quinta-feira, 29 de julho de 2021

O NOSSO VERÃO QUENTE DE 75- sobre as pequenas grandes revoluções internas e de consciência

 


Agosto de 75, num qualquer sábado ou domingo desse mês ou até mesmo durante as férias dos meus jovens pais. No meu país de origem vivia-se um dos mais conturbados momentos da História Portuguesa. E aí, minha do galerada do bem, estão a fim de conhecer um cadinho da história de Portugal do lado de lá da barricada? Do lado de lá do lá do lalarala que é do lado povo de brandos costumes que limpou o sebo ao rei Dom Carlos e ao príncipe Luis Felipe em1908, vulgus regícidio, para instaurar a República e anos mais tarde, no ano desta foto, no ano da graça dos senhores de barba, bigode, cabelo grande, patilhas e com muitos "pás" no falar quase se instalou uma guerra cívil entre a malta da esquerda e da malta da direita onde a corda puxada era um vai para lá, vai para cá de reforma agrária para já ou depois, de cooperativas populares e de corportaivismos internacionais. 

A minha mãe era uma comum funcionária pública dos Correios de Portugal. Eu gostava muito de andar vestida e calçada como ela. Sandalita branca, saia em forma de sino e uma blusita casual. Já o cabelo curto era a onda dela e da época. Moda unisexo com feminilidade. Ela gostava de calças e eu nem tanto, pois prendiam-me os movimentos e rodar até não poder mais a saia era uma das brincadeiras favoritas.

Desta época não me lembro do que a minha mãe falava, mas lembro-me de escutar dela, em criança, que as eleições eram uma farsa. Não valia a pena votar, pois 'eles" metiam lá quem 'eles' queriam. Soava um tanto a amargo, mas hoje dou-lhe toda a razão. Embora o mais revolucionário é nunca perdermos a doçura, nem a meninice consciente.A alegria que vem de dentro que não é o mesmo que oba oba é revolucionário. 

Aqui estamos em Sintra, nas emidiações do Castelo dos Mouros ou do palácio da Pena. Sabermos a história do Castelo dos Mouros é uma bela duma viagem para conhecermos outras dobras da História que aOficial não conta. A História da passagem dos Mouros por terras lusas, a perseguição e bamimento dos judeus e etc e tal. Tenho toda a certeza que os nossos ancestrais são mouros ( norte africanos), judeus ( por toda a parte da Europa desda a Rússia até cá a baixo), e muitos e tantos outros povos considerados bárbaros, vindos do norte da Europa. 

Não sei se o tempo é de certezas, mas uma tenho quase como certa: a terra é de todos e não é de ninguém, é de quem se trabalha, por dentro, para honrar quem veio antes e virá depois sem despotismos, nem disputas vãs. Muito menos a História contada por um só viés, por mais bem intencionados que possamos parecer. Abrirmo-nos para a escuta não será um ato de amorosidade? E escaranfuchar o tempo todo só num lado da história e numa só versão muitas vezes distorcida não será um discurso de ódio? Por exemplo, desconhecer que existem pessoas em Portugal que são da classe trabalhadora, muitas pagam impostos sem grandes beneficios, e muita desempregadas e nunca viveram do saque das colónias, como outras pessoas teriam vivido e ainda viverão desses mesmas explorações. Mas é sempre mais fácil limpar a água do capote e procurar um bode expiatório. Mas quando é para cima de quem trabalha... Tão a ver aquela menininha pequenina inocente? Hoje ela levanta a cabeça e diz: " Comigo não! Olarépipu!"

Gratinados por ter chegado até aqui. 

A Piu

Campinas SP 29/07/2021

sábado, 24 de julho de 2021

SIM, SER MULHER AINDA É UM DESAFIO


 Gostaram do titulo? Lembra aquela revista feminista 'ca minha tia lia no inicio dos anos 80. Revista 'Mulheres'. Mas aviso já que este titulo é quase uma publicidade enganosa, pois não vou falar exatamente do desafio de ser mulher, seja esta portuguesa, brasileira, chinesa, nigeriana, mexicana, nova zelandesa e etc e tal. Porquê? Porque olhando bem esta foto pensei melhor no que queria escrever sucintamente (?!) nas redes sociais acerca de. 

Esta foto sempre me intrigou. Ingenuamente, durante muitos anos, achei que se tratasse dum erro ortográfico. Achei que em vez de draga deveria ser Braga, Mas mesmo assim não fazia sentido: Lisboa Braga ETA. Não, para os mais desavisados ETA não tem a ver com " Eta eta eta! É a lua, é o sol, é luz de Tieta!" Embora a foto sugere o Trem Azul naquela parte: " O sol na cabeçaaaaaa!"

Esta foto pode sim  ser um dispositivo para mergulharmos num estudo mais profundo. O que foi a ETA e como foi a sua passagem por Portugal. Sim, numa época a ETA  estava a tranferir a base logística para Óbidos, em Portugal, mas  que depois foi descoberta. Para mais aprofundamento temos o livro " Uma história da ETA- nação e Violência em Portugal e Espanha" de Diogo Noivo,  analista político e estudioso do terrorismo. 

