quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

A DIFICULDADE DE LIDAR COM O AMOR


Todas as cartas de amor são ridículas escrevia um sujeito que se chamava Pessoa que escrevia cartas de amor. Esse sujeito, que se chamava Pessoa e que escrevia cartas de amor apesar de as achar ridículas, viveu num tempo ridículo, uma vida ridícula, num país ridículo. Ser ridículo tem a sua graça. Uma dose de vulnerabilidade oferece emoção, humanismo no caso dos seres serem bípedes e de se comunicarem. Todavia, depende da ridiculite. Há ridiculitude cuja a inocência, a ingenuidade são tocantes. Porém a ridiculitude pode assumir contornos para lá do ridículo, quando se assola uma cegueira, uma surdez que incapacita que o fluxo espiramidal flua. Lidar com o amor é uma grande dificuldade, pois lidar com a vulnerabilidades e a ridiculitudes é um caso muito sério! Fluirmos espiramidalmente é uma emboscada! Uma vida, diria! A transcendência da fluição espiramidal faz com que nos exponhamos aos nossos mais profundos sentimentos e isso!!!... Assusta! Demonstrar amor por quem amamos ou gostaríamos de amar mais profundamente coloca-nos num lugar de fluidez espiramidal que nos leva ao receio do afogamento. Cultivar o amor ou "pelo menos" a disponibilidade para aquele que é diferente das nossas "crenças", "inquietações" e "desejos" é dupla, tripla, quadruplamente assustador! E porquê? Porque morremos de medo de sermos dilacerados nas nossas mais profundas convicções. Recusamos subir a escada, pois receamos não voltar. Só ignoramos uma coisa que lá em cima existe, no cima dessa escada que flui espiramidalmente , um céu imenso. Um espaço sideral imensurável. E que!... Ao descobrimos tal descoberta já não queremos voltar para trás. Bom, mas como quase tudo na vida essa emboscada, essa aventura, esse empreendimento dá trabalho. Requer dedicação. Mas sendo de uma fluidez espiramidal é só uma questão de disponibilidade.

Partida, lagarta, fugidaaaaaaa....

a Piu
Br, 28 de Fev. 2013

This is another spiral staircase, now in the inside, that takes you to the turret, the highest spot in the house!

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

EU ESTIVE MESMO AQUI DESCONECTADA DAS CONEXÕES, MAS CONECTADA COM OUTRAS CONEXÕES


Ora pois bem, vemos aqui uma mocinha num retrato de grão à la 70's. A mocinha parece estar contente. A mocinha parece estar de férias. A mocinha trabalha e estuda (uuufff a alma já tá salva!). A mocinha tem a mania, mas não passa de uma mocinha com a mania. A mocinha ergue os deditos e abre os braços como quem diz:
" Finalmente um pedaço de verde neste país tropical e bonito por natureza, mas que beleza! " A mocinha lembra-se dos "Tristes Trópicos", mas agora não vem ao caso.

A piU
Br, 26 de Fev. 2013

Cachoeira



" O tema das idades da vida inspirou pintores.(...) Um outro tema popular é o da Fonte da Juventude. No século XV,é o tema de inúmeras gravuras: numa delas,

vêem-se as mulheres mergulharem numa piscina e, assim que saem, rejuvenescidas caem nos braços dos belos jovens."

Beauvoir, Simone "A Velhice", Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990.

Meu querido diário, finalmente um banho de cachoeira! Rejuvenesci! Iuuuu! Não sei se fiquei mais jovem! Nem sei, nem me interessa. Gosto da minha idade!

Aaaaahhhh! GOSTO! Qual cremes, qual quê! Ler rejuvenesce-me. Escrever também. Tomar banho de cachoeira. Nem falo. Viver. Conversar. Olhar nos olhos. Rir. Comover-me. Indignar-me. Tanta coisa que a vida tem para desfrutar! Esta viagem tem sido muito louca. A quantidade de personagens, de episódios que se abeiram e se cruzam! Viajar é uma viagem! É muita booooommmmm! Encontramos o que não esperávamos encontrar, procuramos o que já lá estava, confrontar-nos com o nosso (des)conforto. Eu sou tu. Tu és eu. A diferença entre nós é que somos iguais e diferentes na nossa igualdade. Antes de ontem conhecemos o Reinaldo. O Reinaldo é uma personagem de desenho animado. Gordinho, jeans, blusa branca, suspensórios e chapéuzinho de xadrez. Mais os óculos e o seu violão. Um músico solitário e só, embriagado. Uma personagem da noite de New Orleans.Tocou para nós e connosco e bebeu cerveja à nossa custa. Porque não? Presenciei um ato de profunda solidariedade. A Teca pagou a sua dormida no hotel sem segundas intenções. ihihih O que será daquele homem depois? Continuará a

beber até cair no escoamento das ruas? Ele toca bem e também tem uma bela voz.

