terça-feira, 22 de outubro de 2019

A CAMA QUE FIZERES NELA SONHARÁS - breves consideração duma portuga no Brasil

Não tem problema nenhum passar a vida a fazer camas. Viver a vida a fazer camas alheias e a limpar quartos de hotel. Talvez até haja algum problema, mas agora vamos avançar e fazer de conta que é um trabalho digno. Digno até é, mas desnecessário principalmente para quem investiu os seus estudos ou a sua vida em outra coisa e não está para ser criado dos turistas de primeira, segunda e terceira que veem por aí a fora fazer turismo nos países "em vias de desenvolvimento" que se tornam parques temáticos. Países e lugares que se tornam imitações deles próprios, subestimando a sua população que passa a ser prestadora de serviços hoteleiros onde a autonomia é adquirida com a nova vaga do uber e de fazermos da nossa casa um airbnb ou trabalhar para terceiros com contratos de prestações de serviços. Isto é, sem vínculos empregatícios que salvaguardem quem trabalha. Bom, assim se transformou Lisboa nos últimos cinco anos. Descobrimos assim a chave do enigma, após o país ter atravessado um período de 9 a 10 anos de austeridade que muitos patrícios saíram em debandada pelo mundo afora e outros seguraram o seu emprego ou subemprego com os ais habituais quer possam consumir muito ou pouco.
Agora surge um outro enigma... Onde é que alguns brasileiros fundamentam-se para afirmar que Portugal está demais e que todo o mundo está a ir para lá. Ao inicio achava quer era mais uma daquelas piadas de mau gosto. Uma provocação, vá. Tentava trabalhar dentro de mim aquele revirar de tripa para não ser grossa nem injusta. Depois, há coisa de um ano atrás com aquele período no Brasil eleitoral inenarrável, indescritível, deixando a pessoa entre a estupefação, o constrangimento e o alívio digo de mim para mim: Ah agora já entendi! Ele há momentos que a pessoa sente que o amor está no ar. No caso, estava a desinformação, o equivoco, os desconhecimento do seu próprio país e lamentavelmente o xingamento. Tudo menos amor. Uma esquisitice de parte a parte que ruboriza as faces de qualquer um que estuda história minimamente.
Alivio porquê? Porque se o pessoal nem sabe o que se passa no Brasil como vai saber o que se passa em outros países? Principalmente em Portugal.
Há uns dois ou três anos atrás, por altura do Natal, percebi que a minha energia vital estava para baixo. Um dia, deitada na cama virei-me e percebi uma das causas da minha letargia. Precisava de parar de ler as noticias do "Le Monde Diplomatique - Brasil". O que se passa no mundo, relatado pelos jornalistas mesmo que sérios, não dá esperança. Estamos entregues aos bixos. Mas não podemos fingir que esses bixos não são reflexo da nossa desunião muitas vezes maquiadas com lindas causas. A solidariedade ativa é um meio hábil para dar a volta ao texto. Mas talvez precisamos de todos de ser encostados contra a parede para começarmos a olhar ao redor. Sentir na pele algumas vezes é inevitável para entender o que muitos já passam quando estão desempregados durante um período considerável e também não querem regressar a ambientes de trabalho insalubres.
Há um mês ou dois atrás não resisti a ler um artigo da mesma revista sobre as greves que acontecem em Portugal neste momento , mesmo com um dito governo de esquerda - tá, na lógica neo liberal, mas de esquerda hm hm - pois o pessoal quer ter mais poder aquisitivo. Bom, já sabemos que o que importa é consumir...  Se a educação e a saúde mancam nós degustamos um queijinho e um vinhinho e fica tudo bem, ainda para mais se por momentos achamos que o nosso maior objetivo é obter o glamour do norte da Europa mesmo que o resto do mundo não faça parte desse condomínio fechado aparentemente democrático. Ihihih É melhor rir do que chorar.
Quanto a mim, mesmo assim encontro muito mais razão de morar no Brasil do que nessa glamourice que tem o preço alto daquela futilidade acima descrita. Mas qual é o latino, seja europeu ou americano, que não curte uma boa dose de ostentação e aparência mesmo que tenha de se submeter a sub empregos no ramo do turismo com salários mínimos que nem o aluguel dá para pagar? Não é vergonha nenhuma fazer camas. Eu faço a minha. Os outros que façam as deles que eu vou seguir trabalhando com o que estudei e com os meus estudos. E muito grata em quem tem acreditado no meu trabalho e apoiado de coração.
Cocórocócó Piu piripipiu
A Piu in Braziu
22/10/2019
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