De origem germânica achtung! servia como interjeção chamativa para perigos e paisagens deslumbrantes. Mais a norte, nos países escandinávos,ACHTUNG!! é considerado o espirro oficial dos vikings. Em terras lusas utiliza-se a expressão "Arre!!" quando alguém está arreliado. "Arretung!" é uma espécie de grito de guerra dos trabalhadores da classe precária, que desunidos nunca vencerão.
segunda-feira, 26 de março de 2012
DUM PARDO DESCARTÁVEL
Descartar – v. 1 tr.dir. , intr. pron. Rejeitar uma ou mais cartas (…) 2. tr.dir. Deitar fora depois de usar 3. tr. Libertar-se do que é incómodo ou inútil.
Pardo, a –adj. 1 que tem uma cor indefinida, que varia entre o branco e o preto ou entre o amarelo e o castanho, * pardo n.m.2 cor escura, que varia entre o branco e o preto. Papel pardo.
Papelinho daqui, papelinho dali, carimbo autenticado e consularizado acolá e muita e muita taxa para pagar veio-mo parar às mãos um formulário da Policia Federal para preencher com a devida atenção. Num dos campos pedia-me a dita entidade para definir a cor da minha pele: Albina; Amarela; Branca; Branca Moreno; Branco Sanguíneo; Mestiça Clara; Mestiça Escura; Mulata; Negra; Parda/Mulata. Epa! E agora!? Olhei para a folha, belisquei-me… Era mesmo verdade. Uma mancha vermelhinha espreitou do antebraço onde o tom descolora e as veias são mais azuis (parece-me a mim que toda a gente tem sangue vermelho, apesar das veias se afigurarem azuis ou não. Parece-me…).
Olhei para mim, olhei lá para fora. Estava sol e eu já tinha apanhado uma corzinha. Senti-me Branca Morena ou Mestiça Clara? Olhando de relance no reflexo da porta de vidro adivinhei mouros e franceses napoleónicos a passarinharem nas terras onde nasci, já não falando dos bárbaros, dos visigodos, dos romanos e outros tantos que deram jus à grande misturada que nós todos somos em terras deste mundo. Mas a pergunta deixou-me um pouco doente. Senti-me amarela. Olhando para o papel dirigi-me às autoridades para esclarecer a minha dúvida quanto à cor que transporto em minha derme. Quingas!!! Fui contra a parede! Fiquei com uma nódoa negra na testa e outra no nariz. Serei negra, agora? Ou mulata?
Imaginei como seria fashion ser albina numa vernissage em São Paulo, Tokio, Londres, Berlin ou em New York. Ou até mesmo na querida Lissabone, ou no Oporto invicto ou no Paris da França.
No final, coloquei branca, mas até achei que poderia ter colocado parda. Mas a minha dúvida persistiu. E aquela gente que é, indiscutivelmente, filha do tal branco e da tal negra ou do tal amarelo e da mestiça clara e se sentem brancos ou mestiços escuros como é que fica? Daí veio uma explicação “politicamente correta” dum antropólogo: “É uma forma das pessoas se auto caracterizarem para poderem usufruir de politicas de inserção.” Confesso que a explicação não me convenceu, mas não me contrapus pois não conheço o suficiente da sociedade brasileira e contrapor para um antropólogo terei que me fundamentar. Mas não me convenceu. Resolver a descriminação mantendo a diferenciação de cor parece-me que é perpetuar a descriminação. De fato, quem não é branco tem um acesso mais dificultado a uma universidade e a determinadas ascensões sociais. Porém, se o Brasil está em ascensão sócio politica o programa poderá ser o de ensino de qualidade gratuito para todos, sem distinção de cor, classe social e género.
Quem diz o Brasil diz outro país qualquer. Sim, porque hoje o país da igualdade, fraternidade e solidariedade está chutando o estrangeiro para fora. Descartando. Estando a Europa a virar à direita cá com uma pinta quem for pinta no panorama branco vai andando, descartando-se.
Hoje, descartar é um conceito bastante em voga, principalmente no estilo de vida do consome e deita fora. Hoje descartam-se copos nos mega festivais de música como se descartam pessoas. Descartam-se pessoas nas relações de trabalho, nas relações afectivas. Descarta-se a palavra Honra. Honra!? Bilhaqueeee! Que palavra tão old fashion. Demodé, diria! Para quê me comprometer com algo ou alguém? Não apareço, não digo nada e a pessoa vai entender… E a cartada continua! Jogada daqui, jogada dali. Amigos como sempre que a vida continua. E a cabeça se confunde entre onde começa a diplomacia e acaba em hipocrisia.
