domingo, 25 de outubro de 2020

MACÊ - um ser de luz e sombra como todos nós


Macê precisava de voltar a casa, às suas raízes e aconchegar-se no grande espirito da floresta para se lembrar quem ele ainda era e sempre foi. Andara meio que perdido no mundo levando dentro de si a dor do seu povo carabinado, violentado, desrespeitado. 

Muitas mulheres o admiraram e o amaram pelo seu jeito de menino homem com sorriso e gestos da criança que fora um dia. Mas Macê nem sempre era assim. 

O ancião puxou do seu cachimbo e soprou sobre Macê e cantou numa língua muito antiga que resistia às invasões. Cantou que a voz e os gestos devem conter amor, firmeza e o grito e  o  murmúrio de guerra da paz. Soprou em Macê o espirito do seu povo que cuida e não mal trata. Que honra os antepassados, os pais e os filhos que trouxe ao mundo. Nesse sopro Macê desmoronou-se, caiu sobre o chão e toda  sua negatividade saiu em jorros, misturando-se com o húmus junto a uma grande samambaia.

' Não se trate mal nem trate mal ninguém! Muito menos as mulheres que te amaram e que de você geraram filhos. Se os seus povos cometeram injúrias com os nossos não repita essas injúrias. Fechemos o ciclo da violência com a nossa voz, os nossos cantos, com as nossas medicinas. Não permitamos que falem por nós, que nos estudem sem se relacionarem com a nossa gente, sem reciprocidade que traga benefícios para o nosso povo, sem uma relação de confiança que nos conceda a autonomia de sermos quem somos, sem fazer do nosso território um grande pasto e violentarem as mulheres do nosso povo, defendendo que gostam de se misturarem. Macê, é bom nós nos nos misturarmos mas onde há amor e respeito. Não queira mal a ninguém e não crie  na tua cabeça que te querem mal. Volte às suas raízes e volte para a casa de saberes dos seus ancestrais. Nós somos povos guerreiros, guardiões da grande natureza e você faz parte dela assim como os seus descendentes."

Em silêncio, Macê ficou um longo tempo abraçado a essa grande samambaia sentido a verdade que vinha da força do núcleo central da terra, escutando a voz anciã que habitava dentro dele mesmo.


dedicado a Macê ( nome fictício), meu ex companheiro

A Piu

Brasil, 25/10/2020


imagem: criança yanomami - Claudia Andujar

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