Até aos 18 anos eu só conhecia a Peninsula Ibérica, Portugal e a vizinha Espanha. Com as teatradas, enquanto estudante e depois profissional comecei a viajar pela Europa Ocidental. Até essa data eu sempre ficava muito impressionada com aquelas falas das telenovelas brasileiras: " Vou dar um tempo, preciso de me encontrar, vou viajar pela Europa". Deviam ser pessoas muito ricas e com muito tempo, pois não se conhece a Europa em dois meses. De que Europa falavam, pensava eu. Resumindo: ser artista é uma profissão, ser mulher é um estado que nós assumimos para a as nossas vidas como diz a Simone, a de Paris que era filósofa: " Não se nasce mulher, torna-se mulher". Conhecer os lugares a partir da minha profissão de teatreira é muito bom, mil vezes melhor que a de turista. Temos um contato mais humano com as pessoas e com abertura desfazemos velhas dores históricas doando-nos com o nosso trabalho que nos dignifica e nossa humanidade.

Da América do sul conheço Brasil, Argentina, Chile e Colômbia. Sempre fico muito impressionada.... Como um território tão grande em alguns pontos relembra a "minha" pensinsula Ibérica?!?! Se eu saio de Espanha, encontro a França onde se fala francês e a Itália onde se fala italiano e por aí vai. Que projeto monstruoso foi esse de dissimar sociedades, civilizações e culturas e conseguir instituir linguas oficiais vindas do outro lado do Oceano. duma pequenita península?!?!? 

Eu já estudei na graduação em Antropologia sobre o País Basco e a Catalunha, não falando da História de Portugal que é pautada constantemente com batalhas e guerras contra os mouros e o reino de Castela. Já não falando dos povos anteriores à Lusitânia. Ou seja, uma História de cunho meramente patriarcal onde a lei da porrada, da violência, da imposição, da dominação, da matança é o que singra, relegando para o último plano o feminino, o respeito pela mulher e o que esta pode gerar além de filhos. Isto é, ela enquanto ser criador e criativo. 

Parece-me a mim e muites de nós que já é tempo de dar um belo tchauzinho à lógica patriarcal, principalmente nas nossas relações micro com nós mesmes e com quem nos rodeia.

Enfim, até ao próximo texto sobre o assunto.

Bom sábado e cuidem o coraçãozinho porque este é muito sábio. O magano!

A Piu

Campinas SP 24/07/2021

terça-feira, 20 de julho de 2021

ENCONTRÕES DE 3° GRAU ENTRE O VELHO E O NOVO MUNDO


 Dizem e vê-se por aí que cócoras é das posições mais antigas que atravessam o homo sapiens do globo terrestre inteirinho. Uma posição que serve para descanso em prontidão, para evacuar as necessidades fisiológicas e também para parir. Sim, esta é a posição mais orgânica para dar à luz um ser humanizante.

Os, as ou seres humanizantes da terra redonda além de descansarem, comerem, beberem, evacuarem e algumas parirem sentem alegria, tristeza, medo, raiva, amor, confiança, desconfiança, são humildes,arrogantes, adormecidos ou mais despertos. Independentemente da pigmentação, etnia. sociedade, cultura, comunidade nós somos todes iguais e todes diferentes. Por isso, é muito bom nós termos a possibilidade de ir e vir, de querer conhecer outros mundos e outras gentes para lá da nossa bolhinha, ideias feitas, preconceitos e crenças limitantes.

Em criança, quando íamos à praia no sul de Portugal, Algarve, eu perguntava a esse sujeito de jeans que é o meu pai, o que ficava do outro lado do mar. E a resposta chegava assim, estimulante e também intrigante: " África. E se esticares bem o pescoço consegues avistar a savana com girafas, elefantes e leões. " Nunca consegui avistar à distância esse zoo no habitat natural, mas nunca precisei de esticar o pescoço para avistar pessoas que nasceram no continente africano, pois muitas viviam e vivem em Portugal. Não as conheço todas, mas algumas são minhas amigas desde a mais tenra idade.

Uma criança quando nasce não é racista, mas pode-se tornar se o meio que a rodeia for altamente tóxico. O mesmo se passa com xenofobia. Xenofobia é aquela fobia ao ( aparentemente) diferente como se quem estivesse na nossa frente fosse um E.T.

O sonho do meu avô, um homem simples de origens humildes, era que os seus três netos fossem para a marinha. Nenhum foi. E eu, como neta, não fazia parte desse seu almejo, mas recebi muitos elogios por saber colocar pratos e talheres em cima da mesa... Mal sabia ele 'ca' sua netinha também sabia virar a mesa.

Outro dia escutei algo muito bom dumas mulheres brasileiras que fazem um trabalho muito inspirador sobre autonomia feminina, que nada tem a ver estar contra os homens: Nós mulheres não queremos fazer xixi de pé como alguns homens. Imaginem a bagunça! Queremos sim não ter que repetir sete vezes que queremos ser respeitadas e ter igualdade de direitos. 