Descartam-se os antigos escravos que hoje o são de outra forma, descartam-se o ex combatentes de guerras coloniais e civis para um canto da sociedade e depois rotulamos de bêbados, loucos, que não querem trabalhar. Talvez sejam isso tudo e se aproveitam de tal para se encostarem à bananeira, mas as causas são muito mais profundas. E por vezes assusta irmos à cave e dar uma limpeza geral. Pois, porque mais que afirmemos que os fantasmas não existem e que já não temos medo do escuro, o escuro está lá e os nossos fantasmas também.
Conheci um “jovem rapaz” que no escuro da noite o que ressaltava era o seu sorriso grande e largo. Um sorriso branco em meia-lua a saltar dum rosto escuro. Hoje esse sorriso cheio de dentes já não existe. Dilui-se entre álcool e água da chuva que escoa até aos esgotos. Ele tratou de aniquilar esse sorriso que ainda teimava em sobreviver a uma guerra estúpida, como todas as outras. Por mais que tentemos imaginar o que sertá sobreviver a uma guerra, nunca saberemos realmente o que isso é. De regresso à sua terra natal o seu sorriso desdentado fará coro com outros sorrisos desdentados. E hoje na sua terra natal, Luanda, o colonialismo ganha outros contornos. Os ex combatentes são descartáveis, como o pobre é descartável. Hoje em Luanda o negro, o mulato também pode e tem dinheiro, poder mas dentro do mesmo paradigma de desigualdade. A História vai-se escrevendo num papel pardo que ora serve para embrulhar pão gourmet, ora serve para estancar um pouco das feridas deixadas pelas circunstâncias que nós, de uma maneira ou outra, permitimos que continuem a acontecer.
E vivam as rodas de ciranda, e o maracatu e bumba meu boi com branco, preto, mulato, amarelos, azuis, vermelhos. Obrigada, Patrícia por esse bonito sábado, onde ir ao encontro das nossa raízes é ir ao encontro do outro nas suas semelhanças e diferenças!!
Pardo, a –adj. 1 que tem uma cor indefinida, que varia entre o branco e o preto ou entre o amarelo e o castanho, * pardo n.m.2 cor escura, que varia entre o branco e o preto. Papel pardo.
Papelinho daqui, papelinho dali, carimbo autenticado e consularizado acolá e muita e muita taxa para pagar veio-mo parar às mãos um formulário da Policia Federal para preencher com a devida atenção. Num dos campos pedia-me a dita entidade para definir a cor da minha pele: Albina; Amarela; Branca; Branca Moreno; Branco Sanguíneo; Mestiça Clara; Mestiça Escura; Mulata; Negra; Parda/Mulata. Epa! E agora!? Olhei para a folha, belisquei-me… Era mesmo verdade. Uma mancha vermelhinha espreitou do antebraço onde o tom descolora e as veias são mais azuis (parece-me a mim que toda a gente tem sangue vermelho, apesar das veias se afigurarem azuis ou não. Parece-me…).
Olhei para mim, olhei lá para fora. Estava sol e eu já tinha apanhado uma corzinha. Senti-me Branca Morena ou Mestiça Clara? Olhando de relance no reflexo da porta de vidro adivinhei mouros e franceses napoleónicos a passarinharem nas terras onde nasci, já não falando dos bárbaros, dos visigodos, dos romanos e outros tantos que deram jus à grande misturada que nós todos somos em terras deste mundo. Mas a pergunta deixou-me um pouco doente. Senti-me amarela. Olhando para o papel dirigi-me às autoridades para esclarecer a minha dúvida quanto à cor que transporto em minha derme. Quingas!!! Fui contra a parede! Fiquei com uma nódoa negra na testa e outra no nariz. Serei negra, agora? Ou mulata?
Imaginei como seria fashion ser albina numa vernissage em São Paulo, Tokio, Londres, Berlin ou em New York. Ou até mesmo na querida Lissabone, ou no Oporto invicto ou no Paris da França.
No final, coloquei branca, mas até achei que poderia ter colocado parda. Mas a minha dúvida persistiu. E aquela gente que é, indiscutivelmente, filha do tal branco e da tal negra ou do tal amarelo e da mestiça clara e se sentem brancos ou mestiços escuros como é que fica? Daí veio uma explicação “politicamente correta” dum antropólogo: “É uma forma das pessoas se auto caracterizarem para poderem usufruir de politicas de inserção.” Confesso que a explicação não me convenceu, mas não me contrapus pois não conheço o suficiente da sociedade brasileira e contrapor para um antropólogo terei que me fundamentar. Mas não me convenceu. Resolver a descriminação mantendo a diferenciação de cor parece-me que é perpetuar a descriminação. De fato, quem não é branco tem um acesso mais dificultado a uma universidade e a determinadas ascensões sociais. Porém, se o Brasil está em ascensão sócio politica o programa poderá ser o de ensino de qualidade gratuito para todos, sem distinção de cor, classe social e género.
