segunda-feira, 23 de novembro de 2020

VIDA LONGA À CRIATIVIDADE QUE APONTA SAÍDAS COM ALMA


 Dançando no escuro,( Dancing in the dark) realizado por Lars Von Trier e protagonizado por Bjork conta a história duma imigrante tcheca, mãe sola, que se mudou com o seu filho para os EUA em 1964. Ela sofre duma doença degenerativa em que vai perdendo a visão. Para salvar o seu filho, submetendo-o a uma cirurgia, junta todo o dinheiro ganho como operária fabril, Enquanto ela vai perdendo a visão. A sua grande paixão são os filmes musicais que assiste enquanto a sua comovente amiga Kathy ( Catherine Deneuve) que nutre por ela um grande carinho e amizade descreve por palavras e depois pelo toque o que se passa na tela. O filme dá uma reviravolta quando o seu vizinho policial Bill (David Morse), que lhe aluga um trailer para viver, vem contar-lhe o segredo que a sua herança chegou ao fim e a esposa não pára de gastar e como ele está falido e endividado as autoridades vão-lhe tomar os imóveis. Selma Jezkova ( Bjork) confia-lhe também o segredo das economias para a cirurgia do filho. O Bill, que não é Kid e sim um homem feito e armado que se sente desarmado com a sua esposa esbanjadora e que deseja se suicidar para acabar logo com o tormento, arregala os sentidos e não perde a oportunidade de voltar a casa de Selma para que dissimuladamente finge voltar para a sua e ver onde esta guarda o dinheiro para o roubar. Quando Selma dá por falta do dinheiro logo entende oque aconteceu. Ela está a perder a visão mas não a inteligência. Vai a casa do Bill, homem feito e armado mas desarmado com a esposa para manter as aparências, e pede-lhe o dinheiro de volta. Aí dá-se a viragem trágica! O esposo exemplar já dissera à sua querida esposa esbanjadora que Selma o tinha seduzido... Ela pega no dinheiro, com a esposa lá em baixo logo testemunha não ocular, e este primeiro atira sobre si mesmo e depois pede a Selma para atirar sobre ele. Resultado: suicida-se manipulando as ações desesperadas da Selma. Esta é condenada ao enforcamento e por sentir vergonha e culpa de ter dado à luz o seu filho que herdaria a sua doença e por ser leal à palavra de manter o segredo de Bill mente e é enforcada.


Bjork admira muito a Elis Regina. Diz que mesmo não entendendo português sente que a Elis com a sua voz vai a lugares da alma que ela não tem coragem. Milton Nascimento diz que s inspirou nas vozes femininas com alma para começar a cantar. Milton é um homem que compreende o feminino que existe dentro de si para honrá-lo. Bjork canta Milton mesmo não sabendo português.

Se  este filme ganhou prémios de melhor filme e de interpretação feminina de Bjork, o roteiro mesmo que impactante não convence. Porque uma imigrante Tcheca em pleno regime comunista imigra para os EUA e é incriminada de comunista? Se ela o fosse ficaria no seu país de origem. Ou não? Mesmo assim poderia operar o filho através da rede pública ao invés de ir para um sistema em que a saúde é para quem paga. Porque Selma mente, preferindo ser condenada à morte do que manter-se mãe do seu filho que tanto quer salvar? Uma mãe faria isso mesmo sentido culpa e vergonha de ter escolhido trazer ao mundo um bebé para o ter no colo, mesmo sabendo que ele poderia ficar cego? 

O roteirista não dá saída à protagonista. Se por um lado entende e admira , até um certo ponto, a coragem pueril de Selma mata-a no final, fazendo-a passar por todas as agruras da negatividade.

Lars Von Trier, como europeu dum país exemplar de primeiro mundo, pretende criticar o sistema social dos States? Ou ele mesmo, tendo um sistema de saúde ótimo, eficaz e "gratuito" que se sustenta dos impostos dos dinamarqueses, não tomou a decisão de curar a sua misoginia matando a esperança, a alegria de viver da Selma, a luta pela dignidade e pela vida que ela representa? 

Há quem defenda  que em termos psicossomáticos a cegueira é uma negação de enxergar a realidade com ela é. Pode até ser. Mas  a realidade somos nós que a fazemos e não precisa nem deve ser monstruosa. Também há quem defenda que a frequência vibracional da vergonha e do medo são as mais baixas de todas e que acabamos por atrair para a nossa vida aquilo que vibramos. Tá! Também pode ser... Mas como artistas, criadores, também já é tempo de olharmos para os problemas e propor soluções. Sair do engodo do derrotismo, do cinismo e de levar os outros atrás da negatividade. O Bill não representará o Lars que envolve uma mulher no seu suicídio para a incriminar e a deixar sem saída? E um cineasta que produz umas coisas tortuosas sem saída precisa de se tratar URGENTEMENTE, porque o planeta geme, grita por cura. 


A Piu

Brasil, 23/11/2020

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