Óbvio, minha boa gente! Mas eu ri por dentro, porque essa mocinha que veem aí na foto com umas antenas de ET tentou várias vezes fazer xixi de pé como a rapaziada. A sorte é que não molhava os pés, porque sempre trazia umas traineiras chamadas botas ortopédicas, como se pode ver na foto. 

Na época dessa foto estreou um filme: Encontros de terceiro grau, assim como nessa época as mentalidades estavam-se a abrir. Nos idos anos 70. E as mentalidades abrem-se gradualmente. Bem sei que o povo português não é dos mais emancipados do mundo, mas mesmo assim no momento em que me encontro considero que fazer a minha parte, além de escutar e estar do lado de povos e culturas secularmente oprimidas, primeiramente pelo meu povo e perpetuado pelo brasileiro até hoje, é também meu dever honrar o meu povo que não é feito só de reacionários e que também foi silenciado pelas oligarquias do meu país. E que enxergar os portugueses todos como reacionários achando que se está a defender uma grande causa, mas sonha viver em Portugal porque é Europa também está a ser reacionário. Isto no meu ponto de vista, claro, que está aberto a escutar e observar novas formas de nos relacionarmos sem preconceito. Mas uma coisa eu fico sempre com uma grande interrogação na cabeça: Qual o conhecimento mínimo da luta dos trabalhadores portugueses, das crises económicas do país, da cultura portuguesa que tem a pessoa brasileira, principalmente branca de origem portuguesa  

Fico realmente intrigada... Pessoalmente eu não escolheria uma cidade ou um país que achasse que todos ou quase todos fossem lerdos e reacionários, colonialistas vá... Para ir direito ao assunto. E se a pessoa defende tanto o povo oprimido brasileiro há tanto a fazer nesta terra.Para quê ir embora, já que defende ninguém largar a a mão de ninguém? A diversidade cultural, artística, de pensamento é tão grande que é deveras mais estimulante do que ir para o "meu" paízinho à beira mar plantado com as suas gentes, também generosas, acolhedoras com a sua cultura popular mas mais travadinhas e também preconceituosas aqui e ali. Eh pá! Há gente fixe bacana em toda a parte do mundo. E lá está, para migrar é preciso peito, coragem, motivação. Se o lugar não nos faz feliz e não nos identificamos com as pessoas nem nos damos ao trabalho de conhecer pessoas que não são reacionárias o que  estamos a fazer nesse lugar? Ou achamos que a nossa missão é enfiar o dedo na cara de  pessoas que nem conhecemos? Sim, Portugal tem uma dívida histórica para com os povos africanos e indígenas, mas isso não significa que somos todos uns brutinhos, lerduchos e não conhecemos a História, porque afinal de contas muitos que votaram neste Coiso aí agora moram em condomínios fechados em Portugal, coisa que nem existia. Será que eles também levam a criadagem daqui ou contratam por tuta e meia em Portugal? ...dasse... Bora lá ter consciência de classe e estudar História com profundidade e relacionarmos-nos sem atitudes preconceituosas o tempo todo. Não significa que o preconceito não exista de parte a aparte, mas já é tempo de cada um fazer a sua parte e se auto observar.  E já agora honrar os seus antepassados que emigraram para o Brasil com uma mão à frente outra atrás, muitos despolitizados e que por isso viraram novos ricos com síndrome de cafonice, além de desdenharem e escarnecerem do seu próprio povo.

A Piu

Campinas SP Brasil 20/07/2021  

domingo, 11 de julho de 2021

TOCA BARATA MOURA!!!!


 Quanto ao José Barata Moura,este foi em certa medida o nosso Raul Seixas. O Raul Seixas da criançada, vá. Da criançada seventi, pós 25 de Abril. Quem na minha geração não conhece o Barata Moura onde é que tem andado? Assim que chegava o meu aniversário o dia começava logo com os LP's  do "Fungagá da Bicharada", o " Come a papa Joana, come a papa" e " A bola do Manel" no gira discos/ vitrola. Isto antes da malta amiga/ pessoal/ galerada amiga chegar para a festa. Logo, não era aquele "Toca Raú!" de fim de festa onde a mousse de "chiclate", o salame de "chiclate", a gelatina de morango e as sanduiches/ lanchinhos em triangulo de pão de forma já tinham desembuchado com várias doses de laranjada. Nãããã! Barata Moura era para "cortir" mesmo antes dos convidades chegarem! O cão Dom Pantaleão e cão apenas cão era a minha preferida. Barata Moura com a sua voz potente apresentava o Dom Pantaleão com a sua soberba e depois baixava o tom de voz para apresentar o cão apenas cão que não precisava de opulência nem ostentação. 