Quem diz o Brasil diz outro país qualquer. Sim, porque hoje o país da igualdade, fraternidade e solidariedade está chutando o estrangeiro para fora. Descartando. Estando a Europa a virar à direita cá com uma pinta quem for pinta no panorama branco vai andando, descartando-se.
Hoje, descartar é um conceito bastante em voga, principalmente no estilo de vida do consome e deita fora. Hoje descartam-se copos nos mega festivais de música como se descartam pessoas. Descartam-se pessoas nas relações de trabalho, nas relações afectivas. Descarta-se a palavra Honra. Honra!? Bilhaqueeee! Que palavra tão old fashion. Demodé, diria! Para quê me comprometer com algo ou alguém? Não apareço, não digo nada e a pessoa vai entender… E a cartada continua! Jogada daqui, jogada dali. Amigos como sempre que a vida continua. E a cabeça se confunde entre onde começa a diplomacia e acaba em hipocrisia.
Descartam-se os antigos escravos que hoje o são de outra forma, descartam-se o ex combatentes de guerras coloniais e civis para um canto da sociedade e depois rotulamos de bêbados, loucos, que não querem trabalhar. Talvez sejam isso tudo e se aproveitam de tal para se encostarem à bananeira, mas as causas são muito mais profundas. E por vezes assusta irmos à cave e dar uma limpeza geral. Pois, porque mais que afirmemos que os fantasmas não existem e que já não temos medo do escuro, o escuro está lá e os nossos fantasmas também.
Conheci um “jovem rapaz” que no escuro da noite o que ressaltava era o seu sorriso grande e largo. Um sorriso branco em meia-lua a saltar dum rosto escuro. Hoje esse sorriso cheio de dentes já não existe. Dilui-se entre álcool e água da chuva que escoa até aos esgotos. Ele tratou de aniquilar esse sorriso que ainda teimava em sobreviver a uma guerra estúpida, como todas as outras. Por mais que tentemos imaginar o que sertá sobreviver a uma guerra, nunca saberemos realmente o que isso é. De regresso à sua terra natal o seu sorriso desdentado fará coro com outros sorrisos desdentados. E hoje na sua terra natal, Luanda, o colonialismo ganha outros contornos. Os ex combatentes são descartáveis, como o pobre é descartável. Hoje em Luanda o negro, o mulato também pode e tem dinheiro, poder mas dentro do mesmo paradigma de desigualdade. A História vai-se escrevendo num papel pardo que ora serve para embrulhar pão gourmet, ora serve para estancar um pouco das feridas deixadas pelas circunstâncias que nós, de uma maneira ou outra, permitimos que continuem a acontecer.
E vivam as rodas de ciranda, e o maracatu e bumba meu boi com branco, preto, mulato, amarelos, azuis, vermelhos. Obrigada, Patrícia por esse bonito sábado, onde ir ao encontro das nossa raízes é ir ao encontro do outro nas suas semelhanças e diferenças!!
segunda-feira, 19 de março de 2012
SEM UIS NEM AIS
Aqui há uns tempos, numa dessas conversas virtuais num desses movimentos sociais existentes no facebook, um alguém se referia a outra alguém, sem conhecimento de causa, como sendo da elite cultural de Portugal. Ora o segundo alguém, inicialmente, sentiu um nó no estômago, depois os olhos abriram-se entre a estupefacção e a irritação. Esse segundo alguém respirou e repetiu várias vezes: cordialidade e exercício de inteligência. Um, dois, seis, DEZ. E vai que respondeu mais ao menos assim: “Eu até gostava de conhecer essa tal elite cultural. Se ela existir deve andar à bengalada como na época do Eça de Queiroz, visto que o ministério da cultura foi desmantelado em três tempos. (…) Mas volto a perguntar: “O que é que afinal nos une, nós cidadãos comuns, a tornar este mundo mais respirável?”
Devo ainda acrescentar que esse alguém provocatório representa muitos alguéns que povoam o nosso mundo, mundo esse que poderia ser mais respirável. E esses alguéns que sem conhecimento de causam alvitram, provocam pelo simples jogo de alvitrar e provocar demonstram ostensivamente que desconhecem o que é ser artista em Portugal e possivelmente ignoram o que é ter filhos e sustentá-los nesta conjectura (ooops lá vai palavra cara sem dar atenção ao acordo ortogrânfico. Fica o “C” ou cai o “C”?)