Continuamos viagem. Temos passado por lugares tão opressivos de tanto que são feios e precários. Imagino para quem lá vive. Entramos numa daquelas igrejas de culto com o som altissimo. Ao fim de poucos minutos um cansaço e uma tristeza abate-se em mim. Sinto vazio. Sinto alienação a zumzibar nos meus ouvidos.Olho à volta e observo nas pessoas uma grande necessidade de se encontrarem. Mas parece-me que quanto mais correm atrás de um sentido, mais fogem de si mesmas. Uma necessidade de se encontrarem no meio de tanto ruído. de encontrarem respostas numa entidade exterior a si mesmas. Será?

As paisagens por onde tenho passado são de um ruido visual e auditivo... Sinais da contemporaneidade? Excesso de estímulos. Apelos. Muita quantidade para

pouca qualidade. Pelos lugares onde passamos as casas estão inacabadas. Começadas precariamente são reflexo de vidas precárias, desenraizadas?
Nas ruas há lojas e mais lojas de inutilidades. Inúteis porque em excesso. Excesso de objetos, de drogarias repletas de fármacos, excesso de poluição de

carros que não param para o pedestre passar e salões de beleza. Desejo tanto a leveza da beleza. Sonho com a beleza da leveza. Por vezes, só desejo um pouco

de silêncio. Uma melodia que amacie o sentir e o pensar. Como pôr término a tanta loucura? Como pôr fim a todos estes novos contornos de escravatura?

Escravatura espiritual, mental, material, laboral? Parece-me que hoje, mais do que nunca, somos escravos de nossos hábitos. Hábitos de consumo. Hábitos de

manter a cabeça ocupada mesma que essa ocupação espremedinha não tenha nada de nada.E cá andamos nos nossos afazeres, super ocupados para nos sentirmos

realizados. Úteis.Promissores. Temos também o hábito de acharmos que estamos conectados. Que estamos aí. Uffff que canseira. Algumas vezes estamos conectados

outras não. Nem sempre estamos conectados com nós mesmos!Mas o que eu acho mesmo... O cá acho muita coisa! Que canseira! ffffffff Eu cá acho que nos

esquecemos de respirar. Encontrarmos-nos na plenitude, respirando, nos escutando internamente. ffffffffff De nos encontrarmos-nos na plenitude do verde da

paisagem, do cheiro da maresia, no banho da cachoeira. Um cadinho de natureza,um cadinho cadão do tamanho do quarteirão, é tão bããããõooo.Rejuvenesce e faz

bem ao coração e ao pulmão!



A piU
Br, 26 de Fev.2013

LITERALIDADES BILATERAIS

Jerônimo (Jô)- Oi tudo bom?
Jerónimo (Jó)- Vai-se andando.
Jô- Vai-se andando?
Jó- Vai-se andando no carrinho do Armando, umas vezes a pé outras caminhando.
Jô- Tou vendo.
Jó- Vendo? Vendo o quê? Eu não tou no carrinho do Armando!

(...)

Jô- Cê tem horas?
Jó- Tenho.
(...)
Jô- Que horas são?
Jó- Horas de comprares um relógio.
Jô- Sendo assim não lhe posso pedir um cigarro.
Jó- Poder pode!
Jô- Pode me dar um cigarro?
Jó- Não vai dar!... Só tenho 23!...
Jô- Podemos ser amigos?
Jó- Olha-me este! Queres ver que te dou uma pêra! Claro, que podemos!
Jô- Uma pêra?! Pô, cê é tão gente boa! Bora ser amigo!
Jó- Combinado!
Jô- Combinado?
Jó- Já comia um combinado!
Jô- Um combinado comigo?
Jó- Um prato feito. pá! Que literal que tu és paaaa! Tou feito com este gajo! Este gajo é um prato! Não entende nada de nada!
Jô- Sou um prato!? O cara tá louco! Vou cair fora!
Jó- O chefe! Quem cai também se levanta!

