quinta-feira, 13 de fevereiro de 2020

NA ARCA DA ANA ARCA - parte II

Hoje pensei começar o texto avisando que eu sou do tempo do Dinossauro Rex, mas não  dum Dinossauro rex qualquer! Um dinossauro com uma franjinha de brilhantina que é um pouco depois do mais antigo dos dinossauros, mas na verdade eu não sou do tempo da brilhantina e sim do tempo em que quando comecei a escrever diários íntimos, descrevendo aquelas atividades rotineiras tipo: acordei, tomei banho, comi, lavei os dentes e fui para escola e depois voltei e li um livro da Mafalda e escrevi à minha pen friend de Singapura uma carta num ralo inglês de escola. Ah nesse diário também escrevia que me vestia, naturalmente não ia como fui colocada ao mundo. Primeiro por causa do frio, segundo porque não era moda. O que era moda na minha infância era nós meninas portuguesas vestirmos com roupa unisexo e termos o cabelo casual. Isto é, entre o curto e a tigelinha. Já não falando que furar as orelhas às bebés também era fora do projeto emancipatório. Também sou do tempo de assistir na tv portuguesa à " Malu Mulher " e à " Jornalista" protagonizadas pela hoje polémica Regina Duarte. Essa referência televisiva da causa da emancipação da mulher hoje é uma decepção para muitas e muitos. Enfim... Vivendo e aprendendo a jogar, nem sempre ganhando nem sempre perdendo , mas aprendendo a jogar. Como cantava a Elis Regina.

Assim sendo sou do tempo da Mafaldinha. Embora ela tenha deixado de ser desenhada no ano em que nasci. Eu queria dizer que sou do tempo do Dinossauro Rex de dentes bicudos e boca grande porque o celular veio ter às minhas mãos já eu tinha uns 26 anos. Logo livrei-me bacaninha de boa de todas aquelas febres, no meu ponto de vista armadilhosas, que são os tais dos nuddes e dos aplicativos de namoros. Desconfio que mesmo se tivesse pego a minha meninice, ali por volta dos 14/ 15 anos, eu teria torcido o meu narigão e dito: " Belhaque! Granda  maluquice um tanto careta! Não me vou decepcionar comigo mesma! Isto não condiz mesmo nada com aquele trabalho que estou a fazer para História sobre emancipação da mulher onde o ilustro com tirinhas da Mafalda e outros desenhos do Quino!!"

Porque me decepcionaria, pergunta você que está aí desse lado. Porque não vejo num nudde nenhum estimulo erótico que liberte a mulher e até mesmo o homem do orgulho de ser objeto de desejo imediato onde erotismo se confunde com pornografia. E como além de trabalhar com o corpo em cena por ser atriz e ter sido modelo nu em Escolas de Belas Artes em Berlim em nenhum momento fui assediada. Dizer que os alemães são frios diante do assédio que muitas vezes se vive no Brasil pergunto quem é mais frio. Afinal de contas a temperatura da  boçalidade é um tanto baixa. Muitas de nós mulheres não estamos a fim de calor viscoso. Dispensamos. Passamos para a frente. Então,  não encontro no nudde poesia nenhuma; além deste poder cair em mãos mal intencionadas e vazar no mundo virtual. Quanto a nós mulheres que posamos escrever literatura erótica ou desenhar e fotografar o nosso corpo e até entrar em cena como chegamos ao mundo nós com certeza que divulgaremos e mesmo que vazem para o mundo virtual até agradecemos a divulgação. Porque divulgar o trabalho é um trampo do caraca. Assim sendo, a gerência agradece.

