sábado, 5 de junho de 2021

QUANDO OS OBSTÁCULOS DO ENIGMA CHEGAM QUASE AO FIM

 Agora ela podia respirar de alívio. Talvez o mais difícil do que ela considerava enigma estava desvendado. Ela para eles era um enigma, talvez fosse isso que os atraísse ao mesmo tempo que os desconfortava. Não estavam habituados, provavelmente. Não que as mulheres com que se relacionassem não fossem potentes, eles é que provavelmente não davam o valor pleno e estas nunca tinham aberto o peito e dito: "Vem cá dizer isso olho no olho. Um dia ainda havemos de rir juntos de tudo isto."

Talvez nunca tivessem convivido com ninguém que não se encolhe quando lhe pisam muitas vezes os calos. Alguém que não treme de terror perante uma babaquice camuflada, logo não assumida. Não, não era um caso de polícia e sim um caso de amor distorcido que o tempo, com os seus entendimentos vários colocaria tudo no seu lugar sem berros, talvez com choro, com riso, silêncios, hesitações, murmúrios. Duma coisa ela estava ciente, mesmo não se conhecendo pessoalmente. Cruzar na rua é um momento fortuito que não tem o volume de se mostrarem à distância na sua capacidade de sentirem ansiedade, admiração, euforia melancolia, diria até amor confundido com ciúme e orgulho ferido, vaidade com base em velhos padrões de comportamento em que o homem pode e deve ser desejado, bajulado por um séquito de mulheres ao passo que uma mulher não pode, segundo os mesmos, de ter a sua rede de amigos, sejam estes do seu meio profissional ou não. Ela já conhecia essa velha história com contornos muito mais pesadas. Tivera uma filha com um sujeito mulherengo que lhe infernizara a vida e acusava a de infidelidades, deslealdades que ele sim cometia. Uma loucura de cair cabelo e de rir para não chorar. Agora, ao fim de tanto tempo, ela já sabia lidar com essa masculinidade distorcida, pois ao invés de se celebrar o encontro sabotava-se o mesmo. Saberiam os dois homens que aquela mulher, como muitas,  em algum momento pudesse o correr risco de vida por conta dessa masculinidade que acha que pode tratar a mulher de qualquer jeito? Bom...

Mas ela agora sentia que aquela etapa mais difícil de ultrapassar estava quase a chegar ao fim. 

 Uma boa história de superação de obstáculos é aquela em que o vilão não é só vilão nem o bom mocinho é só mocinho bom.

Dois irmãos frente a frente, lado a lado. Diferentes e iguais na sua conduta. Apesar de algumas vezes se rivalizarem eles eram amigos de coração e muito provavelmente eles se identificariam um com o outro no que há de mais sublime e também sombrio um no outro. E esse era o grande obstáculo que a mulher teria de desfazer.

 Era vertiginoso concluir isso, pelo menos para aquela mulher. Mas ao mesmo tempo libertador.

 Aguardariam ambos que ela lhes dissesse: Tá tudo bem? Eu amo-vos incondicionalmente porque também tenho aprendido muito com vocês. A me posicionar ainda mais e discernir as suposições, fruto de inseguranças e crenças de não merecimento de amor. Despotismo...

 Ela agora voltaria a escrever com todas as letras , como se se falasse olhos nos olhos: Desejar, amar uma mulher não passa por oprimi-la. Se vocês acham que ela não é confiável talvez tenham de rever se vocês são confiáveis e se porventura ambos, cada um a sua maneira não projetam nas mulheres as vossas crianças feridas. Mas se ela não é confiável, afastem-se dela. 

Ela agora sentia alívio em confirmar que aquele que assumiria, assumira o papel de vilão durante um largo tempo fazia esforços, pelo menos aparentemente, para valorizar as mulheres. Ao passo que o seu irmão, que era boa gente, algumas vezes deixava escapar alguns acessos de ciúmes. Ambos mereciam ser amados, mas para isso precisavam de baixar a guardar e aprender A amar. Isso ensina-se? Talvez.  . Mas exercita-se.

 A mulher sorriu. O homem já não rivalizava mais com o seu irmão tal qual bebê chorão. O seu irmão, apesar de boa gente, olhava para si mesmo com mais cuidado e atenção para que ambos passo a passo dispensassem a broderagem. No fundo no fundo ambos sabiam que a broderagem não os fazia felizes, tampouco a vaidade de serem bajulados e que os levaria acessos de raiva fruto de ciúmes. Eles queriam mais que isso, A mulher respirou de alívio quando vislumbrou uma luz ao fundo do túnel para todo aquele engodo, aquela cilada que o homem que assumira mas não o papel de vilão criara para todas as partes envolvidas. O seu irmão e aquela mulher só podiam agradecer aquela oportunidade. A mulher esperava ainda o dia em que todos se pudessem olhar nos olhos sem grandes dissertações, nenhuma aliás, e riem-se como quem diz: Já passou! Tá tudo bem agora! Viva o amor. 

A Piu

Campinas SP 05/06/2021

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