A piU FEV 2013

domingo, 24 de fevereiro de 2013

CONFISSÕES DE FACA ALGUIDAR SÓ PARA EXAGERAR E A SÉRIO NÃO LEVAR, TANTO AQUI COMO EM QUALQUER LUGAR

A beleza da leveza é de uma subtileza que encontramos na mãe natureza. A Ana Teresa é uma força da natureza? A Ana Teresa é uma tesa. Conta os trocos, mas vai tudo bem. Tudo come e repete. Até a sobremesa!Com certeza! Ela é portuguesa ou holandesa? Cá para mim ela é francesa! Polonesa? Escocesa! A Ana Teresa não existe. A Ana Teresa nunca existiu. Ana Piu, se institui.
A natureza é uma invenção? Viva a beleza! Viva a leveza da beleza! A beleza tem aspereza? E a leveza é somente leveza? A leveza tem um toque de singeleza. A leveza pousa suavemente em cima da mesa. A beleza não é uma certeza. A leveza da beleza da natureza da Ana Teresa cujo o Teresa caiu e somente ficou o Piu.
Piu pipiripipiu piripipipipiu

imagem: Anita no ensaio. Anita catita ,amiga da Rita, é uma senhorita.

dedicado a Débora Gonzalez que me emprestou a expressão beleza da leveza (ou leveza da beleza?)

sábado, 23 de fevereiro de 2013

Nouvelle cousine

Eu cá trato o pessoal por tu
Gosto de bacalhau e também de peixe cru.
Eu cá sou muito chique
pego na minha bicla e desço a ladeira a pique.

Eu cá sou muito choque
Gosto de comer legumes daquela panela que se chama wok
Eu cá manifesto-me em português
Tenho a mania que não tenho, mas até tenho aquele hábito pequeno buguês de comer o prato japonês

Eu cá gosto de comer bem
degustar  acepipes
e o tal do pastel de Belém

Eu cá até trato o pessoal por você
gosto de colocar na comida óleo de dendê
                                                                Eu cá digo muito "pá!"
                                                                Também não digo que não a um belo vatapá!

imagem: prato de nouvelle cousine concebido pela maestrina Anne Pi oui (sashimi, agrião, genfibre, sementes de sésamo / gergelim, , molho de soja)



A HISTÓRIA DE UM FILHO DE UMA MULHER EMANCIPADA

Cresceu com aquele odor no nariz. Aos ombros da mãe saía em grandes passeatas. Passeatas da queima do soutien.
Sempre teve problemas de ar. Asmáticos. Pobre menino. A mãe deixava o cabelo do menino João crescer. As companheiras, camaradas e amigas  exclamavam:" Que linda menina! Como se chama?" O menino João franzia os olhos e emburrava, não respondendo. "Maria João?! Que lindo! Maria João é um lindo nome para uma criança revolucionária que vem abalar com todo um conceito de género!" O menino João arrancava um moco do nariz e fazia pontaria ao buço da senhora. Mesmo à frente da mãe! A mãe não dizia nada. Alegava que a criança deve ser livre, longe das amarras e imposições sociais!
Depois o João cresceu. Muitas primaveras se seguiram até os cravos murcharem. João começou a namorar. Aliás! Levou tempo até João começar a namorar! A mãe defendia que namorar era uma imposição social e que o amor livre é que é! É que deve ser o caminho! João aos poucos foi-se emancipando de toda aquela emancipação imposta. Namorou. Casou com pompa e circunstância. Depois foi quele viver juntos. Aquele partilhar de tempo e espaço. João e Rosa (de Luxemburgo, filha de uma grande amiga da mãe). João não fazia nada em casa e ligava a meio do dia para informar que chegaria tarde, para não esperar por ele para o jantar que mandasse um beijo aos filhos.


 # Série "Ser mulher é fogo ou as mulheres emancipadas que se esqueceram de emancipar os filhos"

A piU
Br, 22 de Fev. 2013

RASGANDO OS CÉUS DE PASSAROLA



O conhecimento é um capital. O capital do conhecimento. Dizem que a Marylin Monroe não morreu. ELa é um mito. Como tal ela está viva. Há quem diga que ela foi morta. Mataram a Monroe que beijava o Kennedy e que lhe cantava "Happy Birthday, mister president". Mataram o Kennedy que era beijado pela Monroe que beijava a Marylin e que gostava de saber o que estava por debaixo do seu vestido branco. O Kennedy sabia o que estava por debaixo do vestido branco da Mari Mon roi. E a Monroe saberia o que estava por detrás da casa branca?

Mataram a Monroe. Mataram o Kennedy. Nunca se soube ao certo quem matou o Kennedy. Nunca se soube ao certo quem matou o Bin Laden. Quem é o Bin Laden?

O conhecimento é um edifício que de vez em quando vai abaixo. de vez em quando algo ou alguém com asas joga o conhecimento por terra, deixando um grande reboliço no chão e no ar.