Esse alguém talvez desconheça o que é fazer um trabalho por convicção, dedicação, amor à camisola muitas vezes sem ganhar um tostão. O que é, no final das contas, ser precário mesmo antes da crise financeira e dos cortes dos direitos dos trabalhadores. (Hoje somos mais, não é?) O que são horas e horas de trabalho dentro duma sala. O que é investir do seu bolso em formação, seminários, simpósios…. O que é correr atrás de bolsas de estudo. O que é não querer estagnar. O que é acreditar e defender a descentralização, e se dedicar-se de corpo e alma, muitas vezes em condições precárias. O que é desejar que a arte e a cultura sejam acessíveis para todos, levando-as a lugares inóspitos, onde por vezes o que há para dizer é: “Aaaaah isso eu também sei fazer!” ou “Muito bonito! Já não via saltimbancos por aqui há uns 40 anos!”
Bom, mas como a Vieira da Silva diz e pinta: “A poesia está na rua” (oops lamento se agora fui erudita. Mas na verdade também não sei definir o que é ser erudito).
E na verdade, verdadinha incomoda-me mais esses alguéns que podem ser os nossos amigos, familiares, conhecidos, que por ignorância são arrogantes, do que os ditos bichos papões que governam ou desgovernam este país.
Mas também questiono: quem é essa tal elite cultural? Como é que esse pessoal dito de esquerda se posiciona perante o próximo? Às vezes parece que a regra é ser do clube por bajulação. Não interessa muito se te dedicas ou não. Isso até levanta demasiadas questões e põe em causa os lugares cativos. É mais melhor categorizar em: fulano é do teatro de texto, sicrano é o das palhaciçes o tal do circo, beltrano é do main stream e o outro é alternativo institucionalizado, aquele é popular, o outro comercial, o seguinte intelectual, um deles conceptual, o outro armado ao revolucionário, o mesmo é cool e cria só para os amigos, porque é um performer incompreendido. Bom, categorias que facilitam engavetar em clubes da turma do Bolinha. Porém, sublinho: ÀS VEZES; para não correr o risco de ser injusta. Assim como também corro o risco de afirmar que quando há tentativas de organização, de criação de sindicatos de artistas e afins toda a gente tenta se auto promover e anseia por protagonismo. Não é verdade, mas é recorrente. Mas como é recorrente o que era um início acaba por morrer de morte prematura.
Aqui para nós que toda a gente nos ouve: Qual razão desse tal discurso do “nós fomos os primeiros em Portugal…”, “”Nós somos os únicos….”? É pá!... Quem trabalha realmente não tem tempo para tal paleio. Um paleio que revela pequenezzzz. Uma espécie de choque de egos. Quem trabalha, trabalha e sabe, intimamente, qual o valor do seu trabalho e quanto custa a alcançar esse patamar de excelência. E o quanto é bom haver mais gente a seguir na mesma viagem, porque sabemos que não estamos sós, mesmo quando assim nos sentimos. E partilhar conhecimentos, dúvidas, conquistas, devaneios realizáveis dá saúde e faz crescer. Ou estarei enganada?
Parece-me que a questão efectiva de não nos conseguirmos mobilizar é pelo simples facto de acharmos que o que nós somos e fazemos é que é, e que o outro não vale o bastante. E daí segue para a falta de sentido organizativo porque não há escuta. Não damos a importância suficiente a nós e a quem está ao nosso lado para termos a capacidade de seguir em frente. Acaba por não haver um diálogo construtivo. Cada um acaba na sua ilha. Pobrezinho e queixoso, mas com um orgulho de ser o único, de ser o primeiro e de ser mais desgraçado que o outro. Enfim, uma espécie de conversa de centro de saúde: até na desgraça sou mais que o outro, sofro mais, tenho uma doença pior e já tive todas as que os outros que estão na sala tiveram. Mas tomo medicamentos melhores que o próximo! Os mais recomendados pelas principais marcas de máquinas!
Quanto a mim todas estas questões se prendem com o medo e a culpa. Medo de nos entregarmos, medo de sentirmos e dizermos gosto realmente e invisto; ou não gosto, não quero e invisto nisso também. No fundo, no fundo somos uns moralistas para connosco mesmo e para com os outros. Vivemos pregados aos moralismos católicos que a cada passo do nosso sentir e pensar nos fazem sentir culpados. E culpados nos querem para melhor nos controlar. E isso é aceite muitas vezes inconscientemente. E quando alguém abre o olhinho das duas, três ou tem de baixar a garupa ou é louco ou acaba por saltar fora.
