portugal, Itália, Japão, Líbano, Alemanha etc etc etc lembrem-se de coração de onde vieram e que continente os recebeu, seja América, África, Ásia, em momentos de esperança e desespero e honrem os seus antepassados que nem sempre agiram da melhor forma para com outros povos ou até agiram mas que não reza na história oficial. Como portuguesa, europeia, branca, com sobrenomes de origem judia e árabe escrevo às quinze e trinta e quatro do horário de Brasília no ano de 2019 no dia 28 de Janeiro: HOJE O BRASIL É A MINHA CASA. MUITO TENHO A APRENDER COM OS POVOS ORIGINÁRIOS DESTA TERRA E COM OS AFRO DESCENDENTES, ASSIM COMO ARTISTAS E PENSADORES DESTA TERRA IMENSA. E A MINHA ARTE É A MINHA PROFISSÃO ( REMUNERÁVEL) PARA TRAZER BENEFÍCIOS AO MÁXIMO DE SERES POSSÍVEL - Ah! os (pseudo) intelectuais de gabinete acadêmico dispenso porque carecem de energia vital vinda do coração mas desejo que um dia se encontrem no caminho do coração onde a meditação é mais importante que a retórica -.
VIVA NÓSOUTROS SEM NÓS E SEM OUTROS!!!
A Piu
Campinas SP Brasil 28/12/2019

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