O conhecimento pode ser capitalizado? O conhecimento é capitalizado. Tudo pode ser capitalizado. E amado? Tudo pode ser amado? Um esgoto a céu aberto pode ser amado? A raiva de quem raiva tem pode ser amada? Pode-se amar a raiva? Pode-se amar alguém que faz da sua vida uma permanente raiva? Uma raiva tóxica pode ser amada? Pode-se amar quem matou a Marylin Monroe? A mesma que fez e que ainda faz as delicias e as fantasias de muitos e muitas? Pode-se amar quem matou o sorriso diplomático do Kennedy? E do Bin Laden? Quem ama o Bin Laden, esse maldito que matou milhares e milhares de pessoas? Quem é o Bin Laden? É o nosso vizinho simpático e correcto, moralmente aceitável e aceite que numa bela manhã sairá à rua? Sairá à rua depois de sucessivas reuniões, planos estratégicos, conjecturas e nomenclaturas. Sairá à rua, subindo e descendo escadas, digitando códigos de entrada em portas blindadas. E antes de se sentar e orquestrar botões rezará um "Pai Nosso", beijará o retrato da família e fechará os olhos antes de rasgar os céus envergando uma roupa de herói com uma sutil e proeminente bandeirinha da sua pátria na manga direita junto ao ombro.

O conhecimento é um capital. O capital do conhecimento. Que conhecimento é esse? Existem os fazendeiros do conhecimento? Como é usado o conhecimento? Para controlar ou para nos libertarmos do controle?

Conhecer é um ato de generosidade ou um ato de individualismo, de exercício do poder?

O Bin Laden lembra o Caetano Veloso, mas com barba e turbante. O Caetano escreve, compõe desejos de harmonia. Desejos de justiça. O Caetano trabalha com harmonia. O Caetano é harmonioso? O Caetano é diplomático? O Caetano move-se na chuva sem se molhar? Sabe passar no intervalo das gotas? O que está por detrás do seu largo e bonito sorriso? Que segredos guarda? Serão obscuros ou claros como os longos vestidos baianos? Oxalá que não matem o Caetano. Alguém merece ser morto?

Oxalá que o conhecimento se torne ainda mais vivo. O conhecimento não merece estar ao alcance de todos? Mas afinal o que é o conhecimento?

Hanna Mija Prakova

Br, 20 de Fev. 2013

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

PENSAMENTOS NEO SURREALISTAS PÓS PÓPARÓPÓSPÓS MODÉRNICOS (SÉRIE POIS POIS PÁ)



E depois? Depois morreram as vacas e ficaram os bois. E dos bois só resistiram dois. Ah pois é! Ah pois é! Agora já não fazem muuuuu, fazem méééé

An Xiu

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

POESIAS MIUDINHAS DE FINAL DE DIA


 Ai como é bom viver no Verão. Beber água da chuva e suco de limão.
 
Ai como é bom descansar a seguir ao carnaval. Dar uma respirada e voltar ao nomal.

Ai como é bom ser uma ave rara.
Ao menos assume-se que se tem tara.

Ai como é bom passear na rua. Conhecer a vida como ela é. Nua e crua.

Ai como é bom olhar ao redor. Arrumar tudo arrumadinho e não alimentar a dor.

Ai como é bom dizer simplesmente "É bom". Fechar os olhos e curtir um bom som.

Ai como é bom e bestial ser um pouco anormal. Seguir o instinto e aquilo que é vital.

Hanna Mija Prakova

domingo, 10 de fevereiro de 2013

O FIM DA HUMANIDADE

Ora pois muito bem!... Feitas e refeitas as contas, em média uma criança gasta anualmente 7934500000 quilolotes. Isto só em alimentação, transporte, roupa, calçado e escola. 'Tá beeeem!... Roupa e calçado não se consome sempre, mas existem sempre despesas acrescidas e hoje a miudagem só quer roupa e sapatos de marca. Ele é os nike, ele é a calça levis. Sim! Falo de crianças pequenas com essas exigências! Fazer o quê? Como contrariar!E o que eles vêem na tv e na escola!
E a pessoa também não pode contrariar. Remar contra a maré?! E paaaaa! Ando muito cansado! E gosto de dar aquele conforto. E os meus filhos vão querer cadernos da Bety Boop e do Super Muscle. Também não quero que se sintam deslocados.