Além de que os mecanismos para que não vejamos o outro frente a frente, de igual para igual tem haver com preconceitos instituídos que nós muitas vezes vamos atrás:”Aaaahhh fulano de tal é negro ou cigano ou gay então responde a este padrão social! Aaaahhh fulano de tal é de tal lugar, então é gringo. Tem dinheiro e explora o próximo e é gay às escondidas!” Esse for o contrário? E se for o cigano a explorar o gringo? E se o negro abominar o gay? E se o gay for homofóbico?” Aaaaahhh, mas isso já não vem contemplado no programa da caridadezinha que se quer manter, porque com o paternalismo se perpetuam as desigualdades e assim somos todos muito bonzinhos e a culpa é sempre do outro.
Resumindo, essa coisa de carregarmos preconceitos e provocações de trazer por casa agravam a escoliose e despoletam sulipampas entre os demais. Despoletam achaques naqueles que lutam contra os seus próprios preconceitos. Naqueles que acreditam que todos podemos ter igualdade de oportunidades, livre acesso à informação e que o que deve ser premiado é o mérito e não a”Xica Espertiçe do Chega-te à Frente Não Sejas Toino”; “do “deixa-me lá pôr-te para baixo para me valorizar”. Nestes moldes haveremos de ser sempre uns pobres coitados das franchas da Europaaaaa velha e cansada. Uns queixosos provincianos. Lamento se ofendo alguém, mas já é tempo de mudarmos de atitude e deixarmos de ser vítimas de nós mesmos e olhando o outro como um possível inimigo que me vai roubar o meu quinhãozinho do meu lugarzinho ao solzinho. Porque mais vale pouquinho do que nada.
Porque, afinal, até nem somos assim tão pouquinhos a querer mais. Mais dignidade. Mas isso conquista-se, a dignidade não vem no Kit da Maternidade, juntamente com a fraldinha, o óleo e a toalhita para limpar a remela e mais o livrinho ensinando como cuidar do bebé.
Para conquistarmos essa tal de dignidades temos de estar juntos sem Uis!, nem Ais!
Devo ainda acrescentar que esse alguém provocatório representa muitos alguéns que povoam o nosso mundo, mundo esse que poderia ser mais respirável. E esses alguéns que sem conhecimento de causam alvitram, provocam pelo simples jogo de alvitrar e provocar demonstram ostensivamente que desconhecem o que é ser artista em Portugal e possivelmente ignoram o que é ter filhos e sustentá-los nesta conjectura (ooops lá vai palavra cara sem dar atenção ao acordo ortogrânfico. Fica o “C” ou cai o “C”?)
Esse alguém talvez desconheça o que é fazer um trabalho por convicção, dedicação, amor à camisola muitas vezes sem ganhar um tostão. O que é, no final das contas, ser precário mesmo antes da crise financeira e dos cortes dos direitos dos trabalhadores. (Hoje somos mais, não é?) O que são horas e horas de trabalho dentro duma sala. O que é investir do seu bolso em formação, seminários, simpósios…. O que é correr atrás de bolsas de estudo. O que é não querer estagnar. O que é acreditar e defender a descentralização, e se dedicar-se de corpo e alma, muitas vezes em condições precárias. O que é desejar que a arte e a cultura sejam acessíveis para todos, levando-as a lugares inóspitos, onde por vezes o que há para dizer é: “Aaaaah isso eu também sei fazer!” ou “Muito bonito! Já não via saltimbancos por aqui há uns 40 anos!”
Bom, mas como a Vieira da Silva diz e pinta: “A poesia está na rua” (oops lamento se agora fui erudita. Mas na verdade também não sei definir o que é ser erudito).
E na verdade, verdadinha incomoda-me mais esses alguéns que podem ser os nossos amigos, familiares, conhecidos, que por ignorância são arrogantes, do que os ditos bichos papões que governam ou desgovernam este país.
Mas também questiono: quem é essa tal elite cultural? Como é que esse pessoal dito de esquerda se posiciona perante o próximo? Às vezes parece que a regra é ser do clube por bajulação. Não interessa muito se te dedicas ou não. Isso até levanta demasiadas questões e põe em causa os lugares cativos. É mais melhor categorizar em: fulano é do teatro de texto, sicrano é o das palhaciçes o tal do circo, beltrano é do main stream e o outro é alternativo institucionalizado, aquele é popular, o outro comercial, o seguinte intelectual, um deles conceptual, o outro armado ao revolucionário, o mesmo é cool e cria só para os amigos, porque é um performer incompreendido. Bom, categorias que facilitam engavetar em clubes da turma do Bolinha. Porém, sublinho: ÀS VEZES; para não correr o risco de ser injusta. Assim como também corro o risco de afirmar que quando há tentativas de organização, de criação de sindicatos de artistas e afins toda a gente tenta se auto promover e anseia por protagonismo. Não é verdade, mas é recorrente. Mas como é recorrente o que era um início acaba por morrer de morte prematura.