Pelo que sei o Barata Moura não é a porra louquice do Raul Seixas, mas acredito que ainda hoje se um de nós colocar numa festa ( quando a pandemia se for) um " Come a papa Joana come a papa" vai ser um delírio. Aqueles que já poderão estar  um pouco regados ainda pode ser que chorem e tirem da sua mochila aquele velho ursinho já desbotado. Uns farão aquela velha piada do 'Come o papa, Joana come o papa". Sim,é uma piada portuguesa blasfémica. Mas também porque não? Tivemos que os aguentar tanto tempo, tantos séculos de bico calado ou a rir pela calada... E se o papa for um fulano com humor e amor no coração vai entender que não é nada personalizado e que o tal do Vaticano precisa de repensar toda a sua estrutura. Vai entender que o riso é liberta dor e ainda pedir todas as desculpas  pelo dano causado em muitas sociedades e culturas, e assim, quem sabe, as suas práticas possam ser mais coerentes com a teoria de amor universal.

Já o Avô Cantigas nunca me convenceu muito. No inicio da sua carreira era um jovem homem saltitão com uma peruca branca e uns óculos com umas jardineiras a fazer de avô. Mais tarde, mais velho a fazer de avô jovial.  Cantas bem, mas não me alegras. Com todo o respeito pelo Carlos Alberto Vidal, que ao que consta antes de ser o avô cantigas, foi considerado nos anos 70 o pioneiro do rock progressivo com o seu álbum Changri-lá. E esta, hein?

Olhando à distância que os ícones da minha infância era tudo malta de esquerda! O Barata Moura,que além de cantor é  da filosofia e foi reitor da universidade de Lisboa, foi e talvez ainda seja do Partido Comunista. O Sérgio Godinho que também é um cantor de intervenção para adultos e crianças também é da malta da esquerda. Esses jargões de direita e esquerda até já podem estar um pouco ultrapassados, mas o que é facto é que alguém que abre alas, rompe com a mentalidade conservadora, tacanha, provinciana dum país com a mania das grandezas em que a distribuição é só para uns tantos fazem toda a diferença na formação de um cidadão e cidadã desde a mais tenra idade. 

Ah! O José Saramago, que ganhou o primeiro Nobel da literatura, também era comuna! Eu já conheci muitos comunas portugueses e devo dizer quando estes quando estão na oposição fazem um trabalho incrível. Uns, nem todos. Mas alguns, nem todos, quando chegam ao poder é um "vê se te avias", é um ' quem parte e reparte e não fica com a melhor parte ou é tolo ou não tem arte". Outros ainda infantilizam as gerações seguintes, nomeadamente a minha. Pois acham que eles são os guardiões da revolução e nós não entendemos nada de nada. Talvez por isso as coisas chegaram no ponto em que estão. Um neo liberalismo a dar ares de democracia. 

Da minha parte só posso agradecer a estas figuras que fizeram a sua parte nomeadamente junto de nós crianças dessa época. E que hoje podemos olhar para trás com sentido crítico e entender um pouco melhor o que ainda faz sentido, o que não faz mais sentido e o que podemos agregar à utopia de estarmos unidos com solidariedade, humanismo e afeto.