Uma criança gasta em média 8929292110082829 quilolotes por ano. Á vontade! E depois onde deixá-las para trabalhar e ir na balada? Ahhhh pois! Pois é! Carissimo!!! Familia?... Bom... Cada um tem a sua vida. Os seus afazares. Não dá. As pessoas vão-se sentir abusadas por dá cá aquela palhinha. Nããããã. Bom, nesse caso... Resumindo e concluindo, concluindo e discernindo: não há vida para dar continuidade à Humanidade. Também... Já ouvi dizer que quem cuida da Birgite Bardot ,quando esta cai numa cama, são os cães e os gatos dela. E como a sua velhice é algo que deve ser guardado a sete chaves, pois o que interessa é o glamour da passagem terrena, as lambidelas dos felinos e dos canininos são fortes regeneradores da pele enrugada.

Hanna Mija Prakova

RODOLFO RITLHER


Rodolfo Ritlher, quando criança, era timido. Rir só às escondidas. Rapazinho solitário, quedava-se horas e horas observando os pássaros e as copas das árvores. Gostava de estar debaixo da sombra das árvores e imaginar histórias taciturnas. Rodolfo Ritlher também gostava de pintar. Pássaros atingidos por uma pedra eram as naturezas mortas preferidas de Rodolfo. Rodolfito intitulava a série de trabalhos como: motivos de caça. Rodolfito alvejava o passaredo em dias de nevoeiro. O
café era a matéria prima eleita para pintar, o que desfalecia as magras economias da familia.

Aquando da sua adolescencia a sua penugem começou a despontar debaixo do nariz. Esticado, em bicos dos pés, olhava-se ao espelho. Rapaz franzino que era, tinha de subir para o banco para poder acender o gás do esquentador que no banheiro, na casa de banho, no quarto dos serviços estava.
Rodolfo desejava ser loiro. Certa vez, tentou oxigenar o cabelo, mas como a sua vista era fraca confundiu o frasco. Colocou alcool no cabelo. Não deu em nada, mas sentiu-se desinfectado. Purificado. Puro, por assim dizer. Depois foi ao frasco de mercúrio. Ficou com o cabelo todo vermelho! Aflito, tentou limpar tudo antes que a sua mãe chegasse. O esquentador do gás quase explodiu. Que desastre! Rudolfito ainda ficou zonzo com a fuga de gás. Depois foi tomando o gosto. Daquele cheiro. Mas Rodolfito quase ia desta para melhor.

Rodolfito era tão timido e inseguro que com o passar do tempo tornou-se perpotente. Perpotente, umas vezes, impotente outras e algumas imponente.
Tudo queria controlar. A terra, o céu, o mar e o ar. Quando algo lhe fugia do control os níveis do colestrol subiam.

Rodolfo não tinha amigos e se alguém dele se abeirava... sacudia.
Rudolfo era uma espécie de menino mimado. Carente de afagos, quando contrariado
descomandava tudo. Muito pequenino, cerrava os pulsos e batia com os pés com pequenos pulinhos ritmados num crescendo ensurdecedor que aos ouvidos fazia cócegas.
Ritlher tinha fome. Tinha fome de se rir. Levava-se demasiado a sério. Tinha fome de comer com as
mãos e largar os talheres.
Ri Ritlher e deixa para lá os talheres. A vida está ai de carne e osso. Vem daí, Ritlher! Te abre para a vida vivida. Ritlher, meu pequenito Ritlher!

Hanna Mija Prakova

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

WASHINGTON LUÍS



Washington Luís não era somente Washington Luís. Washington Luís Baldrini Vagnovaldo de Guimarães.  Washington nasceu num dia igual aos outros. Enquanto a mãe assistia à série televisiva ”Dallas”. Há oito anos, todos os dias á mesma hora, nos finais de semana passava as cinco horas seguidinhas. Ao domingo repetia. A mãe de Washington Luís não perdia nem um minuto. Gostava de ver e rever. Lá ia assistindo às desavenças  do J.R. e do Bob. A mãe de Washington Luís desejava ir a Washington para pedir aos irmãos que fizessem as pazes. Em homenagem à paz mundial lá colocou o singelo nome de Washington.
 Luís. Luís surgiu do apreço que sua mãe tinha à cultura francesa. Houvera um rei chamado Luís. E era isso. Ahhh como ela gostava especialmente de escutar o cantor romântico Joe Dassin. Ahhh como o seu coração ficava apertado e mole! Pensava então: ”Os franceses são muito românticos, muito, mas muito sensíveis e inteligentes. Nós por cá não somos assim! ” Não se sabe também ao certo onde ela foi tirar todas aquelas idéias, talvez as escutasse desde menina e moça.
Neto de Deodato Pietro de Baldrini Araújo, Washington Luís herdou o nome de Baldrini. Um nome com estilo que ao que consta foi dado pelos vizinhos de Deodato, pois este além de se baldar à escola tinha encontrado um biscate como carregador de baldes de água do rio para o mar.
Quanto a Vagnovaldo deveu-se à faladura do avô. Falava que falava de Vagno,  um tal de compositor alemão. “Realmente no velho mundo  todos são muito inteligentes, cultos e sensíveis!” Mas o nome de Vagno era muito curto. Vagnovaldo ficava muito mais composto.
Guimarães... Então! Dizem que existe uma cidade com esse nome.  Não se sabe muito bem onde é, mas existe.
Washington Luís Baldrini Vagnovaldo de Guimarães até parece nome de pessoa importante!
Pensando melhor... Já passei por uma avenida com o nome de Washington Luís... Ele há coisas!...