Aqui para nós que toda a gente nos ouve: Qual razão desse tal discurso do “nós fomos os primeiros em Portugal…”, “”Nós somos os únicos….”? É pá!... Quem trabalha realmente não tem tempo para tal paleio. Um paleio que revela pequenezzzz. Uma espécie de choque de egos. Quem trabalha, trabalha e sabe, intimamente, qual o valor do seu trabalho e quanto custa a alcançar esse patamar de excelência. E o quanto é bom haver mais gente a seguir na mesma viagem, porque sabemos que não estamos sós, mesmo quando assim nos sentimos. E partilhar conhecimentos, dúvidas, conquistas, devaneios realizáveis dá saúde e faz crescer. Ou estarei enganada?
Parece-me que a questão efectiva de não nos conseguirmos mobilizar é pelo simples facto de acharmos que o que nós somos e fazemos é que é, e que o outro não vale o bastante. E daí segue para a falta de sentido organizativo porque não há escuta. Não damos a importância suficiente a nós e a quem está ao nosso lado para termos a capacidade de seguir em frente. Acaba por não haver um diálogo construtivo. Cada um acaba na sua ilha. Pobrezinho e queixoso, mas com um orgulho de ser o único, de ser o primeiro e de ser mais desgraçado que o outro. Enfim, uma espécie de conversa de centro de saúde: até na desgraça sou mais que o outro, sofro mais, tenho uma doença pior e já tive todas as que os outros que estão na sala tiveram. Mas tomo medicamentos melhores que o próximo! Os mais recomendados pelas principais marcas de máquinas!
Quanto a mim todas estas questões se prendem com o medo e a culpa. Medo de nos entregarmos, medo de sentirmos e dizermos gosto realmente e invisto; ou não gosto, não quero e invisto nisso também. No fundo, no fundo somos uns moralistas para connosco mesmo e para com os outros. Vivemos pregados aos moralismos católicos que a cada passo do nosso sentir e pensar nos fazem sentir culpados. E culpados nos querem para melhor nos controlar. E isso é aceite muitas vezes inconscientemente. E quando alguém abre o olhinho das duas, três ou tem de baixar a garupa ou é louco ou acaba por saltar fora.
Além de que os mecanismos para que não vejamos o outro frente a frente, de igual para igual tem haver com preconceitos instituídos que nós muitas vezes vamos atrás:”Aaaahhh fulano de tal é negro ou cigano ou gay então responde a este padrão social! Aaaahhh fulano de tal é de tal lugar, então é gringo. Tem dinheiro e explora o próximo e é gay às escondidas!” Esse for o contrário? E se for o cigano a explorar o gringo? E se o negro abominar o gay? E se o gay for homofóbico?” Aaaaahhh, mas isso já não vem contemplado no programa da caridadezinha que se quer manter, porque com o paternalismo se perpetuam as desigualdades e assim somos todos muito bonzinhos e a culpa é sempre do outro.
Resumindo, essa coisa de carregarmos preconceitos e provocações de trazer por casa agravam a escoliose e despoletam sulipampas entre os demais. Despoletam achaques naqueles que lutam contra os seus próprios preconceitos. Naqueles que acreditam que todos podemos ter igualdade de oportunidades, livre acesso à informação e que o que deve ser premiado é o mérito e não a”Xica Espertiçe do Chega-te à Frente Não Sejas Toino”; “do “deixa-me lá pôr-te para baixo para me valorizar”. Nestes moldes haveremos de ser sempre uns pobres coitados das franchas da Europaaaaa velha e cansada. Uns queixosos provincianos. Lamento se ofendo alguém, mas já é tempo de mudarmos de atitude e deixarmos de ser vítimas de nós mesmos e olhando o outro como um possível inimigo que me vai roubar o meu quinhãozinho do meu lugarzinho ao solzinho. Porque mais vale pouquinho do que nada.
Porque, afinal, até nem somos assim tão pouquinhos a querer mais. Mais dignidade. Mas isso conquista-se, a dignidade não vem no Kit da Maternidade, juntamente com a fraldinha, o óleo e a toalhita para limpar a remela e mais o livrinho ensinando como cuidar do bebé.
Para conquistarmos essa tal de dignidades temos de estar juntos sem Uis!, nem Ais!
