segunda-feira, 5 de maio de 2014

A MINHA MÃE É UM BATALHÃO

  1. Em 1964 a Isabel teria uns três anos quando foi encontrada no meio do mato perto de Luanda em Angola. As pessoas da sua aldeia fugiram com a chegada das tropas portuguesas. Durante muito tempo foi a "mascote" daquele batalhão. Tinha sido adotada pelo "inimigo". Mais tarde foi adotada pela família do comandante em Portugal. Inimigo vem entre aspas, porque atrás dos conflitos entre Estados, potências e outras indecências estão pessoas. De um lado e outro. Transitando com um coração dentro de si. Umas vezes mais mole outras mais duro. Conheci a Isabel talvez nos anos 90 em Lisboa, nas andanças do teatro. Mais tarde, em 2009, conheci casualmente a sua história no exato momento em que precisava de fazer um trabalho sobre parentesco. Quando conversamos, das primeiras coisas que a Isabel disse foi:"Tive várias mães. No batalhão,eu era a filha de todos." Perguntei se tinha curiosidade de voltar a Angola e conhecer a sua familia biológica. Respondeu que não. Moral da história: a Isabel foi protagonista de uma história de amor em tempos de guerra. Guerra essa, como todas as guerras, cheia de lavagens cerebrais. Convicções de punho batendo no peito defendendo o Império vão:"Angola é nossa! Angola é nossa!"
    Não, Angola não é nossa! Nada é nosso. Se alguma coisa que é nossa e podemos dar e receber é Amor, Cuidado, Proteção e Paz.

    Porque me lembrei desta história? Porque hoje é dia das mães do outro lado do oceano e próximo domingo é cá. Logo, lembrei-me de prestar homenagem aos homens e mulheres que não se esquecem de serem seres viventes e qualquer um tem o tal instinto maternal, mesmo em tempo de guerra e outras adversidades.

    Ana Piu
    Brasil, 4.5.2014

    foto: imagem de arquivo do Centro de Documentação 25 de Abril, não consta que a criança seja a Isabel. Mas talvez seja. Quem sabe?

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