Hanna Mija Prakova
Br, Fev. 2013

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Madwoman's Vision

Meredith Monk - Madwoman's Vision

A mulher teve uma visão. A mulher teve uma visão e mais outra. A mulher sentiu a sua cabeça girar. Sua cabeça girou com visões caleidoscópicas.  Seus pensamentos se metamorfosearam sem do mesmo lugar sair. A mulher viu a loucura a espreitar por detrás da caixa de óculos.  Precipitadamente desenvencilhou-se das lentes, mas seus olhos continuavam embaciados. A mulher pressentiu que o tempo não passava. Estancado estava sem um único suspiro, sem um único arfar. A mulher tentou secar a embaciez do seu olhar com um raio de sol, mas tudo continuava  a ver a preto e branco. As imagens caleidoscópicas que em sua cabeça giravam eram sempre as mesmas. A mulher sentindo-se cansada gemeu, suspirou. Primeiro expirou profundamente e de seguida sentiu que numa longa e calma inspiração seu vazio se preenchia. Respirou de alivio, pois ao respirar o tempo passava colorindo aos poucos suas visões e pensamentos. A mulher teve uma visão. Uma visão a preto e branco onde o tempo parou, estagnou sufocado. A mulher teve uma visão de imagens caleidoscópicas girando em sua cabeça. A mulher respirou voltando a colorir seus dias.

Hanna Mija Prakova

Meredith Monk - Madwoman's Vision

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

ESTÓRIAS DESEMPOEIRADAS PARA ALMAS DESAFOGADAS (série IN DUCAÇÃO SENSUAL)

- Bom, tenho de ir. O meu P.A. está me esperando.

P. A. ? Será a sigla de Paulo Almeida? Pacheco Andrade? Prudêncio Agnóstico? Pleonasmo Astuto, Pantagruel Amador, Pragmático Acossado, Pigmeu Agigantado, Pitufo Arguto, Plágio Armando, Picunhas Atinado?, conjecturo possiveis hipóteses refutáveis.

-P.A.?
-Aaaaaaahhhh! Voce não tem P.A.?
-P.A...... Talvez tenha, mas como não sei o que é.... (pílula anticoncepcional? pregadeira amazonense? pastiche amendoado?)
- Um P.A. é um P.A.
- (...)
- Um pinto amigo!
- Um pinto amigo?! (contive o riso e fiz-me de lerda). Um pinto amigo é um amigo que se chama Pinto?
- Aaaaaahh nem vem que não tem!
- Um pinto amigo é um pinto amigo!

Comecei logo a imaginar a fama, o prestígio desse tal pinto amigo. Pôôôô e o poder da imaginação é terrivel.... Tudo é possível... Imaginei grandes passeatas, manifestações na rua com o pessoal gritando palavras de ordem: "PINTO AMIGO,  O POVO ESTÁ CONTIGO!!" E o pinto amigo coitado, assustado, intimidado com tanto delirio fugiria a toda a bisga como uma seta. E novas palavras de ordem surgiriam: "PINTO AMIGO, CADÊ VOCÊ? VAMOS DANÇAR AO SOM DO ILEAÊ!"
Bom, mas voltei à conversa assaz estimulante.


- Mas és só amiga do pinto? E do dono do pinto, não és? Teria mais graça, não? (baixei as pálpebras e num ar sério e certeiro continuei) Lá para os meus lados esse género de amigo denomina-se por amigo colorido. Há quem chame também de amigo azul.
- É mesmo? (ó resposta insípida! "é mesmo" é daquelas respostas perguntas que a pessoa não sabe o que a outra está pensando muito menos o que acha e defende, se é que tem de defender alguma coisa).

