Os fluxos migratórios são muito bons. Dão saúde, e também nos tiram para nos devolver depois e fazem crescer. As pessoas, os seres viventes e comuns mortais quando se deslocam ganham a oportunidade de exercitar um olhar mais amplo. Um olhar é amplo é aquele que se aproxima, afasta, olha com familiaridade e estranhamento, diluindo assim ideias feitas acerca de si mesme e dos outres, assim como dos lugares, dos territórios e todas as coisas... práticas que ali se praticam. Dizer 'coisa' é uma coisa a modos abstracta, abstrata. 'Práticas que ali se praticam' é uma redundância.
Aqui temos uma redação, redacção à laia de escola, Porque não?
Sendo eu da geração X ( bebés nascidos entre 1965 e 79) só vim a a conhecer as selfies com a geração millenium ( nenés nascidos entre 1980- 94) e com a geração Z ( petizes nascidos entre 1995- 2015). Gosto muito de ser da geração X, apesar de tudo. Até o Douglas Coupland tem um livro com esse nome. Deve ser muito cool ser californiano como ele. Eu não sou,nem nunca tive na California mas sou da geração X como ele.
Nunca tive na California, mas já estudei na unicamp assim que cheguei em 2012 com duas crias pela mão, na condição de mãe solo, em plena crise financeira e desemprego no sul da Europa. A primeira estupefação foi perceber que uma grande parte das pessoas com quem contactei na época tinham um conhecimento muito superficial do que se estava a passar na Europa e uma ideia um tanto ou quanto preconceituosa para com Portugal com pouco ou nada sabia das suas complexidades. Não falando do desdém. Não todos, mas uma grande parte.
Algumas fichas caíram, mas não deixei de continuar a sentir uma imensa admiração e respeito por esta terra de mil povos. Tratei sim cuidar da minha resiliência e abrir o olhar para o que realmente nutre. Percorri muito tempo sem entender para que serve a erudição, a iluminação intelectual e espiritual se a informação vinda de várias fontes não está presente e só singra o que convém dentro duma lógica de sobrevivência, ao limite de individualismo. Não entendia, e ainda não entendo muito bem, como se pode defender os direitos dos trabalhadores quando não se enxerga um forasteiro ou uma forasteira como trabalhadora. E o que é ser forasteir@? Alguns, por aqui, acreditam que todos na Europa são ricos. E mais! Como foram países colonizadores ainda vivem à custa das colónias. Que livros terão lido e documentários assistido?
Aqui vai o primeiro toque, no que diz respeito a Portugal: a oligarquia portuguesa colonial era tão gananciosa e de vistas curtas que gastou tudo em ostentação própria, endividou-se com outras potências, nunca investiu numa revolução industrial digna desse termo e o povo sempre se manteve na miséria. Então care leitor de nacionalidade brasileira que foi ou conjectura ir para Portugal hoje de cara lavada, mas dentro duma lógica neo liberal em que o turismo passou a ser o grande foco de investimento: abra o seu olhar, a sua escuta e procure conhecer de várias fontes para evitar ranços de parte a parte. Muitos de nós portugueses admiramos o povo brasileiro, as suas resistências, o seu poder criativo e empreendedor mas agradecemos respeito mútuo sem a cordialidade falsa duma conveniência forçada. Pessoalmente dispenso. Por experiência própria, depois de me ter decepcionado aqui e ali e muito provavelmente ter igualmente decepcionado, hoje sei que as expectativas são uma armadilha do ego. Como silencio e a gratidão por todes aqueles que nos acolhem e nos dão a mão em pequenos grandes gestos sem o utilitarismo de querer daí tirar vantagem são pérolas únicas.
Só posso agradecer a todas essas almas solidárias neste imenso território sul americano e ameríndio que em diferentes momentos da minha estupefacção criaram e criam laços verdadeiros de amizade e entre ajuda com este ser vivente que sou eu como todes nós.
Assim sendo fica a questão que considero primordial: Como queremos passar aqui por este plano tridimensional? E com quem?Que memórias queremos levar e deixar sem retórica?
A Piu
Campinas SP 09/08/2021
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