A Piu

Campinas SP 11/07/2021

sábado, 10 de julho de 2021

PARVOÍCES À PARTE


Já o Gil Vicente( 1465-1536) foi o nosso Shakespeare (1564-1616). Já se vê que o Gil é mais velho, mas se andarmos aí pelo mundo muitos conhecerão o William, assim como o Chaplin, e não o Vivente, nem o Vasco Santana. Olha outro Vasco que não era Gama!! Mas este Vasco foi uma estrela do cinema de comédia do Estado Novo. Fez rir a população em momentos de miséria e perseguição. Verdade seja dita eu ainda me riu desse cinema dos anos 40 em que as marchas populares foram um construto do governo de Salazar tal qual o Carnaval de Getúlio Vargas. Apropriam-se de manifestação festivas para criar uma identidade nacionalista, patriótica e assim entreterem o povo de forma populista para que as decisões sejam tomadas pelos altos mandatários. Já não falando que no século passado, em terras brasileiras, as rodas de samba eram proibidas e punidas e assim como outras manifestações de matriz africana.
Já o Gil Vicente servia ao rei. Escrevia, encenava, atuava com a sua trupe para a corte e coroa portuguesa. Era uma vertente do bobo da corte mas mais erudito em que misturava finamente a erudição da escrita, do conhecimento das diferentes camadas sociais à cultura popular. Acredito que até hoje em Portugal o Gil Vicente seja apresentado e estudado no ensino secundário/ médio. A incrível experiência de olhar para um texto escrito em português arcaico e só pescar o sentido duma palavra e frase. Por isso existem os estudiosos para traduzirem e contextualizarem. Mas o teatro é vivo. Quando vira somente teoria é chato para caramba!
Nestes tempos de confinamento muitas universidades públicas brasileiras oferecem gratuitamente cursos de extensão. Eu estou em dois e digo e repito: VIVA A UNIVERSIDADE PÚBLICA PARA TODES DE FORMA DEMOCRÁTICA!!!
Numa aula foram convidados dois especialistas portugueses em Gil Vicente que também são artistas. Eu conheço-os. Conterrâneos dum país em que viramos a esquina e 'tá lá toda a gente ou quase toda. Quem estuda e segue o oficio de teatreiro inevitavelmente passa pelo Gil Vicente. É muito divertido levar a cena uma peça dele. As suas farsas, os seus autos de criticas afiadas à mentalidade mesquinha, gananciosa da época que em alguns pontos perpetua-se no tempo assim como a mania das grandezas, o endividamento sem fim e o viver de aparências. Não sei se ainda se compram títulos visto a monarquia já não existir há mais de 100 anos, mas houve aí um governante que conclui o seu curso universitário a um domingo.... O mesmo que foi preso por corrupção e depois solto por falta de provas...
Foi perguntado aos especialistas portugueses o que pensavam da representação dos selvagens nas peças de Gil Vicente e se o teatro desta época nas colónias não era uma forma de dominação. A minha respiração suspendeu deste lado da tela e fiquei na expectativa do que os conterrâneos iriam responder. Não sei se (in)conscientemente eles foram esquivos e superficiais quanto á resposta. Todes nós sabemos, os que passamos pela escola que os jesuítas usavam o teatro como forma de catequizar os " tais dos selvagens".Isso teve que ser um especialista brasileiro a responder educadamente para colmatar o esquivanço dos meus conterrâneos. Quanto ao " selvagens" responderam que os portugueses da época em Portugal continental e insular nutriam uma fantasia, um imaginário dos selvagens aliado às manifestações artísticas oferecidas à coroa recheadas de opulência. Olhem... Eu senti aquela vergonha alheia.... Não dá mais apara dourar a pílula e contar a história a metade principalmente para pessoas que habitam um território que foi colónia portuguesa e que até hoje as suas feridas estão abertas na alma e no espírito dos povos que foram subjugados. As pessoas não fantasia e sim seres humanos com sentimentos e emoções. Tampouco são curiosidades de parque temático e cortejos que servem o poder desmesurado. Além do teatro não ser só entretenimento e sim um ato politico que dispensa o panfletário é uma forma viva de nos reconciliarmos com dignidade com o que passou e não se pode perpetuar mais. O que é certo é que hoje os monumentos históricos são parte do roteiro turístico português. Nada contra, mas apresentar o Mosteiro dos Jerónimos e a Torre de Belém à luz duma mentalidade humanista e desempoeirada e não com uma narrativa saudosista de megalomania. Infelizmente esta última ainda em muitos casos é a oficial... Sinto muito meu querido Brasil e países africanos. Cada um faz a sua parte. Esta é a minha.
A Piu
Campinas SP 10/07/2021
foto: 'Auto da Barca do Inferno", Teatroesfera, Portugal 2006 encenação: Paula Sousa, personagem parvo: Ana Piu - eu mesma
'Auto da Barca do Inferno", Teatroesfera, Portugal 2006 encenação: Paula Sousa, personagem parvo: Ana Piu - eu mesma


quarta-feira, 7 de julho de 2021

O VASCO QUE ERA GRANJA E NÃO GAMA

O Vasco Granja foi a 'nossa' Xuxa em Portugal. Ihihih, e esta hein? Quando escrevo a 'nossa' vem um sentimento de pertencimento, de identidade. Sim, porque haveria de sentir vergonha de assumir as minhas origens? Sim, sou mulher, portuguesa, sou artista eternamente apaixonada pela arte e cultura nas suas múltiplas diversidades, sou do teatro, das artes visuais, da poesia e isso ninguém me tira tampouco desvaloriza ( criticas construtivas são muito bem vindas),
Os meus (bi)avós pertenciam ao campesinato, e depois aos prestadores de serviços; pedreiro ( alfabetizado), faxineira( alfabetizada), eletricista( alfabetizado), pastora de cabras e fazedora de queijos( analfabeta). Depois a geração dos meus pais e a minha já foi outra história. Uma pequeno burguesia em ascensão, um vai que não vai de valores democráticos que contemplem ou não todos. Apesar de tudo na geração dos meus pais, alguns - nomeadamente eles - tinham uma admiração pelo que se produzia no Brasil ao ponto de acreditarmos que os mais emancipados estariam mais esclarecidos em relação ao processo de democratização de Portugal. Percebi, ao viver desde há 9 anos no Brasil, que não é bem assim. Nessa parte foi um pouco decepcionante, mas continuo profundamente apaixonada por este território: principalmente pelas vozes secularmente silenciadas. E as decepções também se desfazem quando nos propomos a comunicar com escuta.
Vasco Granja faz parte do imaginário das crianças portuguesas dos anos 70 e 80, assim como de adultos apaixonados por banda desenhada/ quadrinhos/ gibi e cinema de animação. O Vasco Granja veio para descolonizar mentalidades. Não esquecendo que ele fez parte do partido comunista e foi perseguido pela PIDE, durante o fascismo, foi torturado e preso por este por passar filmes neo realistas. Com a queda do fascismo apresentou um programa de Animação na RTP ( Radio Televisão Portuguesa) durante 16 anos. Apresentou-nos a Pantera Cor De Rosa, o Tommy e Jerry, e muitos filmes vindos do bloco de Leste, ex União Soviética, que não eram propriamente para crianças e era uma critica fina e afiada ao regime.
Só posso agradecer ao Vasco Granja que não era Gama e foi a nossa Xuxa, sem açucarados artificiais e explorações de canas de açúcar.
No dia 10 de Julho o grande Vasco, de sorriso doce cordialmente utópico, faria 96 anos. Sempre na memória e no coração.
A Piu
Campinas SP 07/07/2021