- Mas olha lá! E tu o que és? Uma P. A.?
- Como assim?
- Uma paçoca amiga.
-Aaaaahh! Sai pra lá, sua jururu.
- Jururu!... Gosto!


 Um pouco mais à frente uma mãe grita para a filha pré adolescente:
- Menina se levante!Não 'tá vendo que 'tá tudo à mostra? 'Tá-se vendo seu orgão sensual!
- Orgão sensual?... O que é um orgão?

Hanna Mija Prakova


sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

A MINHA AVÓ

A minha avó Maria do Carmo era a minha avó Maria do Carmo, como poderia ter sido avó Maria do Karma. Não sei ao certo se ela tinha algum karma. Não entendo muito dessas coisas e aquela matéria que todos os domingos vem no suplemento do jornal da cidade não é lá muito convincente, apesar de divertida. Bom, mas até que posso intuir qual poderia ser o seu karma dadas as circunstâncias da sua vida. Nasceu mulher em duros tempos. Sempre comeu pão duro, pois não se podia deitar fora o pão. Havia pão acabadinho de sair do forno. Mas tinha de se poupar. Eu acho que a minha avó sempre teve dentes muito rijos. Não me lembro de ter placa dentária. Pelo menos nunca vi nenhuma a espreitar de dentro do copo de água na calada da noite. Não me lembro. Pois é! Não me lembro... E a minha avó não morreu assim há tanto tempo... Hmmmm Espero não deixar de ter memória como ela... Ou de a memória se trocar toda! De deixar de saber quem eu sou. A minha avó nunca viveu em São Paulo. Aqui há dias uma menina de 20 e troca o passo poucos anos, que vive em São Paulo, falou que lá os estimulos são tantos, que tem tanta coisa acontecendo que a pessoa  se perde dentro de si. 

A minha avó viveu no campo. No meio das cabras. Nunca aprendeu a juntar letras, porque tinha de juntar cabras. Nunca foi à escola porque tinha de ficar em casa a tomar conta dos irmãos. Parece que em vez de uns beijos, de vez em quando lá levava umas sapatadas. Agora que falamos disso... Eu não me lembro muito bem da minha avó me dar beijos... Bom... Normal. Quem não recebe como vai dar? Será que o seu karma foi esse? Não saber realmente o que é um beijo. A avó Maria do Karmo falava que falava. Ninguém a parava. A pessoa é que tinha de se pôr a milhas senão era um serão escutando um monólogo de palavras, histórias de capoeiras e quintais. Histórias desajeitadas como os bolos que fazia. Os bolos que de dentro duma crosta queimada surgia uma desaconchegada massa crua. É isso! A minha avó era um bolo. Um bolo que era nem doce, nem amargo. Um bolo queimado por fora e cru por dentro. A minha avó gostava de escutar os pássaros dentro de uma gaiola tapada. A minha avó era um pássaro dentro duma gaiola tapada?

Encontro muitas pessoas que têm nojo da pobreza. Que tem vergonha das suas raízes, porque miseráveis. Ou então a memória é curta. Comem muito queijo.  A minha avó fazia queijos frescos. Hmmm tão bom! Depois veio a febre de Malta e a malta, o pessoal, ficou febril. Eu até acho que é uma espécie de febre europeia. Uma febre pelo asséptico. Mas tudo bem, são as leis do mercado.
Se a minha avó fosse um queijo seria daqueles duros que o meu outro avô tinha na prateleira da despensa.  Daqueles que a pessoa tenta cortar e desfaz-se em lascas.Ufffff Mas esse queijo não! Que cheiro! A minha avó, apesar de humilde, não cheirava mal. Mas até acho que um abraço mais forte ou beijo bem dado a teria desfeito em lascas como esse queijo duro, mas delicioso.

A minha avó nunca se emancipou. Na sua época quem se emancipava era uma elite. A emancipação leva tempo. Apesar de ter morrido com 80 e não sei quantos anos e troca o passo já não foi a tempo de se emancipar.

E nós? Ainda vamos a tempo de nos emancipar?

ALLESG OFFEN

Meu querido diário, ontem na fila (fila!!! aiiii! vamo lá a ver mais a tal da piadinha de como se fala fila nos Portugais! ;) ) do banco (banco.... ufff nunca mais me vejo livre dessas catedrais do endrominanço.Um dia hei-de escrever um dicionário de giria luso-brasileira, mas para bom entendedor meia palavra basta). Retomando, estava eu na fila para a caixa do multinando e numa grande e visivel placa estava inscrito as pessoas que tinham prioridade. Atrás uma senhora trazia uma criança ao colo. A fila ainda levava umas tantas ou quantas pessoas. virei-me e falei que ela tinha prioridade. A senhora hesitou. ficou parada no mesmo lugar e fez um "ãããã" de encolher os ombros. Quando chegou a minha vez não voltei a oferecer-lhe lugar. Se a pessoa não está para defender os seus direitos fazer o quê?

