sexta-feira, 5 de junho de 2020

ATÉ QUANDO? - vidas negras importam


ATÉ QUANDO? - vidas negras importam
Ainda faltavam duas unhas. Intercalava entre o rosa florescente, como o lacinho da sua poodle, verde vivo como a grama junto à sua piscina e preto como os olhos daquele menino que clamava pela sua mãe.
Adorava a sua poodle. Era como uma filha. Também amava o seu caniche, mas já estava velhinho e agora apegava-se à sua menina para se ir habituando à partida do caniche mais tarde ou mais cedo. Estava medicado com remédios homeopáticos vindos dos Estados Unidos, mas os seus dias estavam contados dissera o veterinário. Como ela tinha medo da morte e apegava-se com unhas e dentes à sua jovem poodle. Ambos adoravam passear. Sair do seu ap triplex com vista para o mar e descer de elevador os 13 andares que separavam do chão. Ela não se aventurava a sair à rua, pois a rua é um perigo. " É muito inseguro morar neste país, não vejo a hora de ter um visto para morar em Miami!", pensava enquanto dava uma pequena pincelada na unha do polegar.
" Ai que menino chato! Impaciente, sem educação! Dá para ver que não anda numa boa escola! Ainda bem que sou uma pessoa boa e tolerante e a Luzineia é como da família e deixo ela trazer o menino."
Ao se baixar para pegar aquele cocô quente e enorme que ocupava uma parte do ponto de ônibus que ela mesma pegava para voltar para casa, precedidos de mais dois, sentiu um aperto no peito. Luzineia pressentiu que deveria correr para casa da senhora.
Na última pincelada de preto na unha do indicador a senhora escutou um grito ensurdecedor., mas não ligou. " Eu não falo que a rua é perigosa? Até daqui do décimo terceiro andar se escutam gritos!" Passados uns quinze minutos bateram-lhe à porta. Eram as autoridades. Teria de acompanhá-los para prestar declarações. " O que aconteceu? Deve ser engano!"
Quando passou por Luzineia com o filho pequeno morto nos seus braços aos poucos percebeu que o menino que ela colocara no elevador para ir ter com a sua mãe à rua caíra. Não se sabe ao certo se sentiu remorsos. Pagou uma multa e foi liberta. Todos os dias à sua porta ela via vultos de pessoas agrilhoadas gritando. Estaria a enlouquecer? Mudou-se de apartamento para parte incerta. mas os pesadelos são constantes ou não? Talvez hoje viva nos States e seja garçonete num bar de terceira categoria ou vendedoras de pipocas num drive in na Disneylândia.
Ana Piu
Kampinas SP Brasil 05/06/2020
#vidasnegrasimportam
#JustiçaPorMiguel
crónica baseada em factos verídicos:

https://ricardoantunes.com.br/jornais-blogs-e-policia-civil-esconderam-nome-de-sari-corte-real-indiciada-por-homicidio-culposo1/




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