domingo, 6 de maio de 2012

Depressa, devagar


Diário de bordo,

Entre Abril, sonhos e afazeres mil e o tal Maio maduro Maio de quem o pintou.

Há vacas no caminho. É de noite. A caminho da serra com cachoeira seguimos o corta mato que vai de casa até à estrada de asfalto. Pisamos bosta de vaca e tememos os impulsos bovinos. Fuuuuuu! Ainda bem que comem ervas. E bostinha de vaca, quando seca, até parece wetabix. Belhaque! Ehehe! Voltamos para trás para fazermos o caminho maior e pedir a um vizinho para emprestar uma torneira por instantes. Somos acompanhadas pelo atalho da fazenda por dois vizinhos. Um deles ainda vem fardado do serviço militar. Será que a sua farda incute mais respeito às vacas e os respectivos bois? Os vizinhos dizem que na noite elas se assustam e que correm em linha recta. Não há que temer… Bom, se a minha linha recta for a mesma que a manada… Valeu! Boa Páscoa, mesmo para você que trabalha nesse dia!

Caminhamos pela trilha até à cachoeira. Tento dar conta das leituras. Entre uma leitura e outra, confirmo que viver, partilhar momentos com as pessoas tem tudo a ver com o tal “Ensaio sobre a dádiva” do Mauss que estou a ler. Tranquilizo-me por não estar a ler consecutivamente, como até desejava. Viver para compreender as leituras realizadas acaba por ser um caminho que encontro sentido.

Tomamos banho de cachoeira. A força da água e da natureza é sempre aquela força. Mas já anseio um vislumbre de mar. Cheiro a peixe e maresia. Será que quem cresceu junto ao mar carrega este karma? Tive uma professora chilena que dizia que quando veio para Portugal não se conseguia orientar. Faltavam-lhe as Cordilheiras. Mas eu acho que como era pintora sempre podia pinta-las na imaginação.

(…)

De manhã corremos pelo caminho das vacas para pegar o ônibus para ir para a escola. As vacas não estão lá. Duas águias poisam numa árvore no instante que passamos. Seria bom elas nos darem uma boleia/ carona como nos filmes animados. Poupávamos tempo e dinheiro e podíamos ver o percurso de cima.
O caminho é de barro vermelho. Na sala dos computadores, depois de ter saído por instantes, vejo uma longa trilha de terra. Epa! Alguém trouxe os sapatos sujos… Espero não ter sido eu, auto convenço-me. Quando chego ao meu lugar está uma instalação de terra seca… Epa! Fui eu… A urbanoíde que agora vive na roça… A urbanoíde que nem capinar sabe, que nem uma singela hortinha ou umas flores sabe plantar… Pelo menos, tem de ter mais cuidado quando chega à urbe!

Maio está à porta. Depressa, devagar. O tempo galopa preguiçosamente. Parece que foi ontem que chegámos e parece que já faz tanto tempo. Novos amigos aparecem, mais a saudade dos outros que estão longe fisicamente. Quem te de se encontrar, encontra-se nalgum momento. Acredito.

Primeiro de Maio. Sonho que sonho que já não é um sonho que quem trabalha tem direito a ter uma vida digna de não ser precária.

Depressa e devagar vamos conhecendo e dando-nos a conhecer. Quando há sol o verde fica mais vivo e aquece o peito. Quando chove e o domingo fica cinzento o dia inteiro é bom ter amigos em casa e crianças a correr pela casa, mesmo quando só fazem disparates e o exercício de relativização tem de ser accionado.

Depressa, a lua tá muita grande e amanhã é dia da mãe! E ela é às vezes é de luas! Hoje ela tá numa lua boa! Lá com o seu nariz vermelho vai viajando com o público.

Devagar, devagarzinho adormecemos por que amanhã é outro dia e qualquer dia já é outro mês, e mais outro mês, e outro ano e outra década. Devagar, devagarzinho que os dias são para se viverem, saboreando-os.

Depressa, depressinha digo um “I aí?” para que a lembrança de quem nós gostamos não caía no esquecimento.

Barão Geraldo, 6 de Maio de 2012

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