quinta-feira, 28 de junho de 2018

A VIAGEM PARA LONGE DA COBRA MORTA



Passou cá por casa o mais recente "dótor" nas ciências sociais cujo diálogo interdisciplinar incide na História. Bom... Onde há antropologia há história e vice versa e troca o passo. Podemos encontrar antropologia em todas as áreas de conhecimento assim como História. Então, a partir daí a fragmentação de saberes é como olhar para o motor, analisar a peçinha X do carro e nem fazer ideia que aquilo é um carro com rodas para circular nas estradas, trilhas e afins. Por isso a questão fica sempre no ar numa suspensão de mistério estupefacto: para que serve estudar a pecinha X do motor se depois não há uma ligação efetiva e prática?

Bom, enfim... Tem enigmas que a razão desconhece ou finge desconhecer. O que é facto é que "dótores" que defendem as suas tesonas no dia em que o Brasil joga e que petralhas, coxinhas e toda a diversidade brasileira estão unidos por uma futebolada é no minimo emblemático. Na tarde do jogo o Manuelson já era "dótor". Dei-lhe este nome porque Manueis portugueses há muito e Manuelson dá aquele ar tropical.

Mas este " sou dótor" não é um " xótor" qualquer! Traz-me o Le Monde Diplomatique versão portuguesa e versão francesa para relembrar que leuropeh é muita à frente e muito atrás e está até um certo ponto (?!) nas mãos do Tio Sam. Diz-me ainda o "dótor" conterrâneo que tirando os artigos internacionais a versão portuguesa é para dormir, pois quem escreve na língua portuguesa são académicos que descuram o que é jornalismo com qualidade. Em suma, o "dótor" da minha terra natal que passou cá por casa só para defender a tesona aqui ao lado é dos meus. Gosta duma boa galhofa e ainda me confirma que essa de Portugal estar em economicamente em alta e que existe emprego para todos é treta, bluff, areia para os olhos, manobras de parlapiê político. Assim sendo, está tudo certo que uma determinada camada socio cultural e económica brasileira queira ir para Portugal viver. Normalmente assistem a Globo e compram as falas da mesma e levam as suas aposentadorias brasileiras para viver sem preocupações Só me pergunto o que dizia a Globo entre 2007 e 2014 e troca o passo sobre a crise financeira no sul da Europa e seu desemprego. Quando aqui cheguei ao Brasil parecia-me que havia um quase desconhecimento total da situação. Enfim, o mundo fez-se para girar. Viajar e conhecer outros lugares e realidades quando realmente observamos, escutamos e reflectimos dá saúde e faz crescer. Viajar na plenitude é o encontro consigo mesmo e com o outro. Honrar o encontro deveria em todo e qualquer momento ser a cerejinha em cima do bolo onde preconceitos e/ ou deslumbramentos são dispensáveis.

Por falar em viagem, o meu amigo "dótor", que a esta hora já anda aí a espaçarinhar feliz e contente pelo Brasil afora leve que nem um pássaro depois de se ter livrado da tesona de doqueestourado, diz-me assim: " Sabias que o presidente da câmara de Lisboa queria fazer um Museu das Descobertas?!?!?!" Ahahahahahahahahhha cof cof cof cof " Não me engasgues que a comida e a bebida são sagradas!", digo-lhe eu. Sim foi a maior polémica porque várias pessoas se insurgiram contra. Uma controvérsia dá sempre aquele frisson num país que cultiva o saudosismo e que seria muito mais digno criarem um memorial sobre a escravidão e convidar pessoas, que são memórias vivas, do continente africano e ameríndio para serem escutadas e quiçá assim reescrevermos a História que até então é praticamente contada com foco na representação homem branco pertencente à nobreza ou ao clero que é protagonista dessa empreitada que muitos intitulam de : Demos novos mundos ao mundo. Enfim...

Bom, a galhofa máxima foi quando o meu amigo " dótor" contou-me que um colega Moçambicano denomina a Universidade de Coimbra, das mais antigas se não a mais antiga da Europa, como a "cobra morta". A cobra está morta há muito, mas ainda te surpreendes/ assustas ao dar de caras com a mesma. Muito a boa a imagem! No meu ponto de vista essa cobra precisa dum enterro digno, para que parta em paz e liberte quem quer manter a sua energia vital em forma.

Ah! Para finalizar, o meu amigo dótor deu lembrou a minha filha cujo pai é indígena que ela poderia aproveitar as cotas indígenas, ao que a mesma respondeu que ela não se sente indígena e que não seria justo ela usufruir duma luta dum movimento indígena. Fiquei sinceramente comovida com a sua postura. É justo e digno termos consciência do que nos pertence e como nos sentimos e do que é oportunismo de circunstância. Pode ser que daqui a um tempo ela se sinta indígena, mas por ora ter a consciência do que é justo é de tirar o chapéu.

Lembrar quem somos e não esquecer quem é o outro que somos também nós é um passo para a prosperidade. E esta, antes de financeira, é de boas relações com nós mesmos e por consequência com o entorno honrando a terra, pachamama para os ameríndios, ela que é a nossa mãe. E uma mãe não se vende nem se compra e sim abraça-se, reverencia-se por aquilo que esta nos proporciona. Paradigmas que o "branco" precisa de rever para não se arrastar como uma cobra morta.

A Piu
Brasil, 28/06/2018

http://expresso.sapo.pt/cultura/2018-04-12-A-controversia-sobre-um-Museu-que-ainda-nao-existe.-Descobertas-ou-Expansao-#gs.DvSPg0c

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