Meu querido diário, no dia anterior numa outra fila (!!!.... aiiiii!) desta vez do supermercado (um destes dias, quando souber trabalhar a horta deixo de lá ir de vez. putchiiiii agora sim fui longe demais no onirismo) uma senhora indignadissima dirigia-se à moça da caixa:"Sabia que agora os lugares de carros para deficientes são ocupados com mães com crianças? Eu devia ter chamado era a policia!!" Meu querido diário, eu sei que à vezes devia segurar-me mas não resisti e disse:" Acha que é caso para chamar a policia? Bom, eu às vezes tenho mais receio desses sujeitos do que daqueles que são considerados bandidos." Ao que a senhora respondeu:" Eu tenho receio dos dois! Mas qualquer dia chamo a policia! Por isso o Brasil não anda para a frente!" E em fracções de segundos a fina moeda de ouro da dita senhora caiu na mais profunda da sua essência. Olha aqui para mim, para o kamikase adestrado, e fala:"E você vá para a sua terra que lá é que está bom! (o kamikase adestrado olha primeiramente com uma surpresa genuína e depois com arma de arremeço, dando aquela pausa e silêncio teatral sem perder o timing que permite uma resposta considerada à altura do cutucanço) Sim, você é daqui? É brasileira? Vá para a sua terra!" Vai daí que mantendo a altivez low profile, abafando aquele kamikase que brota do mais profundo do ser, respondi num espanto naturalista:" Para a minha terra? Para a Alemanha?" A expressão facial da senhora estremeceu.A sua boca tremelica transtornada, desconchavada, desorientada. Balbucia:" Mas voce fala português." "Pois falo, vivi lá muitos anos. Sou da Alemanha e da Itália. Se a senhora quiser voltar para a terra vamos juntas, mais os seus antepassados que vieram para cá sem eira nem beira." (Bom, alguns não vieram... Mas para o caso não é essa a questão ou até poderia ser. Mas escolhas tinham de ser feitas sempre num estilo low profile).

Meu querido diário, agora pergunto-me: Até quando as mentes serão simplesmente sombras de algo que se anseia ir para a frente? Já agora o que é ir para a frente? Parece-me às vezes que estamos a andar para trás. E não é por ser aqui ou na Conchichina. Aqueles onirismos de que os países ditos de primeiro mundo são mais esclarecidos também andam com a data de validade caducada. Certa vez em Copenhaga,vinda de Berlim, por momentos fui uma pop star. uuuhhh de Berlim! Que máximo! Mas a coisa não desenvolveu. A curiosidade ficou só no pé da oliveira. Azeite que é bom... nada. E depois de eu ter dito o meu nome de sorriso e mão no peito (foi o primeiro gesto que surgiu) o pessoallá escarneceu entre si na sua língua, continuando o seu convivio excluindo a "estrangeira" de seu deleite social noturno. Por momentos fiquei na dúvida se o meu "My name is Ana" não teria soado "My name is Hanna!" já que o meu gesto terá soado como um salamaleque árabe. Na verdade, meu querido diário, o que eu gosto mesmo de Berlim é o bairro de Kreuzberg repleto de diásporas várias. Gosto do cosmopolitanismo da cidade cheia de parques verdes e caminhos para bicicletas. Gosto da tranquilidade das pessoas nas ruas. Dos carros que param para pedestres e ciclitas passarem. Será que é porque Berlim já viveu tantos tormentos que agora precisa um pouco de paz? Um dia ainda hei-de viver em Berlim! Pena que não tenha sol suficiente e aquele calorzinho que tanto me aquece a alma. Mas aquece-me a alma sair numa cidade de todas as cores e comer fruta vendida pelos turcos e sushi dos japoneses e rir-me com os espanhois e entabular conversa com iranianos. Quanto ao resto da Alemanha... Não sei, não. Bom, mas nada como viajar. Com muitos ou poucos recursos. Por vezes os fartos recursos até impedem que o ser vivente joge com as circunstâncias. O chamado jogo de cintura cujas relações que se estabelecem, ou não, definem de algum modo a forma de ler e estar no mundo.

foto tirada em Berlim em Setembro de 2011

a piU
Br, 1 fev.2013