Diário de bordo num sábado como outro qualquer
Manhã: O açai com banana transbordou do liquidificador para a caneca atingindo uma área considerável da cozinha. Foi uma espécie de tsunami. Um bom pretexto para dar uma limpeza geral. Às vezes são necessárias estas catástrofes para higienizar o ambiente.
Tarde: Um bando de abutres sobrevoa os campos. Uma visão fascinante e aterradora. Não tive medo. Não tive medo que me atacassem. Os abutres comem carne morta. Espero.
Mais tarde: Já fizemos mais uns amigos na vizinhança. Cool! Estiveram cá em casa a almoçar. Uma amiga também veio-nos visitar. Voltámos a ver os abutres. A amiga tirou fotos deles, austeros, poisados na árvore. Não tivemos medo. Estávamos juntas. E vivas.
Ainda mais tarde: - Olhaaaa! Se não pudermos ter um gato podemos ter um cavalo?
- Hmmmm. Pode ser!
terça-feira, 13 de março de 2012
(A)INDA AGORA AQUI AO TANQUE
Quando eu era menina e moça vivia numa singelo e pacato lugarejo suburbano. Nessa época o rebanho de ovelhas passava pela minha rua. A Rua do Lavadouro. E a vida corria ao som da edificação de fábricas e da construção clandestina de casas, logo após o 25 de Abril. “Casas para todos!” Apoio, porém o sentido estético era, por vezes, duvidoso. Mas aí que saudades das andorinhas de plástico penduradas na parede e casas com o nome de “O nosso ninho”; “ Vivenda Carrapato” (junção dos nomes dos irmãos Carlos, Ramiro, Paula e Tobias).
Da Rua do Lavadouro eu podia contemplar a Serra de Sintra a uns 7km de distância. Com os meus 6 anos assisti durante dois ou três dias a serra a arder. Uma visão apocalíptica que poderia confirmar a história dos meus desenhos animados preferidos (Conan, o rapaz do futuro). E lá voltava para casa de bicicleta, depois de comer um corneto de chocolate e cantar o jingle:”E a vida sorriiii!”.
Guardada a bicicleta, corria para assistir o “Verão Azul” onde crianças brincavam na rua e pedalavam em grupo numa aldeia de veraneio espanhola. A amizade, a solidariedade pautavam o guião da história. Finalizado o momento televisivo, o percurso que vai as escadas da casa até ao quintal era feita em gincana, tal como víamos nos “Jogos Sem Fronteiras”. Ooooh doce nostalgia! Mas tempo, não precisas voltar para trás, que a vida é aqui e agora.
No fundo da Rua do Lavadouro havia um tanque público onde as mulheres lavavam a roupa, mesmo tendo máquinas em casa. Um lugar de convívio para pôr as novidades em dia. E claro! Lavar a roupa suja!
A minha querida e terna avó tinha um lugar cativo no dito tanque. E quando eu chegava da escola podia confirmar, com um simples erguer de cabeça e colocando o corpo em diagonal, onde a mocinha do cabelo branco se encontrava.
A dita mocinha do cabelo branco por vezes trazia algumas novidades e começava: “(A)inda agora aqui ao tanque contaram-me: tal, tal e tal”. Umas vezes eram informações escutadas na telefonia outras eram fait divers das amigas de tanque e do lugarejo em causa. Entre a telefonia de manhã e as incursões da mocinha ao tanque lá nos íamos mantendo informados dos percalços do quotidiano. Aliás, ao que consta no dia 25 de Abril de 74 (revolução dos cravos) foi a dita mocinha que apareceu logo de manhã lá por casa alertando para não se sair e tão pouco ir trabalhar para Lisboa. Bom, nos meus singelos 6 meses de idade não tive, naturalmente, voto na matéria. E lá fiquei eu consignada ao calor do meu lar.
Volvidos 38 anos, onde muitos vinis a passarem debaixo da ponte com “promessas” de mudança para um mundo mais respirável, encontramo-nos hoje aqui entre um IPode mas afinal não pode, um IPede que eu já te dou. Encontramo-nos aqui em frente ao telefone móvel, ao computador portátil, circulando e escolhendo (?) sair do mesmo lugar ou não.
Ao escolher sair do mesmo lugar sem querer perder a referência do lugar de onde venho organizei um festum! O festum do “Até jazz!” No dito festum, voltou a baila o cepticismo duma amiga em relação ao facebook. E uma vez mais argumentei que se soubermos utilizar o facebook, assim como outra coisa qualquer duma forma construtiva, é fixe! Encontramos pessoas, trocamos ideias, ORGANIZARMO-NOS! Cool! Não tem de ser necessariamente um lugar para lavar roupa suja ou fazer dos murais um bidé público ou uma revista de curiosidades e ilações prematuras e imaturas da vida alheia.
