LÁ & SI EM SOL MAIOR

 A  mulher está do lado de cá do lá.

Em frente a si está o homem do lado de lá do lado de cá mas lá, do outro lado da rua.

Veem-se.

A rua está movimentada.

Passam carros como se estivessem numa pista  de formula 1. Passam mulheres  a correr com a gravata a bater na testa. Homens de salto alto com um deles rachado. Muros com pernas de centopeia ora caminham como lebres, ora correm como lesmas. Passam pessoas  com torcicolos crónicos a olhar para celulares.Passam monstros que não são monstros e sim mentes confusas em corpos desalinhados. Passam blocos de Carnaval com músicas emancipatórias e com músicas que envernizam o quotidiano para dar um tanto de esperança a quem os escuta. Passam carros de som como se o Gulliver tivesse acabado de chegar aquela rua.

Do lado de cá do lá está a mulher que tenta atravessar a rua para ir ao encontro do homem.  

Lá, do lado de lá do lado de cá está o homem.

Veem-se. Respiram fundo e dão o primeiro passo, depois o segundo até chegarem bem ao meio da rua. Olham-se nos olhos. 

Carros, mulheres engravatadas, homens de  salto alto rachado, muros com pernas de centopeias, monstros  que não são monstros e sim desalinhamentos temporários por de auto desconhecimento, blocos de carnavais e carros de som encavalitam-se uns sobre os outros como se o tempo parasse. 

As pessoas dos torcicolos levantam a cabeça, por momentos esquecem o celular, e testemunham ao vivo e a cores:

Uma mulher olha nos olhos dum homem. Um homem olha nos olhos duma mulher. Os seus cabelos dançam com a brisa morna do sol maior. 

A Piu

Campinas SP 20/ 05/2021