domingo, 3 de abril de 2022

E EM 1989 ONDE É QUE VOCÊ ESTAVA?

 

Nesse ano, depois de ter entregue um trabalho sobre a condição feminina principalmente em Portugal com base nas revistas " Mulheres" publicadas nos idos anos 80 e em tirinhas da Mafalda com a mãe que cuidava da casa e dos filhos e abrira mão da sua carreira profissional, com a sua amiga Susaninha cujo sonho quando fosse grande era ser mãe, rica e caridosa mais ou menos com os pobrezinhos e da amiga pequenininha Liberdade, que vivia num apartamento minusculo com a sua mãe que era tradutora e pagava as contas por cada tradução que fazia, a minha professora de História chamou-me à parte,e disse:" Tu és das minhas! És radical!" 

Eu tinha 16 anos. Já conhecia algumas coisas, mas não conhecia o significado radical e o que ela queria dizer com isso. Com ela eu chegava a tirar a nota máxima na escala de 20. Eu estudava, olhava aquela reizalhada toda, o poder do clero, mais as batalhas, as conquistas e explorações e para mim era evidente que a História era e é contada ainda na escola pelo ponto de vista de quem tem poder na escala social. Era tão evidente que ninguém precisava de chamar a atenção. Nas provas eu escrevia pelas minhas próprias palavras e interpretação a partir de factos históricos. Lembro-me que me referia à presença da coroa portuguesa no Brasil e países africanos como " o tempo das vacas gordas" onde alguns mamavam até ao tutano, esbanjavam, ostentavam, endividavam-se e depois seguiam caminho. Sempre me perguntava e pergunto porque a História é contada a partir de batalhas, conquistas, derrotas, impérios e não como as pessoas se relacionavam, como se amavam, o que sonhavam, como transcendiam, como se organizavam para não serem exploradas e viverem dignamente. Talvez fosse isso que a minha professora de História, a Berta, considerassse radical da minha parte. 

Perguntei à minha tia o que era radical, a mesma que me empretara as revistas " Mulheres". Ela deu uma explicação com a qual eu não me identifiquei logo. " Alguém que está fora do que é comum, do que é aceite normalmente". Mais ou menos isto. Eu não me via como radical, além de querer estar inserida, para mim era tão evidente que não dava para aceitar o inaceitável e que estudar História servia justamente para sermos cidadãos mais justos, menos ávidos de poder, de ganância. Bem sei que eu tinha 16 anos e que esse pensamento pode ser uma linha, uma corrente,uma escola, uma utopia. O que é facto é que eu ainda penso assim volvidos 32 anos. Termos acesso ao conhecimento deveria ser libertador e não perpetua dor da mesmice.

Agora eu fiz as contas e curiosamente  este episódio coincidiu com o ano carismático da queda do muro de Berlim que deu inicio à Perestroika. Acredito que @ car@ leitor@ saiba o que é. Se não souber não tem problema, o google está aí para ajudar. Espero que na próxima campanha eleitoral aqui no Brasil defendam os direitos trabalhistas mas sem afirmar que o PT é comunista. Por favor! Vamos ter seriedade no debate e na defesa de causas. Este sorriso que trago na foto não é de ironia, é uma tentativa de dar humanidade a uma foto burocrática, mas adequa-se à estupefacção de escutar esse tipo de coisas, assim como, por exemplo, dizer que todos os portugueses são colonialistas exploradores. Eh pá!... É melhor sorrir que gritar, embora algumas vezes é preciso respirar fundo. Moral da História: é melhor estudar História de várias fontes do que abraçar causas pela metade só porquer fica bem na fotografia.

Em 1989 eu tinha 16 anos, estudava na escola pública e frequentava a festa do Avante, festa promovida pelo partido comunista português. Nunca fui filiada no partido e agradeço todas as oportunidade de me cultivar através da arte e da literatura que a festa proporcionou, nomeadamente questionar o partido e seus dogmas. Não abro mão da igualdade social, mas abro mão de dogmas e autoritarismos.

A Piu

Br, 03/04/2022


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