Contudo, porém, no entanto e todavia quando a Cláudia sai-se com esta: “Agora já não se diz mais “inda agora aqui ao tanque”; agora diz-se “inda agora aqui ao facebook!” eu não pude deixar de rir como se estivesse em transe! MUITO BOM!!! “Inda agora aqui ao Facebook!!!” GENIAL!
Cláudia! Quero te dizer que és a minha heroína a seguir ao Super Bock!!! Mas como te dizer, se nem fiquei com o teu e- mail?!.....................
Bom, tá bem! Posso te enviar um sms a perguntar!!...
Keep in contact! Keep in contact! E a vida sorriiiiiii!!
Da Rua do Lavadouro eu podia contemplar a Serra de Sintra a uns 7km de distância. Com os meus 6 anos assisti durante dois ou três dias a serra a arder. Uma visão apocalíptica que poderia confirmar a história dos meus desenhos animados preferidos (Conan, o rapaz do futuro). E lá voltava para casa de bicicleta, depois de comer um corneto de chocolate e cantar o jingle:”E a vida sorriiii!”.
Guardada a bicicleta, corria para assistir o “Verão Azul” onde crianças brincavam na rua e pedalavam em grupo numa aldeia de veraneio espanhola. A amizade, a solidariedade pautavam o guião da história. Finalizado o momento televisivo, o percurso que vai as escadas da casa até ao quintal era feita em gincana, tal como víamos nos “Jogos Sem Fronteiras”. Ooooh doce nostalgia! Mas tempo, não precisas voltar para trás, que a vida é aqui e agora.
No fundo da Rua do Lavadouro havia um tanque público onde as mulheres lavavam a roupa, mesmo tendo máquinas em casa. Um lugar de convívio para pôr as novidades em dia. E claro! Lavar a roupa suja!
A minha querida e terna avó tinha um lugar cativo no dito tanque. E quando eu chegava da escola podia confirmar, com um simples erguer de cabeça e colocando o corpo em diagonal, onde a mocinha do cabelo branco se encontrava.
A dita mocinha do cabelo branco por vezes trazia algumas novidades e começava: “(A)inda agora aqui ao tanque contaram-me: tal, tal e tal”. Umas vezes eram informações escutadas na telefonia outras eram fait divers das amigas de tanque e do lugarejo em causa. Entre a telefonia de manhã e as incursões da mocinha ao tanque lá nos íamos mantendo informados dos percalços do quotidiano. Aliás, ao que consta no dia 25 de Abril de 74 (revolução dos cravos) foi a dita mocinha que apareceu logo de manhã lá por casa alertando para não se sair e tão pouco ir trabalhar para Lisboa. Bom, nos meus singelos 6 meses de idade não tive, naturalmente, voto na matéria. E lá fiquei eu consignada ao calor do meu lar.
Volvidos 38 anos, onde muitos vinis a passarem debaixo da ponte com “promessas” de mudança para um mundo mais respirável, encontramo-nos hoje aqui entre um IPode mas afinal não pode, um IPede que eu já te dou. Encontramo-nos aqui em frente ao telefone móvel, ao computador portátil, circulando e escolhendo (?) sair do mesmo lugar ou não.
Ao escolher sair do mesmo lugar sem querer perder a referência do lugar de onde venho organizei um festum! O festum do “Até jazz!” No dito festum, voltou a baila o cepticismo duma amiga em relação ao facebook. E uma vez mais argumentei que se soubermos utilizar o facebook, assim como outra coisa qualquer duma forma construtiva, é fixe! Encontramos pessoas, trocamos ideias, ORGANIZARMO-NOS! Cool! Não tem de ser necessariamente um lugar para lavar roupa suja ou fazer dos murais um bidé público ou uma revista de curiosidades e ilações prematuras e imaturas da vida alheia.
Contudo, porém, no entanto e todavia quando a Cláudia sai-se com esta: “Agora já não se diz mais “inda agora aqui ao tanque”; agora diz-se “inda agora aqui ao facebook!” eu não pude deixar de rir como se estivesse em transe! MUITO BOM!!! “Inda agora aqui ao Facebook!!!” GENIAL!
Cláudia! Quero te dizer que és a minha heroína a seguir ao Super Bock!!! Mas como te dizer, se nem fiquei com o teu e- mail?!.....................
Bom, tá bem! Posso te enviar um sms a perguntar!!...
Keep in contact! Keep in contact! E a vida sorriiiiiii!!
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