terça-feira, 5 de maio de 2020

AMOR-TE

Em 2006 chegava a Lisboa uma exposição " Amor-te" - tradução livre em Portugal - do fotógrafo alemão Walter Schels com a jornalista Beate Lakotte de fotografias de pessoas em estado terminal e um ano depois no preciso momento da sua morte. Segundo Lakotte " todos nós sabemos que um dia vamos morrer, mas é difícil de acreditar que realmente vai acontecer com a gente. A nossa motivação era superar o nosso próprio medo da morte e o projeto explora essa questão. " Volvidos 14 anos ainda detenho na memória a expressão de muitos deles, em que junto com as duas fotos havia uma pequena biografia. Assim sendo, fiz o exercício de contemplar o rosto de cada defunto e se este me transmitia paz ou não. Não lia a biografia antes para não me influenciar. Ora eu nessa época já trabalhava como palhaça hospitalar e acompanhava muita pessoas no leito de morte, nomeadamente crianças. O que nem sempre foi fácil de digerir quando sabia da morte de alguma, principalmente quando havia sido criada uma cumplicidade de palhaça ser humana com aquele ser. Enfrentar a doença e a morte, tanto a nossa como daqueles que nos estão próximos e nutrimos amizade, amor, carinho requer sabedoria, acolhimento.

Curiosamente a expressão mais apaziguada ou não dessas pessoas retratadas ainda em vida e depois já defuntas coincidia com os sabores, dissabores, oportunidades mais ou menos auspiciosas e até turbulentas das suas vidas.

Hoje, dedicando-me a estudos budistas que tem a ver com o estudo de nós mesmos estou brilhando de alegria de poder compartilhar para quem estiver interessado o texto " Quando tudo se desfaz" do Pema Chondron - pode ser encontrado em pdf na internet. É profundamente belo, libertador, transformador fazermos amizade com nós mesm@s e assim começarmos a olhar com mais ternura para nós e para os outros. Percebemos as vezes que temos feito mal a nós mesm@s, e aos outros muitas vezes inconscientemente. O grande lance, a grande sacada é relaxarmos diante de toda e qualquer situação, acolher o medo, olhá-lo de frente sem entrar em pânico. É profundamente belo, para mim, mesmo antes de aprofundar-me nestes estudos, observar um irmão, um amigo ou amiga sentir uma imensa amizade e ternura por essa pessoas, mesmo quando esta por insegurança tem atitudes e ações que não beneficiam ninguém, porque está assente na insegurança, na mentira, na intriga e em alguma manipulação. Quem nunca se sentiu inseguro? Quem não quer ser visto, reconhecido, amado?  Mesmo quando se esconde e se faz passar por outra pessoa, ou invade a privacidade de alguém criando nos demais dúvida, intriga, ideias precipitadas, por isso injustas, acerca de uns e outros. Os tempos são de desafio. Uma convocatória a viver no tempo presente e tomar cada ato de respirar como um presente, uma dádiva. Cada gesto de amizade e lealdade por parte dos nossos irmãos, amigos, familiares, parceiros como um presente muito precioso. Lealdade não é o mesmo que ser fiel às mancadas de cada um de nós. Lealdade é estar do lado de quem precisa para este  levantar a cabeça, o corpo com dignidade. Sem apedrejamento e sim com responsabilização compassiva. Não sabemos se amanhã nos encontramos, mas hoje sabemos que estam@s viv@s e isso é profundamente belo!

A primeira pessoa que vi partir foi a minha mãe aos 11 anos. Nós aprendermos a lidar com a perda, o luto desde cedo é muito importante para que caminhemos com mais leveza. Eu aprendi isso já na vida adulta. Levei durante anos uma tristeza, que não a identificava porque estava lá no inconconsciente e subconsciente, que emperra o caminhar como uma pedra no sapato. Precisamos de nos descalçar do que nos magoa, que nos obscurece e transformar em luz. Outro dia, ao redescobrir a atriz e escritora Shirley Maclaine tive um BAQUE! Há uma fotografia dela que lembra a minha mãe com a mesma idade!!! Sinto alguma afinidade com o caminho espiritual desta senhora. No budismo também se acredita na reencarnação, ainda não cheguei nesse estudo aprofundado. Porém duma coisa estou ciente, nós para abrirmos a possibilidade para algo que nos transcende precisamos de estudar-nos a fundo. E quando não temos aquela certeza cartesiana se aquilo é ou deixa de ser, tipo: vida depois da morte, outras vidas interplanetárias, silenciamos-nos ao invés de zombar. Rir do que desconhecemos é ignorância, esse foi uma das aprendizagens nessas viagens astrais onde encontrei a minha mãe como um ser de luz sempre vivo cá dentro do meu coração.

Se nós nos virmos ou não nos virmos amanhã ou depois de amanhã ou depois e depois e depois de amanhã quero que saibam que tod@s nós somos dignos de amor, compreensão  e respeito. Não nos cabe a nós julgar os demais e sim olhá-los nos olhos com ternura e firmeza. É sempre fácil? Ninguém disse isso. Dá trabalho, mas mãos à obra!

Para finalizar, deixo aqui um link dum documentário dum projeto de meditação vipassana num presidio brasileiro. Que esses projetos tenham continuidade não só com quem está detid@ como com os guardas prisionais, as forças policiais, os juízes e advogados. Quando nos auto conhecemos e nos acolhemos diariamente tudo fica mais precioso nesta vida que é tão transitória.

Abraço no coração aqui e além mar e estrelas cadentes!
A Piu
Campinas SP 05/05/2020

Edelgard Clavey ( 26/06/ 1936 04/01/2004) primeiro retrato 05/02/2003
Foi secretária em uma clínica psiquiátrica universitária. Nunca teve filhos e, desde a sua separação nos anos 80, vivia só. Muito religiosa, ela dizia que desejava profundamente morrer" e que a morte seria uma prova de maturidade". @ Walter Schels.
Maria Hay-  Ahn Tuyet Cao ( 26/08/1951 05/02/2004) primeiro retrato 05/02/2003
Provavelmente teria morrido de forma diferente se não tivesse conhecido o mestre Ching Hay. Ela falava: " O que está além desse mundo, é melhor que tudo o que podemos imaginar."Graças à meditação, ela conseguia suportar as dores provocadas pelo câncer de pulmão. Cao faleceu em paz. @Walter Schels

links: https://fdocumentos.tips/document/quando-tudo-se-desfaz-pema-chodron.html

Meditação Vipassana na Cadeia: INCRÍVEL! https://youtu.be/4UfiNDEcJVo


Sem comentários:

Enviar um comentário