domingo, 4 de julho de 2021

A REVOLUÇÃO DO CORAÇÃO

- Trotski ferrou porque quis. Não soube chegar ao poder, porque tinha dúvidas. Stalin pode ter sido uma besta, mas era um homem de ação.
- Que horror! Você 'tá defendendo esses expurgos!
- Sem trocadilho, Trotski é um picareta. Ressuscitar esse cara é coisa de quem está namorando o fascismo.
- Eu te desprezo, Oscar.
- Mas gosta de dormir comigo.
- Porque não pintou outro. E eu não pertenço a você. Eu sou livre.
- Eu duvido. Você é muito moralista. Você gosta de Maria Liberal como leva a vida. Você só é capaz na teoria.
- Ah é! Escuta aqui, Rivaldo. - o tal do Torres que presencia este diálogo de pombinhos- Voce quer trepar comigo?
- Como?
( a mulher tira a blusa e fica com os seios de fora) Você me acha gostosa?
- Claro!
- Pois vou mostrar que também sou ótima na prática também.
- Pára com isso! O Torres é um cara político!
- Ele é homem, não é?
- Você é a minha namorada, Paulinha.
- Paulinha porra nenhuma. Eu sou Paula Nelso e eu não sou propriedade de ninguém.
- Você 'tá sendo ridicula.
. Babaca.
- Mas fui o primeiro.
- Mas não vai ser o último, seu puto stalinista.
( enrolam-se, beijam-se e deitam-se na cama do beliche. O homem pede para o Torres sair)
Trecho dum diálogo do filme 'Alma Corsária' (1993) de Carlos Reichebach.
Aqui temos o segundo trecho áureo deste filme. Vamos começar lá por cima, passo a passo. Quem nunca conheceu um Trotskista? O que eu conheci não dava para acreditar... Um ótimo pianista e compositor, mas um copinho de leite previlegiado que defendia a luta armada; como se Portugal vivesse nos anos 90 tal qual uma Rússia czarista. Que viagem! Por acaso ele acreditava no Trotski mas podia ter-se filado no partido do Peter Pan. Ía dar ao mesmo. Já não falando que vivia num bairro nobre de Lisboa, onde se encontram os consulados. Talvez ele tivesse um plano mirabolante. Tipo um piano feito de pudim molotof para oferecer numa noite de gala no seu bairro residencial. Sei lá! Sei que estou fora dessa viagem. AInda me cruzei com alguns por uma universidade brasileira. Resultado: assim que senti o cheiro saí de fininho tentando não ter pensamentos cínicos. Que o cinismo também é um engodo, de verdade. Mas em doses brandas é libertador. Desde que saibamos qual a nossa intenção. Se é de libertar ou de oprimir, dominar. Faz toda a diferença. Pois não é?
No entanto, não deixei de ler a biografia da Frida Kahlo para ter mais uma noção de como mulheres como ela e como a Pagu foram desconsideradas pelos seus companheiros camaradas que nunca abriram mão do seu machismo. Embora com elevados ideais de revolução popular. Enfim.
De seguida o personagem defende o Stalin e acha que este não é fascista. 'Tá. Precisa de fazer umas leituras e agora com a net pode pesquisar documentários.
De seguida o diálogo descamba... Até há bem pouco tempo para mim esse desandar era surpreendente por falta de hábito, mas agora já entendi a onda. Mistura-se aqui com uma facilidade politica e homens de Estado, de regimes autoritários e totalitários com sexo... Enfim. Gostaria de dizer: sem comentários quanto a esse oportunismo de parte a parte. Mas escrevo: um está com o outro porque para ela não pinta mais ninguém e para ele, ela foi a primeira, para todos os efeitos. Além de infantiloide é uma relação abusiva que distorce todo e qualquer ideal de mudança social.
Depois, ela com o seu orgulho ou vaidade pergunta para o Torres, dando uma de libertária, se ela não é gostosa. ( Aqui paro uns segundos para respirar fundo, passar as mãos pelo rosto e avisar que o que escreverei a seguir tem a ver com a minha sensibildade, logo cada um e cada uma faz da sua vida o que quiser). Eu tenho um ranço profundo com o conceito "gostosa" e "gostoso" ou "gostose". Aparece-me sempre uma imagem dum marshmallow branco, rosinha e aquele azul bebé próprio dos corantes e conservante a la parque de diversões da Disne... Uma coisa dum açucarado artificial que só visto e sentido. Uma objetificação do próprio corpo e do corpo alheio que nem dá para entender na totalidade, mas adiantando que essa objetificação é resquicio da colonização de corpos, o seu e o dos outros, numa lógica mercantil e posteriormente capitalista e neo liberal. Tipo: " Me coma como se eu fosse um X burguer cheio da molho de alho, maionese e ketchup. Lambuzemo-nos na nossa carência, no esquecimento de sabermos quem somos e o que viemos aqui fazer e na necessidade de fazermos joguinhos de ciúmes com @ noss@ parceiro para nos sentirmos gente e assim acharmos, equivocadamente que somos livres. Isso não será tóxico? Que revolução social se sustenta com essas interações no micro?
Desconstruir o patriarcado leva tempo. Anos, décadas, séculos. Mas é urgente assumirmos as nossas práticas (in)conscientes para mudar. Ah! E não nos ofendermos, nem personalizarmos quando alguém fala que o sindrome da gostozice não é emancipatório, tampouco revolucionário. Se alguém fala isso, constantemente, talvez seja um gesto de amor e não um enfiar o dedo na cara. Quando alguém fala em auto conhecimento não tem a ver com livrinhos de beira de estrada ou cursos de como ter sucesso num curso ou palestra de 2 horas. Fica também aqui a reflexão: quando um homem ou uma mulher ou outro género qualquer persegue uma outra pessoa duma forma pornográfica isso não é fascismo? E ainda me pergunto quais as intenções por detrás dessa perseguição? É "simplesmente divertir-se" ou faz parte duma associação sinistra cibernáutica? Pergunto só, sem acusar, e sim para que possamos meter a mão na consciência e no coração para que brote e se cure a alma, a psique segundo Jung para dar aquela cientifizada.
Vitória ao entendimento e à humildade de saber receber e dar amor, mesmo quando nos desconforta, sem estar sempre à defesa com os velhos mecanismos e jogos emocionais, evocando outras pessoas para nos sentirmos gostoses e desejades. E isto muitas vezes sem nos darmos conta do lugar que ocupamos ainda numa sociedade tão hierarquizada.
E lá vai clichezão: só o amor cura! Ah poizé!
Abraço sincero no coração
A Piu
Campinas SP 04/07/2021


