terça-feira, 2 de janeiro de 2018

SEXTA NOITE: INTROSPECÇÃO ACERCA DO QUE FICA E DO QUE VAI PARA QUE AS MÁSCARAS CAIAM

Aquela foi a mais longa noite de todas. Queria fugir de si, mas não havia escapatória. Sentia-se cansado e o corpo não se movia de maneira nenhuma. Era como se uma mão invisível o  empurrasse para baixo e lhe dissesse " Fica. Fica e olha o quão te tens visto distorcido. Que ideia fazes de ti e de tudo o resto' Fica e observa-te." Um turbilhão de imagens, ideias, falas, ruminações mentais compunham essa orquestra cacofónica. Perguntas. Supostas respostas. Justificativas. Argumentações. Contra argumentações. Bla bla bla bla. Primeiro deitado sobre a sua cama, depois na terra fofa cá fora enquanto pingava. Depois de cócoras, aquela posição universal para expelir o que  trazemos dentro de nós. Sejam bebés,seja o intestino grosso a pedir alívio. E como o seu intestino grosso andava prensado, assim como o estômago! É aí que  as noias se congregam. Malditas noias que parecem cadeados no respirar!

Agora estava ali, num compromisso pessoal. Vou ficar, respirar e esvaziar. No inicio tudo era o vazio. Esse imenso espaço sideral era o caos e o vazio. Do vazio surge o discernimento. O que é do que  não é. É no vazio que a voz do coração surge. Suave e certeira sem certezas absolutas. Diante do seu caos era como se estivesse à beira dum precipício. Olhando aquele imenso abismo que era o que  desconhecia acerca de si mesmo ficava com vertigens. Ninguém exterior a si próprio apontava o certo ou o errado Era ele mesmo, nesse processo de introspecção, que se tocava. Assombrou-se. Agora restava-lhe abraçar a sua sombra para depois se desconstruir e permitir que essas inúteis máscaras, que não o favoreciam em nada, caíssem. A sua beleza era muito maior que isso. Não existe beleza que consiga se enformar em estreitas máscaras. Há as máscaras que servem para ampliar o gesto e a ação, assim como a emoção. Mas essas são máscaras do teatro. O teatro é uma resignificação da vida. Mas que cansativo seria passarmos os dias inteirinhos a atuar commedia dell arte!.... O teatro é um dos rituais da vida e o homem andava a se esquecer de viver mais perto de si mesmo. Urgia que essas máscaras dessem o pinote. Caíssem fora. Que a vida não é uma farsa, apesar de vez em quando parecer. Honrar é uma palavra antiga, mas que não pode cair no esquecimento, concluiu o homem após várias introspecções.

A Piu
Br, 02/01/2017











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