Há dois dias escutei uma história duma avó que foi fazer justiça pelas suas próprias mãos à porta da escola ( não por ser particular, mas porque segue uma proposta pedagógica de cidadania, respeito e liberdade a coisa ainda é mais hilária. Em todas as classes socais esses abusos ocorrem. Temos que avisar essa geração que está a descobrir agora a sexualidade o que é ou não saudável ) quando um rapazola engraçadinho vazou um nudde da sua neta. O garoto escondeu-se na biblioteca. Afinal ele sabe que pode ter consequências e que agora sabe que se se mete com as matriarcas não há status nem prestigio que valha, pois uma matriarca pode virar uma loba uiventa sob a lua cheia. E normalmente muitas das matriarcas não estão interessadas seguir para a justiça, porque além de ser burocrático, é moroso e vai saber no que dá. É o meu caso. Eu conheço, nós conhecemos as leis que nos protegem. A lei da Maria da Penha e lei nº 5.278/68 de pensão alimentícia.

Eu tenho tido alguma preocupação de falar com as adolescentes mais próximas de mim acerca do nudde e perguntar-lhes qual o sentido faz essa prática. Uma respondeu-me:  " As meninas confiam no rapaz, ele é que é bobo!". 'Tá. Essa é um clássico: confiar. Mas no mundo virtual temos que estar cientes que mesmo o privado rapidamente vira público. Há necessidade de nos expormos a isso? Se há, a pessoa que segure depois da onda. Por ser da época entre o Dinossauro Rex a Mafaldinha também custa a entender o porquê de expor a nossa intimidade num espaço virtual que pode ser apropriado de várias maneiras. Uma coisa é falarmos ou criarmos obras e trabalhos literários e artísticos em torno das nossas experiências pessoais. Por exemplo, trazer a público que em algum momento ou em alguns momentos da nossa vida estivemos num emaranhado abusivo. E isso é nos expormos, mas também para avisar quem está ao nosso lado que não queremos mais nos sentir isoladas e confusas com aquela situação. No livro " Prazeres e pecados do sexo na história do Brasil" do Paulo Sérgio do Carmo ele escreve que a maioria dos homens brasileiros que abusam não sentem culpa e sim envergonhados quando são descobertos. Primeiro, não me parece justo generalizar. O Brasil é muito grande e existem homens de várias índoles. Eu tenho bons amigos brasileiros de coração que somos apenas bons amigos e nunca houve nenhuma malicia. Segundo, ainda não encontrei relação entre a vergonha e a falta de culpa. A  dificuldade é minha!!! Então a pessoa sente vergonha do quê? Do que vão pensar dela na aparência, mas se estas não forem descobertas vão continuar sem escrúpulos? Um dia haverei de compreender... Mas essa informação é preciosa! Quando nós falarmos publicamente sentimos-nos mais  protegidas e faz assim com que o outro lado pense antes de agir. O que é que normalmente um abusador faz? Isola-nos ou tenta nos isolar. Então, quero acreditar que estes textos, como de muitas outras mulheres assim como obras artísticas sejam estas performativas como plásticas sirvam para denunciar de algo sem ter que recorrer às autoridades. DA minha parte evito as instâncias maiores, quero continuar a acreditar, que todxs podem agarrar a oportunidade de se auto conhecerem e superarem essa limitação que é ver na outra pessoa um corpo para satisfazer o seu cio. Sim, porque existem por aí argumentos que defendem a poligamia alegando que os animais também são poligâmicos. Aproveitando, alguém conhece alguma espécie animal além do ser humano que pratique o poliamor ou que use o tinder surpresa, aquele aplicativo que só de pensar em ter curiosidade de entrar e conhecer já me auto decepciono comigo mesma. Pontos de vista, claro! Considero que esses aplicativos são a manifestação pura e dura  da dificuldade em nos conhecermos espontaneamente e nos relacionarmos. Se quando assim é, de vez em quando já temos umas surpresas!!! Imagina quando eu fantasio a minha identidade e caio também no canto d@a serei@ naquele mostruário de fotos de gostozice e perfis que é tudo incrível e interessantíssimo. Sei lá! Eu que sei! Sou da época entre o Dinossauro Rex e a Mafaldinha. Só acho é que os meninos também deveriam brincar com bonecas para aprimorarem o instinto de cuidar melhor. Nem precisam de serem pais depois! É só para lembrar que todxs temos instinto cuiadador.  Há uns que já cuidam. Aplausos de pé para esses de verdade!

A Piu
Campinas SP 13/02/2020


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