A ALMA E CALMA RIMAM?

 - Você não acha meio cretino nos enchendo com erudição, enquanto as coisas estão acontendo lá fora? Tanto amigo da gente sendo preso, torturado. Tanta desinformação da  nossa própria realidade.

- Ah! Que saco! Você pode se dar ao luxo. Eu nunca tive acesso a essas reliquias.

- Você já tentou se engajar em algum grupo?

- Já! E me dei mal.

- Estou-me sentindo meio vazio.

- Porque você tem vergonha de ser rico. Se você for de cana seu pai tira na hora.

- Vai à merda, Torres!

- É isso mesmo! Você tem tudo o que quer. Garotas, faculdade, lojas.

- O tédio é pior do que o câncer.

- Ahhh! O tédio é pior do que o câncer!!!...Ah! Burguesinho babaca!

-Sim, sou burguês. E daí? O que é que tem? Cesário Verde também era.

- Mas que megalomania, hein Téo! O Cesário Verde era doente, frágil. Você é forte que nem um bezerro.

- Vai fazer a apologia da fragilidade?

- Eu não! Você é que é complexado. Vive no analista para se redimir da sua fortuna.

- Não, Torres.

- Você tem inveja da minha erudição.

- Caguei! O que te falta é vivência! Eu sou maldito porque nasci maldito. Sou filho bastardo como os grandes visionários: Moisés, Buda, Mahomé, Cristo.

- Você 'tá embaralhando tudo.

- Eu estou 100 anos na sua frente, Eu fui hippie antes de pintar os hippies. Eu queimava fumo antes de virar coisa de burguês. Eu aprendi a escrever lendo Marcelo K., Briggite Bijou. Lia Verlaine e Guape e me masturbava.

- Tudo bem! Tudo bem!  Só que você parou no tempo. Eu não. Eu continuei. Você tem que admitir, Torres. Eu é que te reciclei culturalmente.

- Ah! Reciclar o cacete. Eu que dei um tempo para viver como Rimbaud.

- Sabe qual o seu problema? É que você não consegue colocar no papel toda essa porralouquice.

Trecho dum diálogo do filme 'Alma Corsária' (1993) de Carlos Reichebach.


Para mim este e um outro diálogo que citarei no próximo texto são a cereja do bolo deste filme. Hilário!  Hilariante. Penso que fala por si mesmo, porém cada ser vivente fará a sua interpretação. Tem um lado cómico, mesmo que os tempos em que os personagens se inserem sejam sinistros. Estão em plena ditadura militar. É uma espécie de conversa de adolescentes tardios com um certo engajamento ideológico. Ambos teem a sua razão e por isso comparam-se nos seus recortes sociais e competem entre si conhecimento e práticas. É um retrato interessante de dois jovens homens de São Paulo um tanto frustrados com a sua existência. Mais tarde, uns anos mais tarde, o espectador assiste ao lançamento dum livro de Torres num qualquer boteco de São Paulo envolto numa fauna humana à laia de filme do Pasolini ou do Felini. Ah! Ainda tem uma cena sem texto do Torres a despir-se de várias camisetas com o busto dos figurões revolucionários até chegar a uma preta com um A. ;) Aí ela lança os braços para o alto, mas em vez de gooleee, grita: EVOÉ! Ihihih Quem nunca presenciou ou passou por uma cena assim?


