quinta-feira, 15 de setembro de 2022

AINDA AGORA




" Porque você está aqui no Brasil?'; 'Porque sim. Porque gosto."

Bem... ' Porque sim ' não é resposta, mas até é principalmente quando não nos apetece dissertar acerca das nossas escolhas tampouco tentar convencer alguém. Já o'porque gosto' pode criar uma estranheza ainda maior para alguns que já perguntam com estranhamento quando o que seria óbvio era eu estar em Portugal ou aproveitar a Europa munida do livrinho vermelho dos carimbos, mais o cartão de cidadão ou de 'cidadona' e mais a relativa facilidade em comunicar-me em quatro línguas. Mas por ora prefiro este imenso território ameríndio onde convergem centenas de origens e identidades. Um lugar onde bifurcam lugares de existência, re existência, resistência, de fala, de olhar, de cosmovisões múltiplas. 


Descobri a síntese da resposta: ' Porque aqui sente-se VONTADE de existir, de fazer acontecer quer hajam recursos financeiros suficientes ou não ou estes estejam mal distribuidos, As coisas acontecem por existência, re existência e resistência e todos os dias sem excepção eu aprendo muito com muita gente, por vezes simplesmente observando e escutando."


Pronto, esta é a resposta mais sincera e honesta que encontro para dar ao invés de dar uma tortamente cínica com apontamentos amargos: " Estou aqui porque preciso de dar lugar à leva de mãos cheias dos daqui que vão para um país tão pequeno como o meu ( Portugal). Caberá lá toda a gente? E a Europa já conheço o suficiente de perto e de longe para entender o seu cansaço e também move-me muito mais outras visões que contrariam a hegemonia eurocentrica. Aprecio as bordas, as dobras, as obras consideradas periféricas ou das minorias que são maiorias. "


Faço questão de escutar e apoiar outras vozes que não aquelas que escrevem os manuais de História que tive na escola e que ainda se reproduzem no dia a dia: saudosismos de feitos heroicos de conquistadores que já tiveram o mundo na mão, no caso em Portugal, achararem que são o centro do mundo cheio de valores éticos de cidadania, no caso a Europa.


Na minha terra natal diz-se que dos fracos não reza a História. Basta saber qual História e quem é considerado fraco. Serão fracos os que resistem há 500 anos aos apagamentos e silenciamentos? O meu olhar de escuta vira o coração para esses e por ora vira as costas à Europa. Não significa que tudo na Europa é ruim e que me movo por deslumbramento exotizado. Não nã nã. Por outro lado, com um toque de especulação: se existi em outras vidas como portuguesa, das duas uma ou das duas várias: ou era uma escrota que fez cagada neste território e vem se reconciliar, re inventando-se, ou era uma da contra mão que veio continuar esse mesmo caminho re existindo e resistindo.


Bon, ê boilá! Ganau! Déts it! Olé! Hasta! Hasta!


A Piu 

Bolhon Geral Zoom 15/09/2022


Cartaz: II Marcha das mulheres indígenas: reflorestamento, corpos e corações para a cura da terra. Brasília, 2021- coleção Edgar Kanaykõ Xabriabá.

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