A Piu

Campinas SP 04/07/2021




SALVE JANU!

 É com grande pesar que comunicamos que nosso mestre, nosso griô, retornou à Olorum.

Sua passagem nesta terra fortaleceu significativamente o legado de nossos ancestrais.
Através da fotografia, trabalhou para que a população negra diaspórica, especialmente a brasileira, tivesse uma elevação da autoestima, um fortalecimento de sua dignidade e a construção de uma cidadania plena. Cinco décadas de trabalho construindo novas imagens e a memória negra brasileira.
Apesar de ter deixado muitos planos de trabalho em andamento, Janu retorna com sua missão mais que cumprida.
Que privilégio o nosso de ter sido contemporâneos da sua grandeza!
Salve Januário Garcia!
Salve Janu
1943-2021
#@januariogarciaoficial






POLITICAMENTE (IN)CORRETO


Existem vidas nas favelas, para além dessas que a policia militar diariamente mostra para a população. Uma comunidade ordeira, trabalhadora e honesta, com conceito de família, beleza e diversão.
Fotografias feitas nos anos 83 e 84 no projeto que chamei Quilombo Hoje, no Morro do Salgueiro, Rio de Janeiro.
@januariogarciaoficial
Ontem, ao ir para o posto de saúde, a vários quilometros de distância do meu lar doce lar avistei várias comunidades perto da rodovia que nos leva até ao aeroprto. Rodovias, na minha terra são auto estradas, que nos fazem acreditar que vivemos numa sociedade desenvolvida onde a habitação, o saneamento básico, a comida, a saúde, a educação estão ao alcance de todos. Olhem só... Eu nem voto aqui nesta terra... Isso não é papo de comunista e sim de qualquer cidadão que preze por democracia e dignidade pela vida humana, animal e vegetal, além de mineral. Desde já agradeço a compreensão, que dispensa polaridades como se a vida se tratasse dum campeonato de futebol ou de um oba oba de espiritualidade gourmet.
O uber passa e avista-se o shopping Bandeirantes. Já o nome diz muita coisa. Shopping= consumismo. Bandeirantes= invasores que conquistaram à força.
Pergunto em voz alta para a minha filha o porquê dum shopping no meio de lugar nenhum. Resposta que arruma num canto a minha pretensão alternativa: " Tu não vives aqui, mas há quem viva." Do meu lugar respondo quando avisto a comunidade " Mas o que um trabalhador comum vai consumir nessa catedral do consumo? Vai passear e quanto muito comer e olha lá!" Na minha visão o que deveria estar no lugar daquele shopping era um centro cultural com uma grande biblioteca, espaços verdes com anfiteatros para todos.
No final da viagem chegamos um lugar perto da fábrica da Mercedes. O condutor diz que aquela localidade chama-se Jardim Mercedes. Pergunto se cresceu à custa dos trabalhadores dessa empresa. 'Não, foi um lugar invadido há 15 anos por pessoas que procuram lugar para morar. Depois a perfeitura legalizou e tratou do saneamento básico.' Na minha sensibilidade não são invasores e sim pessoas que procuram simplesmente um lugar para viver com as sua familias ou solos...
Falo da imensa favela que existe junto ao aeroporto de Campinas. Ele, um homem negro, fala que tem lugares perigosos. Faz-se silêncio. Talvez eu tenha falado algo de inconveniente e tenha passado por patricinha/ betinha? Será?
A minha filha avisa que falar favela é crime e que tem muitas pessoas das comunidades que consomem no shopping. Ok, vou deixar de falar favela e sim comunidade. Mas na minha experiência de vida, crime é fechar os olhos para a desigulade social, não abrir mão dos previlégios ( principalmente homens brancos hetero e até homo com acesso à educação mas acham que mulheres e homens existem para os servir nas suas necessidades mais básicas que é amaciar o seu ego performático) para dar a mão a outros e deixar-se levar no canto da sereia do consumismo neo liberal. Depois aliviei (...) quando o Januário Garcia fala em favelas. Ironicamente faleceu com covid no dia em que me vacinei contra a mesma. Memória eterna a Januário e a todas as vitimas da "gripezinha". Que a sua passagem seja leve e em paz.
Bora ser gente de verdade com verdade? Vitória a quem olha para dentro com profundidade e não esquece de olhar ao redor e se elevar com as suas ações. Porque espiritualidade que nega desigualdades sociais e fecha a cara para movimentos sociais e lutas ancestrais também cheira a esturro. Assim como punhos erguidos arrogantemente, e eu não me excluo, não agregam em nada, só desmobilizam.
Gratinados por me ler até aqui.
A Piu
Campinas SP 03/07/202